podessemos recuperar a perda deploravel do objecto que trat?o os dois ultimos versos do maravilhoso Soneto de hum dos nossos sublimados Engenhos, que abaixo transcrevemos, que póde servir de quadro ás passadas, e presentes circunstancias em que se vio, e vê Portugal.
*SONETO.*
Com o tempo o prado secco reverdece, Com o tempo cahe a folha ao bosque umbroso, Com o tempo pára o rio caudaloso, Com o tempo o campo pobre se enriquece.
Com o tempo hum louro morre, outro florece, Com o tempo hum he sereno, outro invernoso, Com o tempo foge o mal duro e penoso, Com o tempo torna o bem já quando esquece.
Com o tempo faz mudan?a a sorte avara, Com o tempo se aniquilla hum grande Estado, Com o tempo torna a ser mais eminente.
Com o tempo tudo corre, tudo pára, Mas só aquelle tempo que he passado, Com o tempo se n?o faz tempo presente.
* * * * *
Ainda que huma sabia Constitui??o Nacional n?o abrangesse (como abrange) hum bem geral composto de diversos, e infinitos bens, bastava aquelle de constituir hum sabio, e digno Codigo, que dê a Deos o que he de Deos, a Cesar o que he de Cesar: Em suma:--Que já mais poss?o ter as Leis as interpetra??es que lhes der?o (posto que com ironia) Solon, Anacharsis, e o sabio P. M. Fr. José Suppico, como abaixo transcrevemos.
Solon, e Anacharsis, comparav?o as Leis ás teas de aranha, porque assim como estas só prendem algum mosquito, ou bichinho semelhante, e os maiores as rompem, e zomb?o dellas, assim tambem as Leis só opprimem, e castig?o os humildes, e pobres; e os grandes as despres?o, e fazem t?o pouco caso dellas, que nem ainda as toc?o com o dedo!
O muito Reverendo P. M. Fr. José Suppico: Repara, ou pondera no empenho que Herodes mostrou em querer tirar a vida a Christo, e n?o o esperar no Templo, quando o levassem a apresentar a elle. Para que se can?a Herodes em matar innocentes, em perseguir justos, em dobrar sentinellas, e em povoar estradas? Espere no Templo a Deos Menino. Mas oh que andou Herodes como Principe; e tinha ouvido dizer aos Magos, que Christo nascia Rei: E nesta supposi??o diz entre si: N?o tenho que me can?ar em procurallo no Templo; he Rei? he Grande? Pois n?o ha de ir ao Templo, porque se o ir ao Templo he observancia da Lei, estes n?o guard?o as Leis, quebr?o as Leis.
Torno a repetir segunda vez: Quando huma sabia Constitui??o n?o nos trouxesse outro bem, mas sómente aquelle de p?r o Ministro n'huma severa restrinc??o de dar a Deos o que he de Deos, e a Cesar o que he de Cesar, isto he: Virtude para o premio, Vicio para o castigo, serem em suma estes os dois pontos fixos das suas delibera??es sem aquella distinc??o que todos nós sabemos, de que tanto se vangloriav?o os Nobres (que deix?o de o ser huma vez que pretendem torcer a Vara da Justi?a) e se lastimav?o os plebêos!
N?o precisa ser grande Juris-Consulto para saber (quando se n?o queira fechar os ouvidos á vos da raz?o, ou do interesse!!) que o premio he dado--á Virtude--e o castigo ao Crime--que o plebêo depois de praticar huma virtude, he nobre, e que o nobre depois de praticar huma vileza he plebêo. Esta verdade inegavel confessa mesmo o Rustico applaude, e elogia o Sabio, e o Poeta canta:
*SONETO.*
Pobre, ou rico, Vassallo, ou Soberano, Iguaes s?o todos, todos s?o parentes, Todos nascêr?o ramos descendentes Do tronco antigo do primeiro humano.
Saiba quem de seus titulos ufano Toma por qualidade os accidentes, Que duas gera??es ha só differentes, Virtude, e Vicio tudo mais he engano.
Por mais que affecte a v? Genealogia Introduzir nas vêas a nobreza, De melhor sangue que Ad?o teria,
N?o fará desmentindo a natureza Que seja sem virtude a Fidalguia Mas que hum triste fantasma da Grandeza.
Rimas de J. X. de Mattos.
Tom. II. pag. 47.
Considera??es sobre as Leis em geral, e em particular, de alguns célebres, Filosofos, Sabios, e Oradores.
I. Perguntando Plistonacto a Pausanias, a causa, porque entre os Espartanos estav?o as Leis, ainda as mais antigas, tanto em seu vigor, respondeo: Porque entre os Lacedemonios as Leis sempre domin?o, e nunca for?o dominadas.
II. Demósthenes chamava ás Leis, alma da Republica, porque assim como o corpo sem alma logo acaba, assim a Republica faltando as Leis, logo se arruina.
III. Sem Leis, sumptuarias, que dem o tom aos differentes ramos, que podem despedir do throno geral do público interesse, de mui pouco vir?o a servir a bondade do Sol, a fertilidade do ch?o, a actividade da industria, e a inergia do homem.
IV. Para nos mostrar que n?o muitas mas sabias Leis, e á risca observadas s?o o que form?o a felicidade Pública, dizia o sabio Arcesiláo, que assim como aonde ha mais abundancia de Medicos,
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