Verdades amargas | Page 3

Claúdio José Nunes
madureza de espirito, qualidade digna de ser apreciada por quem j�� n?o tem pulm?es para folegos profundos. Em vez de cirios e cavalgatas, passaremos os ser?es a grudar as folhas da Carta, violentamente rasgada n'um minuto de pressa, e, grudar por grudar, grudemol-as n��s. Esque?am-se quinze annos de amuo nas aras de um prudente consorcio.?
Mas uma voz grita do lado:
?Arreda-te, bruxa maldita. Aqui estou eu, que sou a Reforma. Sou joven e bella, airosa e poupada. Uma cho?a e teu cora??o, meu guapo marechal! Ahi fiaremos uma existencia de rolas e pediremos �� egreja que aben??e este feliz matrimonio.?
Clamam de baixo:
?E eu sou a Revolta! Nos meus bra?os robustos tens um throno de affectos. S�� eu sou a forte; s�� eu sou a bella. Despreza a velhice prudente e a infancia dengosa. Rodopiarei comtigo n'uma orgia perpetua. Ora soltarei os cabellos aos ventos da demagogia, ora polvilharei de ouro as tran?as luzentes Desde a lama at�� ��s estrellas ser�� estreito o espa?o para as nossas folias.?
E assim foi.
E haver�� criterio moral n'um paiz aonde se corteja o poder com t?o notavel impudor?
E depois?
Depois veio a queda. Um golpe de estado desfez o que fizera o motim.
Cura perigosa de uma perigosa doen?a.
O paiz n?o ach��ra em si for?a sufficiente para debellal-a e entregou �� cor?a a manipula??o do remedio.
Triste confiss?o de impotencia! Triste symptoma constitucional!
Caiu o marechal. Era execrada a dictadura. Moveu-se-lhe guerra em nome da nossa autonomia. Contra os actos d'ella subiram as queixas dos partidos at�� aos degr��os do throno, que as ouviu e attendeu.
Pois bem. Despediu-se o artista mas guardou-se a obra. As leis da dictadura s?o leis do paiz. Os auctores e collaboradores d'essa gloriosa empreza, acabam em santa paz a digest?o do festim, e um muito a meu contento que seria a condemna??o do proprio decreto em que foi lavrado, se n?o f?ra uma fic??o constitucional, passa um golpe de esponja sobre a logica de uma situa??o!
Assim era necessario para que quem morrera ministro resuscitasse embaixador; isto ��, n'um cargo de absoluta confian?a politica ao servi?o de uma das parcialidades que maior guerra lhe mov��ra!
Um recebe e parte.
Outro n?o parte e recebe.
O paiz olha e paga.
�� vista de um episodio d'estes haver�� criterio moral no paiz?
II
Se �� verdade, o que fica exposto, n?o deve causar estranheza que o paiz n?o tenha claras no??es de seus direitos e de sua responsabilidade; direitos pelos quaes deve responder n?o perante a maioria mas perante a universalidade dos cidad?os portuguezes; responsabilidade que lhe compete diante da prosperidade publica, da lei e da historia.
O codigo de nossos direitos �� a Carta constitucional da monarchia.
Em quanto existir ser�� o vehiculo legal de toda a actividade politica.
Mas quaes s?o, de entre alguns milh?es de portuguezes, os que tem conhecimento directo d'esse pequeno volume, que nos custou rios de sangue e montanhas de ouro?
O povo, opprimido ainda pela tradi??o secular da ignorancia que lhe era imposta pelo interesse de uma politica de confessionario e de c?rte, nos tempos do direito divino, sae ainda hoje, lentamente e como que a custo, de uma existencia passiva e expressamente concentrada nas cousas do mundo physico, para as regi?es moraes aonde brilha a id��a democratica da sociedade moderna.
Conhece, portanto, a constitui??o s�� pela pratica, e como a pratica n?o tem geralmente sido a fiel interpreta??o da theoria original, n?o admira que o grosso do paiz ao cabo de trinta e tres annos de exercicio constitucional, ainda n?o comprehenda bem at�� onde chega o alcance das armas que lhe poz nas m?os o systema representativo.
As fontes do exemplo, seu guia, espelho e mestre, n?o lhe tem, de certo, vertido os mais puros licores.
* * * * *
Na cupula do edificio est�� o poder moderador na pessoa do chefe do estado.
�� certo que ��s espheras serenas, aonde paira, n?o devem chegar as lufadas das paix?es partidarias nem os pratos da balan?a em que se peza a sorte arbitraria dos ministerios.
�� certo que o rei �� irresponsavel.
Mas tambem n?o �� menos exacto que essa irresponsabilidade n?o �� congenita ao exercicio da cor?a, por��m nasce unicamente de um artigo da Carta.
Suspensa, pois, de facto a constitui??o pela dictadura, a irresponsabilidade real caduca desde logo.
Morta a causa, desapparece o effeito.
P��de-se, pois, alludir, sem quebra de lei, a um acto importante de responsabilidade pessoal, que teve logar no mez de maio do corrente anno.
Quatrocentos soldados invadem o pa?o da Ajuda. Falla a polvora e caem as victimas. O duque de Saldanha intima a demiss?o do ministerio, ao qual dera a sua palavra de honra de que nunca se revoltaria.
Cede o rei e concede a dictadura. A bondade natural de seu cora??o recua diante da possibilidade de um conflicto que levasse os salpicos do sangue at�� ��s ruas da capital. Em seu animo, inclinado �� paz, bate de chofre, paralysando-o, a responsabilidade eventual de uma
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