Folhas cahidas, apanhadas na lama | Page 4

Camilo Castelo Branco
galard?o.
JORNALISTA
Bem sei quantas calumnias forja a intriga...?J�� dellas foi manchado o grande Decio.?Quizeram macular Vossa Excellencia?Chamando-lhe espi?o, rival de _Mecio_!
MINISTRO
(_Commovido, e esfregando os olhos com cebola_).
Bemdito seja Deus! s�� elle sabe?As nobres inten?oens de tal ac??o!?Por honra, por nobreza, e por caracter,?De certo fui, meu caro, um espi?o!
JORNALISTA
N?o �� l�� grande feito de virtude;?Mas cumpre que eu me saiba haver na luta.?Conv��m negar o facto, ou confirmal-o??Bem sabe que �� de cr��r haja disputa.
MINISTRO
(_Limpando os oculos_).
Eu lhe digo, senhor, a patria exige?Medidas uteis, providencias, factos.?Accusa?oens banaes, n?o lhes responda;?A pedra �� livre em m?os desses _gaiatos_.
JORNALISTA
Pois bem! sou desse voto, ei-de julgal-as;?Accusa?oens banaes, pretr'idas, nullas;?Mas dado o caso infausto de citarem?N?o sei que transac?oens com certas bullas?
MINISTRO
(_Enternecido_).
Responda-lhe que eu fui proscripto, errante...?E quando ao ninho caro alfim tornei,?N?o s�� n?o tinha um pinto pr'a despezas,?Mas nem a livraria, em casa achei.
JORNALISTA
Pois bem, triumphar�� Vossa Excellencia...?Agora, se lhe apraz... sim... cada qual?Emprega neste mundo, como pode,?O seu... ou pouco ou muito cabedal...
MINISTRO
Intendo... quer dizer que n?o dispensa?Al��m do beneficio, uma pens?o...?�� justa, a quem trabalha a recompensa...?Quer cincoenta mil reis? pagos, ser?o.
_Cinco mezes depois._
JORNALISTA
(_Escrevendo_).
Senhor ministro, eu n?o posso?Este jornal sustentar?Tenho esp'rado, em v?o tres mezes,?N?o me acabam de pagar.
Vossa Excellencia me disse,?A vinte e tres de Janeiro,?Que no Governo Civil?Recebesse o meu dinheiro,
Nem um chavo! e os assignantes?Abandonam-me o jornal,?Porque defendo um governo?Vergonha de Portugal.
Se n?o manda, quanto antes,?Senhor ministro, as mesadas,?Com pesar vou abra?ar-me?��s outras cren?as passadas.
MINISTRO
(_S��_).
�� vista disto, n?o ha mais fugir-lhe...?Pouco me serve... mas �� pobre mo?o!..?Fazem-me pena quando assim os vejo...?N?o ha remedio sen?o dar-lhe um osso.
A D. EUSEBIA DA ASSUMP??O,
ALMA DE VACA.
Noiteb�� que esvoa?aste?No meu ceo d'alva illus?o;?E na chamin�� pousaste?Deste ardente cora??o;?Que mal te fiz, pulga d'alma,?Que mordes, sem compaix?o?
Dona Eusebia, gan?a amada,?Que picaste a minha flor,?T?o do intimo orvalhada?Pelos prantos desta d?r,?Dona Eusebia n?o me piques?Esta alcachofra d'amor!
Gata brava, n?o me bufes?Esta luz d'aspira??o;?Por quem ��s, tu n?o me atufes?Dona Eusebia d'Assump??o,?Nos abysmos insondaveis?D'assanhada ingratid?o!
Tu chamaste-me pangaio,?Quando eu quiz um riso teu!?Fulminou-me um impio raio,?Minha aspira??o morreu!?Ai! Natercia de chinelos,?Serei eu _pangaio?_ eu!!
Tens no peito ingrata, um chato?Cora??o de melancia.?Tanto tempo fui teu gato,?Gato d'amor e poesia!?Dona Eusebia, alma de vaca,?Morras tu de hydropesia!
AS LITTERATAS.
