grande honra,
assim por el-rei, como pelos prelados que por ella vinham. E muito
acompanhada até ao extremo, e d'ahi até á cidade de Sevilha, a saiu
el-rei seu filho a receber com muita clerezia e grandes senhores e
fidalgos que ahi eram com el-rei. E feitas suas exequias mui
honradamente, foi posto o seu corpo na capella dos reis, a cerca de
el-rei Dom Affonso, seu marido, onde ora jaz.
Sobre os casamentos dos filhos de el-rei Dom Pedro com as filhas de
el-rei de Castella, por que João Fernandes era enviado, foram faladas
muitas cousas com el-rei de Portugal, e não se accordando por então em
algumas d'ellas, depois acertaram todas suas avenças, como adiante
ouvireis.
*CAPITULO III*
_Das cartas que o papa, e el-rei da Aragão enviaram a el-rei de Portugal
sobre a morte de el-rei, seu padre_.
El-rei Dom Pedro escrevera ao papa, e a el-rei de Aragão, por novas,
quando el-rei Dom Affonso morreu, como seu padre era morto, e elle
alçado por rei em Portugal.
E tendo cada um cuidado de lhe responder, chegaram lhe n'esta sezão
suas respostas. E a letra do papa dizia assim:
«Innocencio, bispo, servo dos servos de Deus, ao muito amado, em
Christo, filho Dom Pedro, mui nobre rei de Portugal, saude e
apostolical benção.
Porquanto, muito amado filho, por tuas letras, e fama, fomos
certificado como o mui claro, de nobre memoria, el-rei Dom Affonso
teu padre, se finou d'este mundo, sua morte foi a nós, e é, mui grande
nojo e tristeza. E não sem razão o devemos ser, quando em nosso
coração cuidamos nas bondades e virtudes de que sua real alteza era
muito ennobrecida, por cuja razão o muito amavamos, desejando-lhe
que, entre todos os principes do mundo, o Senhor o accrescentasse, e
estendesse seu real estado, com prolongamento de bem aventurados
dias, nos quaes, acabando sua honrada velhice, a ti, seu primogenito
filho, deixasse o regimento e successão do reino em firme concordia
com teus visinhos.
E pois assim é que o Senhor Deus, em cuja mão é o poderio de dar a
cada um vida e morte, lhe prouve de piedosamente o levar d'este
mundo, nós pômos fim e acabamento á nossa dôr e tristeza,
consolando-nos n'este Senhor que dá e priva e tolhe, quando quer que
lhe praz, no qual havemos firme esperança que nos altos ceus dará bom
galardão e gloria á alma de el-rei, teu padre, pois, emquanto n'este
mundo viveu, se trabalhou de o servir com bons merecimentos, e lhe
aprouve com dignas virtudes.
E assim, muito amado filho, piedosamente te consolamos, que te
consoles no Senhor Deus, e consideres em tua vontade como succedes
no regimento de teu padre, o qual, por exemplo da vida, se mostrou
sempre ser fiel catholico.
Porém, requeremos á tua real clareza, que sempre, com firme desejo,
vivas em temor do Senhor Deus, honrando a sua santa igreja, e, sendo
favoravel ás ecclesiasticas pessoas, as mantenhas sempre em seus
direitos e liberdades; e que sejas amador e defensor das viuvas e dos
orfãos, alçando os aggravos aos teus subditos, que lhes não seja feita
injuria; e que, sem recebimento de alguma pessoa, sempre sejas
honrador e amador da justiça, de guisa que, por tuas obras, sejas
chamado por nome de rei que bem rege: e sei certo, se o assim fizeres,
que sempre em teus dias viverás em paz e folgança, havendo Deus em
tua ajuda, e a sua santa igreja te haverá em sua encommenda, sendo
prestes para toda a tua honra e cumprimento de justas petições. Diante
em Avinhão, etc.»
N'outra carta, de el-rei de Aragão, eram conteudas estas razões:
«Muito alto e mui nobre Dom Pedro, pela graça de Deus, rei de
Portugal e do Algarve: Dom Pedro, por essa mesma graça, rei de
Aragão, e de Valencia, e de Mayorca, e de Sardenha, e de Corsega, e
conde de Barcelona e de Rossilhão, saude, como a rei que temos em
logar de irmão, que muito amamos e prezamos, e de que muito fiamos,
e para que queriamos muita honra e boa ventura, com tanta vida e
saude como para nós mesmo.
«Rei, irmão. Recebemos vossa letra, pela qual nos significastes a morte
do mui alto e mui honrado el-rei Dom Affonso de Portugal, vosso
padre, a que Deus perdoe. E por essa mesma nos fizestes saber que vós,
assim como seu primogenito e herdeiro dos ditos reinos, ereis
levantado por rei de Portugal. Das quaes novas, em verdade, Rei irmão,
houvemos desprazer e prazer juntamente: desprazer da morte do dito
rei, o qual sabiamos que nos amava como seu filho e nós a elle como a
nosso muito amado padre; mas como da morte nenhuma pessoa seja
isenta, e o dito rei seja saido da miseria d'este mundo, doendo-nos d'ella,
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