provas Eu protesto dar sempre ao Rei, e á
Patria. Longe de desculpar, porque he teu filho, Do Principe a Paixão,
funesta origem Da sua contumacia; com franqueza Direi meus
sentimentos, sem que possa Tolher-me as expressões o temor justo De
perder o favor, de ser odiado De hum Principe que adoro, e que respeito.
Se queres que teu filho te obedeça, Corta a indigna prizão que
maniatado O coração lhe traz, e que o estorva De entrar em seus
deveres: pune, extingue Esse objecto fallaz que a alma lhe encanta: De
contrario, Senhor, serão baldados Outros meios quaesquer que
projectares.
Af. Seja punida, sim, seja punida Mulher que tantos males origina; Que
impera mais do que eu, e que se atreve A usurpar-me do filho a
obediencia. Seu crime... Mas que digo!.. por ventura Não he meu filho
mais culpado qu'ella! Serei eu parcial punindo Castro, Sem que seja
igualmente castigado Quem deve mais do que ella ser punido?
Pach. O Principe he teu filho, tanto basta Para ser absolvido, e
desculpado: A condição d'Ignez he mui diversa.
Af. Não puno condições, puno delictos. Antes de tudo interroga-la devo.
D. Nuno, chama Ignez.(15) Ouvi-la quero, Sondar seu coração; depois
veremos Se he digna de castigo.
(15) Parte D. Nuno.
Pach. ................ Ah! Se attenderes Suas vozes, Senhor, suas escusas,
Por seu astuto pranto subornado, Deixarás por piedoso de ser justo.
Quem foi capaz de fascinar o Filho, Pode o Pai fascinar. Arte impostora
A peitos feminís Amor suggere: Quando as abraza criminosa chamma,
Negão as expressões o que a alma sente, E c'o auxilio das lagrimas
convencem. Attende, attende só ao bem do Estado, Ao exemplo que
deves ao teu Povo, Que, murmurando já, talvez se azede Se vir que em
nova guerra o precipita Do Principe a paixão escandalosa. Não soffrerá
Castella a grave affronta De ser, do seu Tratado em menoscabo, Por teu
Filho Beatriz repudiada: E o consorcio D. Pedro não celebra, Sem que
até da lembrança Ignez lhe affastes. Atalha em quanto podes tantos
males: Muitas vezes punir he ser piedoso.
Af. Tu me fazes entrar nos meus deveres. Para me resolver a castiga-la
Basta o bem do meu Povo que me lembras. No coração de hum Rei
digno do Throno, Se os int'resses do Estado a voz levantão, Compaixão,
amizade, natureza, Tudo, tudo immudece. Exterminada, Em remota
clausura Ignez reclusa, Da presença do Principe se affaste: Não torne a
ver meu filho essa que o céga, Em quanto, da razão accêso o facho, As
tochas de Hymenêo arder não faça; E se isto não bastar, mão
lançaremos De outro mais efficaz, duro remedio.
Pach. Não bastará talvez; por mais que seja Recatado, e remoto
qualquer sitio, Que para o seu desterro escolher possas, Lá mesmo irá
teu Filho arrebata-la. Eu calo o mais que sinto, e só te lembro Que a
quereres com ella ser piedoso, Poupando-lhe hum maior, justo castigo,
De Portugal ao menos a desterres. Occasião, Senhor, tens opportuna De
envia-la ao Monarcha de Castella, Que zeloso da filha no decoro,
Guardará providente em segurança A rival que se atreve a disputar-lhe
O coração do Principe. Este arbitrio Segue pois, se te apraz, bem que
inda o julgo Para tão grande mal remedio fraco.
Af. Seguirei teu conselho; porém antes Já de brandura usando, já de
ameaços, Quero tentar o coração de Castro; Vêr se a posso mover a que
ella mesma As chammas que accendeo apagar busque... Mas ella para
aqui já se encaminha.
SCENA V.
D. Affonso, Ignez, Pacheco, e D. Nuno.(16)
(16) Pacheco afasta-se para o fundo da Scena, logo que Ignez se chega
ao Rei, e D. Nuno que a conduz te retira.
Ign. Eu desfalleço... Oh Ceos... Excelso Affonso, Permitte que a teus
pés Ignez prostrada...(17)
(17) Prostra-se aos pés do Rei.
Af. Levanta-te, ardilosa. Não he digna De beijar a Mão Regia huma
vassalla, Que a perpetrar se atreve altos delictos.
Ign. Eu perpetrar delictos! Quaes são elles? Fiel sempre ao meu Rei,
vassalla humilde, Ignoro em que offendesse a Magestade.
Af.(18) Além de criminosa, inda impostora!.. A fallaz artificio em vão
recorres. De sobejo sciente do teu crime. Tua simulação mais me
enfurece: Ousarás tu negar que amas meu filho?
(18) Contemplando-a iroso.
Ign. Não, Senhor, a nega-lo não me atrevo... Nem, por mais que eu
quizesse, poderia Deixar de confessar o que os meus olhos, O rubor de
meu rosto assaz te explicão: Sim, se he delicto amar, e ser amada, Meu
coração, Senhor, he criminoso... Mas eu não sou culpada.
Af. .................. Que proferes? Se confessas tu mesma o teu delicto,
Dizes não ser culpada?
Ign. ................ Sou ingenua. Em chamar-me impostora te enganaste:
Tenho-te dicto assaz... e mais dissera, Se licito me fosse.
Af. .............. Acaba, dize: Que cegueira fatal, que louco arrojo, Vãs,
altivas
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