pintando a
uva...»
E animados então (o povo é uma criança!)
Porque o Sr.
Morgado deu-lhes confiança,
«Que Deus o ajude» dirá um, e o
regedor:
«Que seja mui feliz, Sr. Doutor...»
E eu hei-de agradecer,
sorrir, gostar.
Mas o Anjo, no entanto, não deve tardar...
E d'entre o
grupo exclamará um velho, então:
«Já nasce o dia!» eu olharei... mas
não:
É a minha Noiva que parece dia,
Branquinha como a cal de
Santa Iria!
E ao vel-a tão branca, de branco vestida,
Ao longe, ao
longe, hei-de cuidar ver uma Ermida!
E dirá o pastor, com espanto
tamanho,
Que é uma Ovelha que fugiu do seu rebanho!
E o João
Maluco dirá que é o Luar de Janeiro!
E o pescador explicará ao bom
moleiro
Que é tal qualzinha a sua Lancha pelo mar!
E o moleiro
dirá que é o seu Moinho a andar!
Que assim já foram as velhinhas
scismarão,
E as netas, coitadas! que, um dia, o serão...
Mas o Anjo
assomará, á porta da capella,
E eu branco e tremulo hei-de ir ter com
ella.
E a estrella deitar-me-á a benção dos seus olhos
E uma aldeã
deitar-lhe-á violetas, aos molhos!
E a Bem-Amada entrar na igreja
ha-de...
E ha-de cazar-nos o Sr. Abbade.
E, em seguida, será a nossa
boda,
E festas haverá, na aldeia toda.
E as mais raparigas do sitio,
solteiras,
Hao-de bailar bailados sobre as eiras,
Com trinta moedas
de oiro sobre o peito!
E cantigas dirão a seu respeito.
E a Noiva em
gloria, prepassando nas janellas,
Sorrirá com simplicidade para ellas.
E a noite, pouco e pouco, descerá...
E tudo acabará.
E depois e
depois, o Anjo ha-de se ir deitar,
E a sua mãe ha-de aabraçar... E
hão-de chorar!
E a sua alcova deitará sobre o quintal,
Onde uma
fonte correrá, entre o ervilhal:
E, ao ouvil-a cantar, deitadinha na
cama,
O Anjo adormecerá, cuidando que é a sua ama...
Mas qual a villa, qual a aldeia, qual a serra
Que este Palacio de
Ventura encerra?
Fui ter com minha fada e disse-lhe: «Madrinha!
Accaso nunca te mentiu tua varinha?»
E a minha fada com sua vara
de condão
Nos ares escreveu com tres estrellas: «Não!»
Meninas, lindas meninas!
Qual de vós é o meu ideal?
Meninas!
lindas meninas
Do Reino de Portugal!
O nosso lar!
Minha Madrinha! ajuda-me a sonhar!
Que a nossa caza
se erga d'entre uma eminencia,
Que seja tal qual uma rezidencia,
Alegre, branca, rustica, por fóra.
Que digam: «É o Sr. Abbade que alli
mora...»
Mas no interior ella ha-de ser sombria,
Como eu com esta
melancholia...
E salas escuras, chorando saudades...
E velhos os
moveis, de antigas idades...
(E, assim, me illuda e, assim, cuide viver
N'outro seculo em que eu deveria nascer.)
E nas paredes telas de
parentes...
E janellas abertas sobre os poentes...
(E a Chymera lerá o
seu livro de rezas...)
E cravos vermelhos por cima das mezas...
E o
relogio dará as horas devagar,
Como as palpitações de quem se vae
finar...
E, dia inteiro, n'esta solidão,
Deixar-me-ei esquecer, ao
canto do fogão.
E a scismar e a scismar em que? em quem?
Na Dor,
na Vida, em Deus, no Infinito, no _Além_?
E eu o Luziada sombrio,
o Afflicto, o Médio,
Rogarei aos Espiritos remedio
E um bom
Espirito virá tratar do doente
E ha-de tremer de susto a outra gente.
E a noite descerá, pouco e pouco, no entanto,
E a noite embrulhará o
Afflicto no seu manto!
Mas a Purinha, então, vindo da rua,
Toda de
branco surgirá, como uma Lua!
E, então, acordarei d'essa
desesperança
E pela mão me levará, como uma criança.
E eu
pallido! e eu tremendo! e o Anjo pelo caminho,
«Não te afflijas...»
dirá, baixinho...
E, assim, será piedoza para os mais:
E ha-de entrar
na mizeria dos cazaes,
Nos montes mais altos, nos sitios mais ermos,
E será a Saude dos Enfermos!
E quando pela estrada encontrar um
velhinho
Todo suado, carregadinho,
(Louvado seja Nosso Senhor!)
Ha-de tirar seu lenço e ir enxugar-lhe o suor!
E ás aves, em prisão,
abrirá as gaiolas.
E, aos sabbados, o dia das esmolas,
A Santa
descerá ao patamar da escada,
Envolta, sem saber, n'uma capa
estrellada,
Esmolas, distribuindo a este e áquelle: e aos ceguinhos
E
mais aos alleijadinhos,
Mais aos que botam sangue pela bocca,
Mais aos que vêm cantar, numa rabeca rouca,
Amores, naufragios e A
Nau Cathrineta,
Mais aos Afflictos deste vil Planeta,
Mais ás
viuvas dos degredados...
E tudo seja pelos meus peccados!
E ha-de
cozer (serão os remendos de flores)
As velas rôtas dos pescadores
E
a luz do seu olhar benzerá essas velas
E nunca mais hão-de
rasgar-lh'as as procellas!
E accenderá os cyrios ao Senhor,
(Que
sejam como ella no talhe e na cor!)
Quando houver temporal... e eu
virei p'ra saccada
Ver os relampagos, ouvir a trovoada!...
E n'isto só
rezumir-se-á a sua vida:
Vestir os nus, aos pobres dar guarida,
Fallar á alma que na angustia se consome,
Dar de comer a quem tem
fome,
Dar de beber a quem tem sede...
E, lá, do céu, Jezus dirá aos
homens: «Vede...»
E eu hei-de em minhas obras imital-a
E amal-a
como á Virgem e adoral-a.
E a Virgem ha-de encher com a mesma
paixão
As marés-vazas d'este doido coração
E as suas ondas ha-de,
olympica, aplacar,
Que para mim, linda Joanninha d'Arc,
Que para
mim será a lua-nova!
E ha-de ir commigo para a mesma cova,
Pois
que no dia em que eu morrer
Veneno tomará, n'uma colher...
Mas em que
Continue reading on your phone by scaning this QR Code
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the
Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.