Salmos do prisioneiro | Page 7

Jaime de Magalhães Lima
e sem mancha, resplendente, o seu cl��ustro e templo onde guardava, sagrada e isenta, toda a sua f��.
XII
Se Deus me concedesse o seu pod��r e o Senhor permitisse que um momento eu vivesse em puro esp��rito, convertendo a mis��ria em candidez, eu quereria erguer-me ao cimo casto e austero da montanha, da mais alta montanha que avistasse, e a��, tocando a terra t?o s��mente no p��ncaro agudo revestido dessa sagrada alvura imaculada que �� a neve branca, eterna, incorrupt��vel, a�� me despiria totalmente da mentira implac��vel que nos prende, a�� libertaria o cora??o em seus la?os mortais t?o oprimido, a�� os soltaria para seguir humilde e fielmente o seu anseio.
Quanto penso e a raz?o me contradiz, a oculta rebeldia desleal que jura por certeza a pr��pria d��vida, quantas palavras digo que eu n?o sinto, quantos passos eu dou atrai?oando meu querer e vontade e aspira??o, onde obede?o ��s conven??es do mundo e onde �� impostura cedo por fraqueza, o falso pranto que cobre a indiferen?a e o riso em que o enfado anda escondido, e o louvor sobrepondo-se ao despr��zo, e o despr��so negando as afei??es, e o sil��ncio em que a voz estrangulei s�� porque estranhos podem desama-la--de todo o pervertido engano em que, inerte e prostrado, sou levado, enganado e enganando, mentindo �� consci��ncia, aos c��us e aos homens, de toda a confus?o d��sse tumulto em que o ��mpio sacia o seu esc��rneo, eu iria isentar-me, dissipando-o no cimo glorioso da montanha, revestida da neve imaculada. E para que f?sse tal qual um cristal feito s�� de luz, assim eu lavaria o cora??o de quanto na mentira o enegrece. E ent?o me sentiria redimido porque s�� a Verdade me prendia!
XIII
Segui de olhos vendados a ilus?o. Para que n?o visse a aspereza do meu trilho, para me guardar de espectros que o assaltam, para me ocultar torpezas d��ste mundo, cegou-me e desviou-se do caminho, juncado s�� de cardos, em que um r��spido destino me trazia. Ergueu-me em suas azas e levou-me ��quela altura onde n?o ha treva e a luz n?o tem fraqueza nem crep��sculo, onde os espinhos se convertem em rosas, onde o veneno se transforma em filtros salutares vivificantes, e a amargura e a d?r e toda a pena se dissipam em auras incensadas.
Se, por��m, a ilus?o me abandonou e o desengano apunhalou o meu peito e o fez chorar, n?o descri da ilus?o nem a neguei. Sentindo-me infeliz, pedi aos ceus que aos anjos de ilus?o me confiassem, que de novo os mandassem libertar-me da vileza da terra e seu tormento, da malqueren?a, do odio e da avareza, de quanto mal nos prostitue a alma e atrai?oa o Senhor. Pedi-lhes a cegueira da ilus?o, pois quanto mais me cega mais a amo, mais distante me leva da ruindade, mais no seio de Deus me faz sonhar.
Tanto a amei e lhe dei meu cora??o, tanto lhe quiz meu peito e a adorou, que j��mais me rendi ao inimigo. Se o desengano me assalta e fere e prostra atormentado, n?o lhe imploro gra?as ou cons?lo, s�� da ilus?o espero a fortaleza.
Prendeu-me nesta vida! Fui seu servo. Assim na morte a encontra bemfazeja!... De cont��nuo lhe rogo, humildemente, que na morte me guie e arrebate das certezas mesquinhas d��ste mundo �� incerteza feliz em que ela reina e em sua ben??o nos redime e exalta.
XIV
Passa ligeira a nuvem no luar. E, por momentos, foi obscura palidez incerta aquele espa?o ha pouco resplendente, adormecido na mais d?ce luz.
Que �� dessa alvura que vestia a terra? Que �� da brancura que a purificava?!...
Uma sombra turvou a imensidade. Como se os astros desmaiassem timidos e um estranho terror os apagasse, afrouxa e hesita a sua claridade e quanta brandura e calma ela derrama. �� que uma nuvem perpassou errante e etereamente se esvaiu e perde.
Filha das ��guas, leve, inconsistente, s�� para mudar nascida, estranho ser que n?o vive um instante a mesma vida e a todas experimenta e a todas deixa com igual desamor e igual capricho, imagem fugidia de um efemero del��rio descontente, t?o pequenina e fraca, a nuvem foi mais forte que o pod��r mais ardente das estrelas e pode te-lo turvado, escurecido e humilhado.
Ai de mim, ai de mim!... Sei seu mist��rio! Porque assim �� tambem a minha sorte. Uma nuvem venceu a luz dos c��us; e a mim vencem-me os sonhos toda a luz que do meu cora??o se ergue e desprende, carcereiros da d?r e da ventura, desp��ticos senhores e poderosos de toda a gl��ria e m��goa do meu peito.
XV
Ouvi chorar a noite porque a orgia lhe roubara o sil��ncio, o companheiro. Quando o c��u lhe acendeu suas estrelas e no seu negro manto esmoreceu todo o brilho que o sol cria na terra e toda a formosura que ele afaga, na benigna hora recolhida em que
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