Paes de familia, hybridos caturras,?Escrevo para v��s! Se tendes filhas?Com sestro massador de fazer versos,?Dai-lhes p'ra baixo, como eu dou nas minhas!
Eu vejo serigaitas, mal lavadas?Do almiscar infantil de seus cueiros,?Fazerem rela?oens _c'os raios pallidos,_?_Da estrella matinal, do lago lympido,_?_Das auras ciciantes, e da aragem,_?E d'outras semelhantes trampolinas,?Que v��s n?o entendeis, nem eu, nem ellas.
Espevitam-se todas estas gaitas?Da musa melancolica das noutes.?Mal sabem onde tem a m?o direita,?N?o viram do nariz um palmo adiante,?E fallam de _paixoens intimas d'alma,_?_De cren?as desbotadas, e de flores_?_Fanadas ao soprar da leda infancia._
Acaso comprehendeis, paes de familia,?Da nova gera??o destas piegas?A triste chiadeira que nos fazem??Dai-lhes p'ra baixo como eu dou nas minhas!
N?o tendes uns fundilhos nas cilouras??N?o tendes roto o calcanhar da piuga??N?o tendes uma estriga, um fuso, e roca??Mandai-as trabalhar; dai-lhe a sciencia?Precisa para o rol da roupa suja.?Se lhe virdes romance, ou essas cousas?Chamadas folhetins, sobre a _toilette_,?(A _toilette_, meu Deus! por causa d'ellas?Perverteu-se a dic??o do nosso Barros!)?Dai-lhes p'ra baixo como eu dou nas minhas!
Quem �� o parvo que espozar-se queira?Com litterata alambicada e chocha??Sentada n'um soph��, sapho saloia,?Em languida postura requebrada,?Se eu visse a minha Antonia! ai que panasio,?Que revez de careca eu lhe pregava!
Paes de familia! n?o achaes bem triste?Entrar um cidad?o em sua casa,?Cansado de lavrar o p?o da vida,?E v��r sua mulher repotreada?Na othomana gentil, lendo romances??Pobre marido quer fallar d'uns frangos?Que baratos comprou, e a litterata?Pergunta-lhe se leu _Kossuth e os hungaros_!?O parvo franze a testa aborrecido,?Procura entre os len?oes um refrigerio;?Mas, no excesso da d?r, rasga as cilouras,?E no mundo n?o tem mulher ou anjo?Que lh'as saiba coser!.. ai do mesquinho!
Onze horas j�� s?o. O bom do homem?Tres vezes j�� pediu caf�� com leite,?Apertam-no negocios; mas em balde?Pediu com desespero o tardo almo?o.
A litterata esposa inda ressona,?Pois vira despontar a estrella d'alva?Nos rubros arreboes dos horisontes,?E, inspirada, fizera quatro quadras,?Ardentes de ideal romantecismo.
?Caf�� com leite!? brada em v?o tres vezes,?O bode expiatorio dos romances...??Caf�� com leite? os eccos lhe respondem,?Que a Stael d'agua doce inda ressona!
Maridos imbecis! eu vos lamento!?A culpa n?o foi vossa! Aos pais a imputo.
Madame Podest�� dizem que ensina?Grammatica, rethorica, hidraulica,?Mecanica, gymnastica, estetica,?E chymica, e botanica, e plastica,?O arabe, o sanskrit, a geographia,?A prosodia, a syntaxe, industria e canones,?E muitas cousas mais, como th'rapeutica.
Ser�� tudo mui bom; mas eu aposto?Que o remate de tantas luzes juntas?�� capaz de fazer perfeitas tolas?As muitas que l�� v?o com seu Juizo!?Paes de familia! tendes filhas d'estas??Dai-lhes p'ra baixo, como eu dou nas minhas!
Um pai eu conheci, que nunca soube?O seu nome escrever sem quatro asneiras,?E mandou ensinar francez �� filha.?A filha conseguiu, passados annos,?Uma cousa fallar mui duvidosa?Que os francezes, talvez, diriam tartaro!?Mas seria
Continue reading on your phone by scaning this QR Code

 / 10
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.