Obras poéticas | Page 3

Nicolau Tolentino
o sangue de Reis,
Pois que a Augusta Ceremonia,
Bem a
pezar das Creadas,
Vos trouxe a Santa Apollonia;
Ide, Senhora, mil vezes
Curar-lhes a fresca chaga;
Seu pranto he
filho de amor,
E amor com amor se paga;
Na rica, airoza Berlinda,
Dando ao digno Espozo parte,
Aos patrios
lares vos leve
Amor nos braços de Marte.
O Téjo, abaixando as ondas,
Vossos pés virá beijar;
Vai das Ninfas
que creou,
Ver a Ninfa Tutelar.
Os Prazeres com os Rizos
Sejão a vossa equipagem;
Revôem em
torno as Graças,
De quem sois a inveja, e a imagem:
Entrai nos tectos dourados,
Hoje lugar de saudade;
Ide, dos braços
do Amor,
Lançar-vos nos da Amizade;
Levai-nos as doces noites,
Em que a voz que se escutava,
Sobre as
azas da harmonia,
Nos nossos peitos entrava;
Quando o Cómico travêsso,
Entre geitos, e corcovos,
Habilmente
arremedava
Todos os Muzicos novos,
O triste, calado Cravo;
Já não sente a déstra mão;
Apenas he
perseguido
Pelo Senhor Dom João.[2]
[Nota de rodapé 2: Menino.]
Ide, Senhora, levar-nos
No vosso rosto a alegria;
Fazei á triste
Junqueira,
O que faz o Sol ao dia;
Mas, Senhora, a minha Muza
Tem talvez errado os Cultos;

Cuidando ter feito obsequios,
Talvez tenha feito insultos;

Dirão, que, trocando as cordas
Forão meus sons desiguaes;
Que
errei em fallar aos Filhos,
Sem fallar primeiro aos Pais.
Que podia esta Embaixada
Se désse em mais habil mão,
Cumprir as
leis da Saudade,
Sem violar as da razão;
Mas, Penalvas, dito, dito;
Defendo o meu sacrilegio;
Sois tudo; mas
não sois Noivos,
E he este o seu privilegio.
_No dia dos Annos da Illustrissima, e Excellentissima Senhora D.
Maria de Noronha, hoje Condeça de Valladares_.
Senhora, os pobres vestidos
Do vosso humilde Compadre,
Não o
deixão ir aos Annos
Da sua Illustre Comadre;
O conhecido Colete
De bordadas guarnições,
Encartado ha longo
tempo
Em Colete das Funções;
Sobre os seus cançados annos,
De humido Inverno Assaltado,

Cheio de invenciveis manchas
Me foi hoje apresentado;
Em vão bemfeitor miôlo
Lhe esfrega o quarto offendido;
A minha
choroza Mana
Dá o cazo por perdido;
E se assim me apresentasse
A tão alta Companhia,
As suas nódoas
serião
Manchas da seda, e do Dia;
Do Tempo a fôice raivoza
Não me dá só hum revéz;
Além de me
fazer velho,
Faz-me tambem descortez;
Mas elle honrou hoje o Mundo;
Sois do Mundo ornato, e inveja;

Deo hoje mais huma paga
A' Illustre Caza de Angêja.
Sua mão, que aperfeiçoa
Altos dons da Natureza,
A huns lindos,
modestos olhos
Vai augmentando a belleza;

Altêa a airoza figura
Sobre a das Graças moldada;
A huma alma a
mais digna, e nobre
Dá a mais digna morada;
Justo Tempo, eu abençôo
O teu poder desigual;
E em honra de
tantos bens,
Eu te perdoo o meu mal;
Cem vezes nas tuas azas
Nos mande este dia o Ceo;
As Virtudes o
consagrem
Nos altares de Hymenêo.
E Vós, Illustre Senhora,
Perdoai Coletes rotos;
Valem mais, que
inuteis sedas,
Puro incenso, puros votos;
Quiz mandallos em bons versos;
Suou em vão meu topete;
Fui
achar a minha Muza
Como achei o meu Colete.
_A' Illustrissima, e Excellentissima Senhora Marqueza de Alegrete,
quando lhe nasceo huma Filha_.
Senhora, he couza sabida,
Que aos Deozes não são vedados
Os
escondidos segredos
Do escuro livro dos Fados;
E pois que em tempos antigos
Já tive alguma valia
Co'aquelle, a
quem coube em forte
O governo da Poezia;
Não esperando do Tempo
O vagarozo progresso,
E desejando
augurar-vos
O vosso feliz successo;
Na raiz do alto Parnazo,
Curvando o humilde joelho,
Exclamei = Se
aqui se escutão
Votos de hum Poeta velho,
Não te peço, esquivo Apollo,
Teus verdes, sagrados loiros;
Não
aspirão a coroas
Desta testa os velhos coiros;
Abre, sim, a densa nevoa
Do vindoiro tempo escuro;
E ante meus
ávidos olhos
Rasga as sombras do futuro;

Saiba meu justo dezejo
Quanto o destino promette
Aos nossos
ardentes votos,
E aos da assustada Alegrete;
O Deos, que nunca em mim vio
De Odes moiras a manía,
Que sem
o assumpto honrarem,
Lhe deshonrão a Poezia;
Que em Oiteiros de Oratorio
Não lhe puz a Lyra ao frio,

Arriscando-a a ter por paga
Ou pedrada, ou assobio;
E muito mais porque vio,
Que da minha petição
Erão sagrados
motivos
A amizade, e a gratidão;
Fez fuzilar em meus olhos
Nova luz, vedada, e pura;
E de tudo o
que então vi,
Vos vou fazer a pintura.
Vi, Senhora, as loiras Graças
Com doce, e rizonho aspeito,
Tecendo
engenhozas danças
Em torno de hum aureo leito;
E abrindo as ricas Cortinas
Trazerem nos castos braços
O digno, e
precioso Fruto
De Illustres, sagrados laços.
Sobre o mimoso semblante,
Em que os seus dons inspiravão,
Dos
mais altos Pertendentes,
Mil suspiros auguravão;
Os Prazeres sobre as azas
O berço lhe rodeavão;
Fortuna lhe abria
os cofres,
As Virtudes a embalavão;
Vi Penalvas, vi Angejas,
Que aos Ceos mil hymnos mandavão;
Aos
Ceos, que as duas Familias
Novamente abençoavão:
Vi a roda das Creadas,
Que á Menina dando vai,
Humas, os olhos
da Mãi,
Outras, a boca do Pai;
Mas Apollo aqui fechando
As altas couzas futuras,
E deixando o
pobre velho
Alegre, mas ás escuras;

Me disse = Conta o que viste;
O mais, em tempo vindoiro,
Fiel,
apurada historia,
O dirá em letras de oiro;
Corri: mas trémulas pernas
Tem sempre estrada comprida;
E pois
acho a profecia,
Gradas aos Ceos, já cumprida,
Beijo respeitozamente
Estas faixas, que envolvêrão
Aquella, a
quem dão a vida
Os que a minha protejêrão;
0. Recebe, oh Recem-nascida, Terno amor, alto respeito; Teus Avós,
teus claros Pais Te derão este direito;
E tu,
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