A Paranoia | Page 8

Julio de Mattos
s�� come?am, em geral, mais tarde e n'uma epocha variavel?[2].
[2] Legrand du Saulle, Obr. cit., pag. 43.
Como Las��gue, Legrand du Saulle admitte um periodo de declina??o na doen?a, que, sendo, em regra, incuravel, p��de terminar pela cura n'uma quinta parte dos casos. Na etiologia, Legrand du Saulle constata, como Las��gue, que a doen?a �� mais frequente nas mulheres e se realisa preferentemente na epocha por excellencia das grandes luctas da vida. Algumas considera??es que faz sobre a hereditariedade, o onanismo e as persegui??es infantis s?o de um caracter vago. Como se v��, em tudo quanto p��de servir para caracterisar como especie o delirio de persegui??es--na symptomatologia, na marcha, na etiologia, Legrand du Saulle n?o faz sen?o seguir a memoria de Las��gue.
Vamos v��r que n'um ponto de maxima importancia, n?o tratado pelo eminente professor da faculdade de Paris no seu trabalho de 1852, Legrand du Saulle acompanha a memoria de Foville. Refiro-me �� passagem do delirio de persegui??es ao de grandezas, explicada, como vimos, por Legrand du Saulle acceita esta mesma pathogenia. ?Depois, diz elle, de ter soffrido tantas hostilidades da parte de implacaveis inimigos, depois de ter sido victima de tantas interven??es devidas �� magia ou ao electro-magnetismo, o perseguido recolhe-se por vezes e pensa: Como podem em pleno seculo XIX produzir-se factos d'esta natureza? �� preciso admittir no fundo de tudo isto uma energica vontade superior, a de um alto personagem, a de um principe ou, talvez, de um rei! Deve ter sido necessaria, com effeito, para explicar o meu caso uma auctoridade verdadeira, que s�� p��de existir nas m?os de millionarios, de ministros e de imperadores: quem ordenou tudo ��, pois, um grande senhor ou um notavel personagem. Um outro perseguido pensar��: Armam-me redes, mas eu evito-as; exp?em-me a coalis?es formidaveis, mas eu saio-me bem d'ellas; attentam contra a minha vida, mas eu resisto; alguem, pois, de um alto poder vela por mim e me protege; esse alguem �� o chefe do estado. Eis, a partir d'aqui, toda uma ordem nova de id��as imprimindo uma outra direc??o ��s concep??es delirantes e ��s allucina??es. O perseguido n?o cessa desde ent?o de fallar em ministros, em familias reinantes, na c?rte pontifical, desconhecendo o caracter real das pesssoas que o cercam e affirmando que Napole?o lhe envia mensagens, que Trochu o chamou, que Thiers vae recebel-o, que tal ou tal princesa vem visital-o. N'uma palavra, encontramo-nos em presen?a de id��as de grandeza pathologicamente juxtapostas, porque as persegui??es n?o cessaram, os inimigos existem ainda?[1].
[1] Legrand du Saulle, Obr. cit., pag. 84.
?Acabamos de constatar, continua Legrand du Saulle, erros grosseiros sobre a personalidade dos outros; pois vamos v��r que uma nova transforma??o se opera agora e que erros mais grosseiros ainda v?o dar-se d'esta vez sobre a personalidade de perseguido. Sigamos um pouco o raciocinio do doente: As opera??es dos meus inimigos, pensa elle, s?o t?o desleaes como persistentes e perigosas; os meus inimigos s?o infatigaveis e poderosos; mas que interesse podem elles ter em me mortificarem d'este modo, a mim, homem ignorado, obscuro ou collocado n'uma situa??o modesta? O contraste entre os perseguidores e a victima �� dos mais notaveis. Quem sou eu com effeito? Talvez um ser menos apagado do que se pensa, mais importante do que se imagina, mais temivel do que se supp?e. E nem p��de deixar de ser assim. Enchem-me de humilha??es odiosas, dirigem contra mim os mais tenebrosos attentados; ha, pois, um interesse em fazel-o. Esse interesse parte de millionarios, duques, principes ou imperadores, e ��, portanto, dos mais consideraveis. Mas ent?o fa?o eu sombra a alguem e esse alguem roubou-me necessariamente o meu nome, o meu titulo, a minha fortuna, o meu logar social, a minha cor?a. Eu n?o sou, portanto, o homem humilde sob cuja mascara vivi at�� hoje: fui mysteriosamente posto de lado, iniquamente esbulhado; o nome de que uso n?o �� o meu, os que teem feito de meus paes n?o s?o da minha familia; eu sou o neto de Luiz XVI ou o filho de Napole?o, sou o duque de Orleans ou chamo-me D. Carlos?[2].
[2] Legrand du Saulle, Obr. cit., pag. 85.
Para n?o deixar de seguir passo a passo Foville, que, como vimos, notara a relativa frequencia do delirio ambicioso nos perseguidos filhos naturaes, Legrand du Saulle accrescenta: ?Se o perseguido n?o tem um acto de nascimento regular, se alguma vez soffreu pelo facto de uma situa??o indecisa, de uma paternidade n?o confessada ou de uma educa??o mysteriosa, se o seu orgulho foi torturado ou lesada a sua fortuna, com que perniciosos elementos n?o crescer�� o seu delirio, com que apparencias de verosimilhan?as n?o fallar�� elle a todos da sua imaginaria fortuna, do seu nascimento illustre?!?[1]
[1] Legrand du Saulle, Obr. cit., pag. 86.
Como Foville e Morel, Legrand du Saulle refere casos em que no delirio de persegui??es se observam concep??es hypocondriacas; estas,
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