Scenas Contemporaneas | Page 9

Camilo Castelo Branco
muito bem chamar-se Jos�� Maria, n?o era t?o escasso de meios que n?o comprasse um creado da casa. O creado era o intermedio da correspondencia, menos da ultima carta, surprehendida pelo magistrado. Esta carta authorisava Jos�� Maria a empregar a for?a judicial para tirar de casa Miquelina. N'esse mesmo dia, a perigosa ?donzella? foi mudada para casa de um general, cunhado de seu tio.
O general era solteiro, homem de cincoenta e tantos annos bem conservados, admirador das boas mulheres, e vigoroso ainda para n?o desmentir o culto, quando se lhe pedissem provas praticas das theorias um pouco irrisorias na sua idade.
Tinha comsigo duas irm?s, mais novas, que, mutatis mutandis, professavam as id��as do irm?o.
Dito isto, v��-se que a casa, onde Miquelina foi reclusa, era um viveiro de moral.
Foi bem recebida, e at�� muito bem aconselhada. As irm?s do general fallavam muito da virtude, e da honra. Quem as n?o conhecesse, acrescentaria duas martyres ineditas ��s onze mil virgens conhecidas, de que Byron duvidou, e eu n?o me sinto muito propenso a acreditar, nem o meu amigo Valladares.
O Jos�� Maria n?o sei que fim levou. Seria algum d'esses quatro que em 1845 se precipitaram dos ?Arcos das Aguas-livres!?? Se foi, n?o andou bem, porque fez as cousas de modo que ninguem falla d'elle. Os Werthers sabem escolher as occasi?es, sen?o... �� melhor deixarem-se morrer de tedio, que �� a morte que me espera a mim, e a ti, leitor, no fim d'este livro, se n?o morreres no meio.
O general namorou Miquelina. Namorando-a, seduziu-a. Seduzindo-a, abriu-lhe a outra meia porta da corrup??o.
Porque foi assim que as cousas se passaram:
Miquelina affei?oou-se ao general, como se affei?o��ra a Valladares, ao lacaio, e ao Jos�� Maria. Trazia o cunho da perdi??o! Era uma d'estas desgra?adas que a gente v�� cahir, cahir, cahir a despeito de todos os estorvos! Que Deus, ou que demonio imprime o movimento n'estas machinas, sem cora??o nem cabe?a? N?o se sabe! A verdade �� que eu sinto vontade de chorar essas victimas cegas d'um destino barbaro, e tenho furias de blasphemo quando me dizem que Deus se entremette nas cousas d'este mundo... Vamos adiante, sen?o atiro a penna f��ra, e rasgo o papel...
Ora j�� vedes que o general era um devasso, e a pobre menina deve merecer-vos uma pouca de compaix?o, se eu vos afian?o que o amou, at�� ao ciume.
Disseram-lhe um dia que uma mulher de capote e len?o entr��ra no quarto do general, que era ao rez da rua. Miquelina estava doente de cama. Ergueu-se com febre, vestiu-se precipitadamente, desceu as escadas cambaleando de fraqueza, escutou �� porta do traidor, e ouviu risadas, e palavras obscenas.
Era noite, quando isto se passava.
As irm?s do general deram pela falta da hospeda, e desceram a procurar o irm?o. Miquelina, quando as sentiu, na incerteza do que devia responder-lhes, fugiu. Fugindo, achou-se n'uma rua que n?o conhecia, atravessou umas poucas, chegou a uma pra?a onde encontrou umas mulheres esfarrapadas que a tractaram por tu, e fugiu at�� deparar as escadas d'uma igreja, onde um soldado lhe veio dizer palavras desconhecidas.
Fugiu ainda; mas a desgra?a corria a par d'ella.
O frio da noite, e a febre do cora??o aniquilaram-na. Sentou-se n'um portal, e desmaiou. Uma patrulha deu-lhe com a ponta do p��, e a desgra?ada n?o respondeu. Tomaram-na como bebeda, e foram seu caminho.
Outra patrulha sacudiu-lhe a cabe?a pelos cabellos. Miquelina gemeu, abriu os olhos, e pediu erguendo as m?os que a deixassem morrer. Estava perto do hospital de S. Jos��. Os soldados pediram soccorro ao proximo corpo da guarda, e mandaram-na para l��.
No hospital, deram-lhe uma cama na enfermaria... n?o sabemos que enfermaria; mas parece que o facultativo, na visita de manh?, mandou retirar a mulher para um quarto particular, pago �� sua custa.
Que foi o que ella disse ao medico? Nada. Seria n'elle um arrojo de caridade? N?o. ?Pois n?o tens uma palavra boa para explicar uma ac??o nobre?? Nobilissimos leitores, deixai-me supp?r que sois melhores pessoas que o medico. O que elle queria era uma creada, com as fei??es de Miquelina. As despezas da cura, al��m de ficarem encontradas no seu ordenado, seriam pequenas. Uma febre benigna n?o resistiria ao tratamento de oito dias.
Mas, ao setimo, Miquelina fugiu do hospital, favorecida pela enfermeira, em cuja casa foi residir.
Desde esse dia, chamou-se Rosa. ........................................................................... ...........................................................................
--Que bonita rapariga �� aquella que est�� em casa da A * * * na cal?ada do Duque?
--�� uma rapariga da provincia, pela pronuncia: chama-se Rosa, mas n?o diz d'onde ��, nem quem a trouxe alli.
--Parece bem educada!
--Parece... e n?o �� desbocada... N?o tem ainda a consciencia do seu officio... �� necessario que perverta a linguagem, se quizer celebrisar-se...
--De quem fallam voss��s?--disse um terceiro, que, na Pra?a do Rocio, veio associar-se ao grupo.
--D'aquella Rosa, que tu denominaste um cherubim precipitado na tua poesia.
--E ��...
--��!... pois tu sabes a vida
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