borgonheses deviam privar com a rainha com quem tinham parentesco proximo, e com o soberano a cujo servi?o andavam.
Com effeito Affonso VI deu a Raymundo sua filha Urraca, com o governo de Galliza e da terra portucalense, e Henrique casou com D. Tareja, filha natural do rei e de Ximena Nunes ou Muniones, obtendo com esta allian?a o governo do districto de Braga sob o commando de Raymundo. O casamento foi celebrado antes do anno de 1095.
N?o chegaram ao nosso tempo documentos ácerca das condi??es com que se concluiu o casamento de Henrique de Borgonha com D. Tareja, porém sabe-se que em 1097 já o territorio que se estende desde o rio Minho até ao Tejo era governado por D. Henrique, sem opposi??o alguma do conde Raymundo de Galliza. O marido de D. Tareja possuia tambem todos os bens pertencentes á cor?a de Le?o, que estavam situados dentro dos limites designados. Devia ser concess?o de Affonso VI.
O territorio portucalense coube a Henrique de Borgonha como dote de sua mulher? Foi-lhe dado como governo ou como estado expressamente separado da cor?a de Le?o em favor dos noivos? Houve desde logo conloio entre Henrique e Raymundo para assegurar a plena soberania de ambos, sob a apparencia de sujei??o ao sogro commum? A extens?o das terras conquistadas aos arabes contribuiu para firmar mais a separa??o, e para augmentar a importancia do conde D. Henrique? Estas quest?es pedem larga escriptura, e fazem pouco ao assumpto d'este livro. O facto é que no fim do XI seculo a terra portucalense obedecia a D. Henrique, sem que todavia este principe deixasse de reconhecer a supremacia do rei de Le?o.
O conde borgonhez oriundo de uma das mais poderosas casas da Europa, sobrinho do rei de Fran?a, genro do imperador, e primo do conde de Galliza, com quem o ligavam tambem os la?os da affinidade, reunia em si todos os requisitos necessarios para obter, dentro em breve, preponderancia consideravel em todos os negocios da peninsula hespanhola. Conservar e desenvolver essa influencia, dependia só dos dotes pessoaes do principe.
A auctoridade moral do conde D. Henrique na c?rte de D. Affonso VI de certo se baseava principalmente n'estas circumstancias, pois que a qualidade illegitima de D. Tareja n?o impoz ao principe borgonhez nenhuma inferioridade que lhe diminuisse o poder ou que restringisse as suas perten??es ambiciosas.
III
A TERRA PORTUCALENSE
A terra chamada portucalense era conhecida com este nome desde o meado do seculo XI. Tinha por limites ao norte o rio Minho, e ao sul o Mondego, comquanto as armas christ?s já tivessem por mais do que uma vez chegado ao Tejo, e mesmo tomado Lisboa, como fica dito. Lamego, Vizeu e Ceia eram as terras mais consideraveis da fronteira oriental. Ao sueste acabava o territorio na serra da Estrella, e ao oeste no oceano.
O districto de Coimbra ou condado colimbriense, come?ava no Douro, e acabava no Mondego. Um mosarabe da Beira, chamado Sesnando, deixára o servi?o do emir de Sevilha Ibn-Abed, e f?ra prop?r ao rei Fernando Magno a conquista d'este territorio. A tentativa foi coroada de exito feliz, e Sesnando recebeu do soberano leonez o governo d'esta nova provincia, acrescentada com a terra portucalense ao sul do Douro.
Esta regi?o desde o Douro até ao Mondego, n?o era a Lusitania de Strab?o, a qual chegava até ao mar no norte e no occidente, e ao Tejo pelo lado do sul; nem t?o pouco se póde confundir com a Lusitania do imperador Augusto, divis?o geographica limitada ao norte pelo Douro, e ao sul pelo Guadiana. Era uma regi?o conquistada, reunida e disposta pelos incansaveis pelejadores christ?os.
Estavamos t?o acostumados a dar a Portugal o nome de Lusitania, e a tomarmos a denomina??o latina de lusitanos, que chegamos a julgar-nos decaídos do esplendor genealogico da nossa ra?a, quando o sr. Alexandre Herculano escreveu que só no seculo XV tinhamos come?ado a usurpar essas qualifica??es. Parece que foi em 1481, diante da santidade de Sixto IV, que o bispo de Evora D. Garcia de Menezes deu pela primeira vez o nome de lusitanos aos habitantes de Portugal. Até ent?o foramos sempre portucalenses desde tempos remotissimos.
A origem d'este nome está hoje bem averiguada. Na margem esquerda do Douro, onde hoje se chama Gaia, havia uma povoa??o com o nome de Cale. Pequena ou grande, era a unica povoa??o da entrada do rio, e por isso o porto se chamou Portus Cale, porto de Cale. Querem alguns que a terra tivesse sido povoada por gaulezes que deram ao porto o nome de Portus Gallorum, ou Portus Galli?. Eu n?o creio que esse intrincado ponto mere?a a pena de ser resolvido.
A verdade é que o nome de Cale figura no itinerario de Antonino, que a designa??o Portucale data do seculo V, e que a aldeia de Gaia ainda em 912 se chamava assim. O territorio visinho e dependente

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