Obras poéticas | Page 7

Nicolau Tolentino
os vossos esforços
Nunca me tem sido vãos,
Acabai,
benigno Conde,
Esta obra das vossas mãos;
De hum mal fadado Poeta
Trocai em prazer as penas;
Já diante
d'outro Augusto
Fez o mesmo outro Mecenas.
CARTA
_No dia dos Annos do Illustrissimo, e Excellentissimo Senhor Marquez
de Angeja D. Jozé de Noronha, estando o Author doente_.
Senhor, se vos são acceitos
Pobres Versos, mal limados,
Entre
vidros, e receitas,
Em triste leito traçados;

Se de hum sombrio doente
A fúnebre poezia
Os prazeres não
perturba
Deste faustissimo Dia;
Consenti, que a branda Lyra,
Por vós outr'ora escutada,
E que
teimoza molestia
Tem ha muito pendurada;
Sobre este cansado peito,
Ferida com debil mão,
Mande ao Ceo
singelos hymnos,
Nascidos do coração;
Consenti, que eu louve o Dia,
Para mim assinalado,
Qne raia em
nosso Horizonte,
De nova luz coroado;
Dia, que vos vio nascer;
E que quiz trazer comsigo
Quem une ao
nome de Grande,
O santo nome de Amigo;
Quem não quer só a Nobreza
De Illustres Antepassados;
E mais
ama huma virtude,
Que cem Titulos herdados;
Quem sabe, que o vir honrar
Dos pequenos a baixeza,
He entre os
que nascem Grandes
A verdadeira Grandeza;
Quem a favor de infelizes
Traz sempre occupada a idéa;
E estima a
fortuna propria,
Só para fazer a alhea;
Cem vezes, formozo Dia,
Vem o Horizonte doirar;
Nunca possão
negros ventos
Tuas luzes perturbar;
Tu nos déste em peito illustre,
Que se doe de alheios ais,
Hum
coração adornado
De mil Virtudes Morais;
Senhor, eu não doiro enganos,
Que venal lizonja approva;
Sabidas
verdades digo,
E sou dellas huima prova;
Sou hum dos muitos exemplos
Do vosso bom coração;
A minha
felicidade
Foi obra da vossa mão;

Razoando em meu favor
Contra teimozos destinos,
Felizmente
pleiteastes
A cauza dos meus Meninos;
Ao bom Principe pedistes,
Que com mão compadecida,
Lhes
concedesse humas ferias,
Que durassem toda a vida;
Pedistes depois, Senhor,
Que a sua Real Grandeza
Se dignasse de
arrancar-me
D'entre os braços da pobreza;
Sei que nelle he natural
Ter dó das alheias penas:
Mas ouve-as
melhor Augusto,
Quando lhas conta Mecenas;
Por este modo alegrastes
A triste familia minha;
E em caza nos
levantastes
O Interdicto da Cozinha:
Já hum segundo Frizão,
Pendurada a lingua velha,
Dá reboque,
como póde,
A' antiga meia parelha;
Já o sórdido Gallego,
Meu antigo companheiro,
De gravata, e
carrapito
Arvorado em Boleeiro;
Açoitando surdas ancas
De dois Sendeiros roazes,
No mesmo
Bairro apregôa,
Ora barrîs; ora pazes;
Mas, Senhor, deixando graças,
Pois não as pede a materia,
E
pedindo á minha Muza,
Que seja comvosco séria;
Rogo ao Ceo vos dê mil annos,
Já que são tão bem gastados;
Annos
que achareis depois
Em Livro de Oiro apontados;
E se em dia de Mercês
Ides de Semana entrar,
Seja a Mercê destes
Annos
O meu nome apprezentar.
Ao Principe, ajoelhando,
Em favoravel momento,
Por mim, Senhor,
lhe jurai
Eterno agradecimento;

E eu, em largando este leito,
Já sei a hora opportuna
De poder
ajoelhar-lhe,
Quando elle chega á Tribuna;
E pondo-me ao pé do Ginja,
Que na _Náo Ajuda_ falla;
E faz a
todos os Glorias
Continencias co'a vengalla;
Surdo á historia do naufragio,
Com que elle ás vezes me afferra,

Rezarei ao Deos do Ceo,
E assistirei aos da Terra.
CARTA.
_Tendo mandado huma Senhora ao Author Vinho da Madeira com
huma Carta em boa Poezia_.
Hum humilde admirador
Da vossa bondade, e estilo,
Beija a Carta
precioza,
Que veio honrallo, e instruillo;
Desde hoje, do Mestre Horacio
Minha alma a lição escuza;
Quiz a
minha Bemfeitora
Ser tambem a minha Muza;
De fino licor mandastes
A minha cava prover;
A vossa mão
generoza
Sabe dar, como escrever;
A' parca meza assentado,
Em Vinho, e Carta pegava;
Hia bebendo,
hia lendo,
E tudo me embebedava;
Deixo o velho Anacreonte,
Hoje mettido a hum cantinho;
Sua meza
nunca teve
Tão bons Versos, tão bom Vinho;
Se os teve, Vós o roubastes
Por minha felicidade;
Já cá tem o Vinho,
e os Versos
Quem delle só tinha a idade;
Das escumas do Madeira
Vejo nascer a alegria;
Com as azas
affugenta
A minha melancolia;
Já se perturba a cabeça;
Já tenho emprestadas cores;
Já começão a

esquecer-me
As molestias, e os Crédores;
O tal Horacio enganou-se;
Não conhecêo a parreira;
Não se
chamava Falerno;
Se era bom, era Madeira;
He bom, mas tira o juizo;
Mandai-mo, em vez de o beber;
Não se
arrisque neste jogo
Quem tem tanto que perder.
CARTA.
_Desculpando-se o Author de não ir a huns Annos_.
Senhora, em honra do Dia,
Esforçando a mão pezada,
Tómo a Lyra,
ha longo tempo
Ao silencio consagrada;
E em quanto lhe alimpo as cordas,
Que bolor aos dedos dão,
E
atarantadas aranhas
Despejando o bêco vão;
C'os olhos ao ar alçados
A' minha Muza pedia
Me désse sonóros
Versos,
Dignos de Apollo, e do Dia;
Que me ensinasse a louvar
O ditozo Nascimento,
Que ao vosso
brilhante Séxo
Trouxe mais hum ornamento;
Que pintasse a loira Venus
Vosso rosto bafejando;
Que me
mostrasse as tres Graças
O rico berço embalando;
Que me ensinasse a cantar,
Cingida a testa de loiro,
Huns claros,
triunfantes olhos,
Huns finos cabellos de oiro;
Que me fizesse augurar,
Rasgando ao futuro o véo,
Amor
consagrando as settas
Nos Altares de Hymenêo;
Mas as Muzas, como as Ninfas,
Tem para mim os pés mancos;

Fogem de trémulas vozes,
Tremem de cabellos brancos;

Fiquei, pois, desamparado;
E merecendo desculpa,
De não vos
mandar bons Versos,
Peco perdão, sem ter culpa;
Sei que devia ir pedillo
Respeitozo, e diligente;
Mas impede-me
essa honra
Hum defluxo impertinente;
E quem em caza traz botas,
E vinte xaropes bebe;
E quando fahe,
fahe mettido
N'uma loge de Algebebe;
Se fosse em tempo
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