como fascinado, parecendo-lhe mais que estava passando por um d'estes magicos sonhos de delicioso encanto, que tantas vezes embalam a imagina??o juvenil, do que assistindo á realidade de vêr e ouvir ao seu lado um anjo, esplendoroso d'encantos, e suavissimo d'harmonia nas fallas.
--Olhe, dizia Magdalena alegre, radiante e sempre formosa; olhe este pé de suspiros. N?o é t?o, bonito?
--Formoso, minha senhora.
--E estas saudades, n?o s?o t?o lindas?
--Muitissimo. Saudades... as fl?res symbolicas dos que soffrem; dos que, como eu, longe da patria, aonde deixaram a familia, vivem na esperan?a de lá voltar, sem terem, comtudo, n'ausencia d'ella, um affago, que lhes adoce a aridez do trabalho; um carinho, que lhes lisongeie o sentimento, um consolo n'este correr da existencia, isolado, monotono e, por muitas vezes, triste.
--O senhor Luiz tem muitas saudades da sua terra, tem?
--Se tenho!...
--Tambem eu as sinto! disse Magdalena com ar melancholico.
--Saudades, minha senhora?! perguntou Luiz admiradissimo.
--Sim, admira-se?
--E com raz?o. Pois V. Ex.a, cercada de todas as commodidades da vida, dos extremos e affagos d'um pae, que é mais que muito carinhoso; nova, formosa, permitta-me V. Ex.a esta verdade; vendo realisados todos os desejos, satisfeitas todas as vontades; V. Ex.a, que é, que deve realmente ser muito e muito ditosa aos olhos de toda a gente, e aos olhos proprios, confessa que sente saudades, e n?o ha de querer que eu, exilado, sem familia, sem estes nadas da vida, que a dulcificam e embellezam, me admire e espante d'essa confiss?o?
--Que quer? Tenho-as, sim, mas tambem n?o sei de que, para lhe fallar a verdade.
--Comprehendo. N'esse caso melhor será que V. Ex.a diga antes que tem desejos... E emfim, quem sabe? Na idade de V. Ex.a, na idade florida dos amores, dos enthusiasmos, das alegrias, das expans?es e dos sonhos formosissimos, ha sempre, póde pelo menos haver, muita vez, algumas d'essas melancholicas florinhas, que s?o, ent?o, como pequeninas nuvens no azul d'um céo estrellado e deslumbrante.
--N?o é isso, disse Magdalena levemente contrariada. N?o é isso, porque eu nunca amei.
--Ah! V. Ex.a nunca amou?
--Nunca, pelo menos que eu saiba, respondeu ella ingenuamente.
--Mais um motivo para eu crêr que o que V. Ex.a tem, s?o desejos de amar e ser tambem amada.
--Talvez, accudiu Magdalena córando, e pregando em Luiz os seus negros, grandes e formosos olhos.
--E acreditaria V. Ex.a no amor do primeiro homem, que ousasse render-lhe um culto, confessando-lhe esse sentimento?
--Conforme. O cora??o é que havia de decidir.
--E o cora??o de V. Ex.a n?o lhe diz nada? n?o lhe lembrou ainda um nome? um homem, a quem tenha de dar as perolas valiosissimas do seu affecto?
--Já.
Luiz estava pallido e tremulo de commo??o.
--Oh! se fosse eu!... murmurou elle.
--Que tinha! era muito feliz, era?
--Se era, minha senhora! muito! muito!
--E amava-me? perguntou Magdalena anciosa, e um tanto agitada.
--Oh! com delirio até!
--Pois ent?o n?o dê a mais ninguem o seu amor, porque... eu tambem o amo muito!
E a formosa filha do cabinda olhou para todos os lados como receiando que alguem a ouvisse.
Crean?a!
Que commo??es a n?o abalaram n'aquelle momento! que agita??o n'aquelle seio t?o estreito, agora, para as ondula??es do cora??o, que tantas fl?res estava desabrochando!
Era a primeira vez que lhe fallavam d'amor! era a primeira vez que um homem a impressionava.
O que ella viu, o que ella sentiu, era o Paraiso com as bellezas deslumbrantissimas dos seus vastos e perfumados jardins! era o céo com todas as harmonias das suas orchestras, afinadas pelos dedos dos anjos!
Luiz esqueceu-se da patria, da familia, das saudades, que tinha por uma e outra, e come?ou, n'uma como vis?o phantastica, a vêr diante de si um horisonte illimitado de felicidades sem fim!
Que dia aquelle! que dia t?o venturoso! D'um lado os beijos carinhosos da fortuna, do outro, as fl?res magicas do amor d'um seio de virgem!
Eram t?o violentas as commo??es que o abalavam que apegas poude murmurar:
--Juro-lhe que a hei de amar eternamente! mas supplico-lhe que n?o me engane nunca!
--Nunca! prometto-lh'o pela memoria sagrada de minha m?e!..
E embebidos nas do?uras, nos enthusiasmos d'este colloquio, que jámais devia ser esquecido Luis e Magdalena tinham-se affastado um pouco para um dos angulos do jardim.
Sentaram-se como que machinalmente.
Magdalena voltava e revoltava entre as suas m?os mimosas e pequeninas um vi?oso suspiro; Luiz aspirava o fumo d'um delicioso charuto bahiano, e arrojava depois ao espa?o as ondas azuladas, as nuvens pequeninas do fumo aspirado.
Os pés dos jasmineiros floridos impregnavam a atmosphera de perfumes que inebriavam.
E o p?r do sol, o cahir das primeiras sombras do crepusculo da tarde, come?avam a pesar na alma d'aquelles dois namorados, estremosos como duas juritys.
--Parto d'aqui a pouco, minha senhora, disse Luis olhando com saudade para Magdalena.
--Mas ha de vir ver-me sempre que poder; sim?
--Sempre que n?o haja quebra de conveniencias.
--Conveniencias? interrogou Magdalena.
--Sim, minha senhora. Bem vê V. Ex.a que a minha presen?a muito frequente n'esta casa, póde despertar suspeitas, e eu n?o desejo, nem devo desgostar o
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