insultarem, eleito! que
dirás?
--Direi só:--estas gentes não são más,
Pois vindo-lhes prégar de terra
alheia,
Não me atiram aos olhos com areia,
Nem me espancam e
ferem com pedradas!
--Mas se as gentes, acaso, allucinadas
Te espancarem, causando
graves damnos?
--Estes povos, direi, são muito humanos,
E ha doçura n'aquelles
corações;
Pois quando erguiam pedras e bastões
Contra uma
creatura tão mesquinha,
Não tiraram a espada da bainha.
--Se o ferro te ferir?
--São bons, de sorte
Que me ferem, sem querer-me dar a Morte!
--Se morreres?
--A morte é grande esmolla!
--Vae pois, o Budha diz, salva e consolla!
*NO CALVARIO*
Maria com seus olhos magoados,
Ceus espirituaes, lavava em pranto
As largas chagas de Jesus, emquanto
Ria ao pé um dos tres
crucificados.
Semblantes de mulher mortificados
Escondiam a dôr no casto manto;
Uma mulher d'Hennon chorava a um canto,
Jogavam sobre a tunica
os soldados.
Martha, os pingos de sangue, alva açucena,
Dir-se-hia no bom seio
recolhel-os;
Alguns riam brutaes d'aquella pena!...
Salomé tinha um mar nos olhos bellos;
João fitava a Cruz... Mas
Magdalena,
Limpava a Christo os pés com seus cabellos!
*HÉLI! HÉLI!*
Quando elle, emfim, morrendo, elle o cordeiro,
Pomba mansa no ar
pesado e immundo,
Pendeu-se como um lyrio moribundo,
Sobre a
haste do tragico madeiro.
E lançando o espirito prufundo
Ao reino bello, grande, e verdadeiro,
Finou-se, emfim, chagado e justiceiro,
Ainda, ainda, perdoando ao
mundo.
Um soldado romano vendo-o exposto,
E já morto na Cruz, com um
desgosto,
Com a lança enristada o trespassou...
Saiu d'aquella chaga sangue e agoa...
--Ah sangue que não deu a tanta
mágoa!
--Lagrimas, sim, talvez que não chorou!
*AS ALDEIAS*
Eu gosto das aldeias socegadas,
Com seu aspecto calmo e pastoril,
Erguidas nas collinas azuladas--
Mais frescas que as manhãs finas
d'Abril.
Levanta a alma ás cousas _visionarias_
A doce paz das suas
eminencias,
E apraz-nos, pelas ruas solitarias,
Ver crescer as inuteis
florescencias.
Pelas tardes das eiras--como eu gosto
Sentir a sua vida activa e sã!
Vel-as na luz dolente do sol posto,
E nas suaves tintas da manhã!
As creanças do campo, ao amoroso
Calor do dia, folgam seminuas;
E exala-se um sabor mysterioso
D'a agreste solidão das suas ruas!
Alegram as paysagens as creanças,
Mais cheias de murmurios do que
um ninho,
E elevam-nos ás cousas simples, mansas,
Ao fundo, as
brancas velas d'um moinho.
Pelas noutes d'estio ouvem-se os rallos
Zunirem suas notas sibilantes,
E mistura-se o uivar dos cães distantes
Com o canto metallico dos
gallos...
*BENEFICIOS E PHILOSOPHIA DO SOL*
Tem sido até agora--o scintillante
E antigo Sol, amigo da Harmonia,
Que me tem ensinado, cada dia,
A desprezar a Morte escura e
errante!
As densas nuvens do porvir distante
Desdenha-as a sua epica alegria,
E a sua heroica e sã philosophia
Nada, até hoje, eguala e é
semelhante.
Decerto, é grato ao soffrimento insano
Dos tristes, quando surge o
_rosto humano_
_Da lua_, abrandecer o Ceu com ais;
Mas, quando é que jámais dobrou á Sorte,
A alma do _fakir_,
paciente e forte,
Mais sereno que as plantas e os metaes?!
*DISPUTA*
Voltaire dando com o pé n'uma caveira, ria
Com certo riso mau,
sinistro e mofador;
--A velha companheira, então, da Theologia
Dos
santos e da Cruz bradou ao pensador:
--És tu impio Voltaire, ó verme roedor
Das folhas do Evangelho! ó
Satan da ironia!
Cujos risos crueis fazem chorar Maria,
E
despregam do lenho a ensanguentada flor!?
Tu tens lançado o cuspo aos astros lancinantes;
Abalado da Cruz os
cravos vacillantes;
E ladrado de Deus que julgas a dormir!...
Mas olha em cima é o Ceu, dos astros sementeira!...
--Voltaire
disse-lhe então: Pois se assim é, caveira,
Por que te encontram,
sempre, ao pé da cruz a rir?
*AS CATHEDRAES*
Como vos amo ver ó cathedraes sosinhas,
A recortar o azul das
noutes constelladas!
Erguidos corucheus, mysticas andorinhas,
--Ó
grandes cathedraes do sol ensanguentadas!
Como vos amo ver, pombas alvoroçadas!
Ogivas ideaes, anjos de
puras linhas,
E ó criptas sem luz, aonde embalsamadas
Dormem de
mãos em cruz as santas e as rainhas!
Em vão olhaes o Ceu sagradas epopeias!
Flores de renda e luz,
d'incenso e aromas cheias,
Aves celestiaes banhadas da manhã!
Em vão santos e reis, ó monges dos desertos!
Em vão, em vão resais,
sobre os livros abertos,
--O Ceu por que chorais é uma ficção christã!
*LYCANTHROPIA*
L'auteur á remarqué que que la mort de ceux qui nous sont chers, et
géneralment la contemplation de la mort, affecte biem plus notre âme
pendaut l'été que dans les autres saisons de l'anineé. (Paradis artificiels)
Nuvens da tarde, azul fundo e sereno!
E astros inviolados, larangeiras!
Para mim não valeis seu riso ameno,
E aquellas _lindas_, languidas
olheiras!
Nunca mais... eu bem sei que nunca mais...
Ouvir-lhe-hei seus ais no
ar calado,
Junto á janella á tarde no bordado,
E entre as murtas do
outono... Nunca mais!
..........................................
Quando á tarde, no occaso, os penetrantes
Cheiros das plantas nadam
pelos ares,
E que as vermelhas nuvens singulares
Tomam formas de
sonhos fluctuantes,
Quando ha no azul a mystica elegia
Que nos lança nas lugubres
chimeras,
Eu scismo então--ó rutilas espheras!
N'aquella que já
come a terra fria!
E então n'aquella vaga somnolencia--
Somnolencia em que a terra
desparece!
Mais immortal seu vulto me parece;
Mais cruel e sem
fim _aquella auzencia_!
Nuvens da tarde, azul fundo e sereno!
E
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