Santarenaida: poema eroi-comico | Page 9

Francisco de Paula de Figueiredo
pois, que és marralheira, ásde mui prestes?Em sua mesma M?sa transformarte;?E eu tornado em agua facilmente?Na vazilha entrarei que tu lhe deves?Lampeira ministrar. Ele sedento?Nem se he vinho, ou se he agua reparando?A enfuza vazará no grande buxo.?Deste modo a meu salvo os intestinos?ávido devorando o darei morto,?E terei concluido a grande empreza.?Vamos pois sem demora vem comigo.
Vamos onde quizeres; insofrida?A Astucia respondeu. E logo promptos?Metidos n'uma nuvem negrejante?Tirada por seis Euros rujidores,?Despejando coriscos sentelhantes?Ao orrorozo som d'um trova? grande?Sobre a airoza Coimbra em fim baixára?.?Mas como do Deleite o Santareno?Estava no país, ordena Próteo?Que a Astucia dali sacar o fasa,?E á Cidade o conduza aonde a trama?Para o pobre cair armar pertende.
Entre os longos Estados da Mentira?Infame Imperatris da maior parte?Da terráquea mole, junto ás fraldas?D'uma verde colina alcantilada,?Sobre um campo espasozo, plano, ameno?A que rega? d'um rio as mansas aguas,?A galante Cidade encantadora?Do vaidozo Deleite está plantada,?A pálida Doensa, os Desprazeres,?Os Remorsos crueis, a orrivel Morte?O cume senhoreia? do alto monte.?Mas o Engano traidor, c'um tolde espêso?Tudo isto ávido encobre á gran Cidade.?Nela tudo he prazer, tudo he descanso.?O povo abitador ao ocio dado?Só cuida em divertirse: o Baile, o Jogo,?Os Cantos, a Luxuria, os Boms-bocados?Aqui abíta? ledos: pelas ruas?Amplas Satisfasoins anda? jirando?Ministros de seu Rei: seu Rei parese,?C'o as fraudolentas c?res que a Mentira?Arteira sobre modo o tem pintado,?Um rapás mui lousa? de afavel jesto.
Aqui de toda a parte os povos correm?De seus serios deveres deslembrados?A pedir a este Rei, quais seus dezejos,?Tais as Satisfasoins, que outorga facil.?Aqui a avía vindo o Santareno,?E a meiga sua Espoza a Santarena,?A pasar algums dias satisfeito?Do fim da grande asa? com que ultimando?A mais árdua vitoria felismente,?Tinha a um nome de impávida memoria?Por entre o ferro, e o fogo alcanse dado.
Mas a doloza Astucia que na? sabe?Desvelada perder monsa? de efeito,?Por Próteo instigada, em continente?As cambiantes azas solta aos ares,?Dá nele d'improvizo, e asim o ataca:?Dos remorsos se val acuzadores;?E por uma maneira extravagante?De seu alto saber somente propria,?C'o as cores da raza? na triste ideia?Seu vil procedimento lhe debuxa.?Faslhe ver com a mesma consciencia?Como he mais justo que um Eroi constante,?Que as desgrasas tratou de bagatela,?Em as prosperidades na? se infune.?Que na? dê que falar ao povo rude,?Que murmurante na Cidade o acuza?Pelo ver aos prazeres ta? sensivel.?Que deve a sua caza retirarse,?Tirar do vencimento util proveito,?Na? confiarse em si, porque inda as Aguas?Estancado na? tem as forsas vastas.?Aqui do astuto Anibal traslhe á mente?E do Magno Pompeo exemplos vivos,?Que ja devem fazelo escarmentado.
Em fim estas solicitas lembransas?De tal sorte do Eroi fervelha? n'alma,?Que em si caindo parte rezoluto.
*CANTO VII.*
Entretanto em Coimbra amotinada?Era inda o pasmatorio inexplicavel?Por cauza do trova? medonho, e orrivel,?Que desde os fundamentos abalára?As altas cazas, e fizera aos sinos?Por si mesmos tocar nos campanarios.?Soava Sa? Jeronimo inda em partes,?E em outras Santa Barbara bemdita?Com espantozos berros; e a vizinha?á timida vizinha inda contava?Das viboras de fogo c?r de enxofre,?Que tortuozas rápidas caíra?.
Os dois obézos vultos, que sozinhos?Pelas sombras da noite caminhava??Vinha? asustadisimos: em bica?Lhes corria o suor, e sem falarem?Só vinha? nas camandolas sebentas?Ave Marias mil, e Padre Nosos?Ums ap?s outros engolindo a medo.?A caza em fim xegára?, e por terra?Depois de averem dado aos Ceos as grasas?Pelos ter dos perigos defendido,?Enta? uma Sobrinha por miudo?As coizas lhes contou que se pasava?.?Diselhes, que depois que eles se fora??Ao seu divertimento, na Cidade?Em nenhuma outra coiza se falava?Sena? no grande risco a que seu Tio?Tinha ficado exposto; que entre dentes?Na? sei que se rosnava; pois que o Xefe?Inimigo tentava armar ocultas,?Fraudolentas traisoins; que era precizo?Cautela, e mais cautela: acrescentando?Que teve ums sonhos (de que Deos nos livre)?Mesmo áquele respeito asás funestos.?No que na? creu o Eroi; porem Madama?C'o a noticia em extremo intimidada,?Asentando que ali avía agoiro,?Fês que viese a caza no outro dia?Uma ábil Franxinota a lerlhe a sina.
Asim foi: uma veio asás jocoza?De cabasa, e borda?, trincos nas repas?Formados em torcidos papelotes,?Pálidas ma?s, agaloadas unhas,?Altas as saias com franjoins de lama,?Mursa nos ombros de ensebado coiro?Com redondas conxinhas matizada,?E um de languidas ábas xapeo ruso?Com varios em redor Santiaguinhos?No alto da cabesa c?r de estriga.
Era esta sagacisima, adestrada,?Mestra no ultimo ponto em Chiromancias.?Olhou, examinou, tomou medidas,?Mas viu mil cruzes na polpuda palma?Do magnanimo Eroi, mil entrelinhas?Cortando inteiras linhas, mil figuras,?Mil indicios em fim de agoiro aziago,
De caza em todos toma pose o susto:?Parese cada cara uma laranja.
Porem o Santareno que prezume?Ser em materias tais dezabuzado,?Que nunca em Bruxas creu, ou Lobizomes,?Deita estas coizas para trás das costas.?Trata de divertirse, e em mais na? pensa.
Ai de quem da memoria o adagio varre?_Quem inimigos tem dormir na? deve!_
Xegada estava enta? uma romajem?Dia de Pentecoste, onde Coimbra?Em pezo aos Olivais sair costuma.?He esta uma funsa? das mais luzidas?Daqueles arrabaldes; ali entra?Tudo o bom, e bonito; ali se encontra?Todo o recreio de qualquer espece.?Veemse ali jocozisimas Comedias?No amplo
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