Maria Barbosa du Bocage.
*SONETO.*
Entre as flores, que as Graças bafejárão, Curvas d'Elmano á prepotente
Lyra, Venus brincando com Adonis gyra, Dando-se beijos, que em
rosaes cevárão.
Assim contentes horas deslizárão, Ao som canoro, que o prazer inspira:
O Ceo pendente extasiado admira!.. Té que os Numes d'inveja ao som
raivárão.
Dedos torpecem!.. arrebentão cordas!.. Cumprio-se a voz de hum Deos,
cumprio-se a Sorte, Em quanto, Eco chorosa, os tons recordas.
C'roai-o, ó Ninfas, pranteai-lhe a morte: E ao menos, Jove, que em
prazer transbordas, Deixa vêllo de cá na etherea Corte.
Do mesmo.
* * * * *
*SONETO.*
Pungido pela dor, banhado em pranto, Desato, Elmano, minha voz
truncada, Que de gemer, de suspirar cançada, Acha o rouquejo no lugar
do canto.
Debalde em pragas mil a voz levanto Contra o Cypreste, lúgubre
morada, Que de funereas Aves carregada, Te condensa o pavor, o susto,
o espanto.
Para baldar o agoiro, em vão tentára Loiros dispôs em mimo
esperançoso, Que na aridez não vinga a ténue vara.
Rouba-me embora, ó Fado rigoroso, Esse que Lysia, o Mundo
assoberbára, Que o pranto he meu, prantearei saudoso.
Do mesmo.
* * * * *
Ao Senhor Manoel Maria Barbosa du Bocage.
*SONETO.*
Embebido na sólida Verdade, Zombas dos Impios, que sem pejo ou
mêdo, Decifrão de Mysterios o segrêdo; Trévas a nós, e Luz á
Eternidade:
Adoras a Suprema Divindade, (Teu futuro Juiz ou tarde ou cêdo) Na fé
se adóça teu remórso azedo, Esp'rando a divinal Tranquillidade.
Loucas Paixões, que fomentaste outr'hora, (Feiticeiro Manjar dos
flóreos annos, Que o Juizo maduro não vigóra)
Esses gostos fataes, gostos mundanos, Expiando na dor, que te devora,
Ganhas hum Deos, e choras os Profanos.
Joaquim Antonio Soares de Carvalho.
* * * * *
*ELOGIO AO PUBLICO*
Em nome de huma Actriz da Rua dos Condes.
A Musa, que nas Scenas de Ulysséa, Não sem gloria, ajustava o métro á
Lyra, De Elmano o só thesoiro (a Sócia mésta Da quasi muda cinza,
aérea sombra) Inda hum salvé tremente á luz envia, E dá versos á Patria,
ou dá suspiros, Da nobre Gratidão pelo orgão puro. Oh Lysia! Escuta
os sons, talvez extremos; Que do seio affanoso, a custo, exhála: (O
Cysne diviniza os sons da Morte) Ouve, em métro não baixo, ouve alto
affecto, Que me honra o coração, na voz me ferve, E no Patrio favor a
ardencia nutre. Recente Arvoresinha em chão bravio, De humor celeste
definhando á mingoa, (E mimosa jámais de hum Sol fágueiro) Eu para
a Terra, para a Mãi pendia, Que os succos mesquinhava ao tenro
Arbusto, Talvez de produzillo arrependida. Eis braço, a que apiedou
meu ser já murcho, Me extráhe, propicio, do Terreno avaro, E em
liberal torrão me põe, me arreiga. Súbito espérta, súbito enverdece A
Planta moribunda, e qual sé, ó Lethes, Afferrasse a raiz nas margens
tuas, Que das Furias o bafo esteriliza. Influxo animador me altêa, e
fólha; Hálito ameno de vivaz Favónio Com macios vaivens me embala
os ramos, Flores me adornão, fructos me atavião: Os sorrisos da Patria,
os mimos della Estas boninas são, são estes fructos. Das trévas, e da
Morte as Aves feias, (De atra voz, em que o Fado ás vezes sôa) Fogem
d'entorno a mim, carpindo agouros, Nas agras, negras furnas vão
summir-se; E na coma louçã gorgêa encantos Teu Cantor, Primavéra, o
vosso, Amores. Quanto sou, quanto valho, á Lysia devo, E á Lysia o
coração na voz consagro. Acólhe com ternura, acólhe, ó Patria, As
Offrendas por mim do triste Vate, Que para te cantar surgio da Morte,
E em ancias balbucía o tom dos Numes: Honra déste ao Cantor, dá
honra ao canto.
Bocage
* * * * *
*ODE*
Ao Senhor Manoel Maria Barbosa du Bocage.
Do boto engenho a sequidão, e a mingoa Suppri, vós Amizade, e
sentimento, E a frase ingenua, a Candidez saudosa, Tebêos thesouros
valhão.
Tinta sempre de negro a Fantasia, Em vão tactêa o viço dos Prazeres;
As sombras medrão, desaparece o esmalte Dos Parnásidos sonhos.
Anciado o coração, palpita, e pede Amenos quadros, que o vigor lhe
abonem; Mas, o seu oppressor, o Pensamento, Se produz, produz lucto,
E como affugentar, banir-lhe as trévas Se de hum, se de outro lado eu
sinto, eu vejo Duros arremessões, pendentes golpes Do meu verdugo, o
Fado.
Daqui me aponta a pálida Amizade, O Amigo, o Vate, o Pensador, o
Tudo (Socio nas ditas, e nas mágoas socio) Desviado, e penando.
Dalli me punge o indomito Destino: Novo Tantalo eu sou! Vejo a
Ventura, Cresce o desejo, esfórços se redobrão, Mas não posso
abrangella.
Impertinentes, faceis Conselheiros, Sizudo Aristocrata me pertendem
Systema, e Genio me prohidem; soffro Affanoso contraste.
Nos grilhões de hum dever, que me flagélla, Nem do meu coração
disponho livre! Quantas
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