O Mysterio da Estrada de Cintra | Page 4

Ramalho Ortigão
rendam-se para nos poupar algum tempo que nos �� precioso! disse gravemente um dos desconhecidos. Por quem s?o, acompanhem-nos! Um dia saber?o por que motivo lhes sahimos ao caminho mascarados. Damos-lhes a nossa palavra que ��manh? estar?o nas suas casas, em Lisboa. Os cavallos ficar?o em Cintra d'aqui a duas horas.
Depois de uma breve reluctancia, que eu contribu�� para desvanecer, o meu companheiro apeou-se e entrou no coup��. Eu segui-o.
Cederam-nos os melhores logares. O homem que se achava em frente da parelha segurou os nossos cavallos; o que fizera cair o poldro subiu para a almofada e pegou nas guias; ou outros dois entraram comnosco e sentaram-se nos logares fronteiros aos nossos. Fecharam-se em seguida os stores de madeira dos postigos e correu-se uma cortina de seda verde que cobria por dentro os vidros fronteiros da carruagem.
No momento de partirmos, o que ia guiar bateu na vidra?a e pediu um charuto. Passaram-lhe para f��ra uma charuteira de palha de Java. Pella fresta por onde recebeu os charutos lan?ou para dentro do trem a mascara que tinha no rosto, e partimos a galope.
Quando entrei para a carruagem pareceu-me avistar ao longe, vindo de Lisboa, um omnibus, talvez uma sege. Se me n?o illudi, a pessoa ou pessoas que vinham no trem a que me refiro ter?o visto os nossos cavallos, um dos quaes �� russo e o outro castanho, e poder?o talvez dar noticia da carruagem em que ��amos e da pessoa que nos servia de cocheiro. O coup�� era, como j�� disse, verde e preto. Os stores, de mogno polido, tinham no alto quatro fendas estreitas e oblongas, dispostas em cruz.
Falta-me tempo para escrever o que ainda me resta por contar a horas de expedir ainda hoje esta carta pela posta interna.
Continuarei. Direi ent?o, se o n?o suspeitou j��, o motivo porque lhe occulto o meu nome e o nome do meu amigo.
II
Julho, 24 de 1870--Acabo de ver a carta que lhe dirigi publicada integralmente por v. no logar destinado ao folhetim do seu periodico. Em vista da colloca??o dada ao meu escripto procurarei nas cartas que houver de lhe dirigir n?o ultrapassar os limites demarcados a esta sec??o do jornal.
Por esquecimento n?o datei a carta antecedente, ficando assim duvidoso qual o dia em que fomos surprehendidos na estrada de Cintra. Foi quarta feira, 20 do corrente mez de julho.
Passo de prompto a contar-lhe o que se passou no trem, especificando minuciosamente todos os pormenores e tentando reconstruir o dialogo que trav��mos, tanto quanto me seja possivel com as mesmas palavras que n'elle se empregaram.
A carruagem partiu na direc??o de Cintra. Presumo por��m que deu na estrada algumas voltas, muito largas e bem dadas porque se n?o presentiram pela intercadencia da velocidade no passo dos cavallos. Levaram-me a suppol-o, em primeiro logar as differen?as de declive no nivel do terreno, com quanto estivessemos rodando sempre em uma estrada macadamisada e lisa; em segundo logar umas leves altera??es na quantidade de luz que havia dentro do coup�� coada pela cortina de seda verde, o que me indicava que o trem passava por encontradas exposi??es com rella??o ao sol que se escondia no horisonte.
Havia evidentemente o designio de nos desorientar no rumo definitivo que tomassemos.
�� certo que, dois minutos depois de termos principiado a andar, me seria absolutamente impossivel decidir se ia de Lisboa para Cintra ou se vinha de Cintra para Lisboa.
Na carruagem havia uma claridade bassa e tenue, que todavia nos permittia distinguir os objectos. Pude ver as horas no meu relogio. Eram sete e um quarto.
O desconhecido que ia defronte de mim examinou tambem as horas. O relogio que elle n?o introduziu bem na algibeira do collete e que um momento depois lhe caiu, ficando por algum tempo patente e pendido da corrente, era um relogio singular que se n?o confunde facilmente e que n?o deixar�� de ser reconhecido, depois da noticia que dou d'elle, pellas pessoas que alguma vez o houvessem visto. A caixa do lado opposto ao mostrador era de esmalte preto, liso, tendo no centro, por baixo de um capacete, um escudo de armas de ouro encobrado e polido.
Havia poucos momentos que caminhavamos quando o individuo sentado defronte de F..., o mesmo que na estrada nos instara mais vivamente para que o acompanhassemos, nos disse:
--Eu julgo inutil asseverar-lhes que devem tranquilisar-se inteiramente em quanto �� seguran?a das suas pessoas...
--Est�� visto que sim, respondeu o meu amigo; n��s estamos perfeitamente socegados a todos os respeitos. Espero que nos fa?am a justi?a de acreditar que nos n?o t��em coactos pelo medo. Nenhum de n��s �� t?o crean?a que se apavore com o aspecto das suas mascaras negras ou das suas armas de fogo. Os senhores acabam de ter a bondade de nos certificar de que n?o querem fazer-nos mal: n��s devemos pela nossa parte annunciar-lhes que desde o
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