fortificasse contra o seu espontaneo pessimismo. A critica da ac??o litteraria de Anthero de Quental est�� implicita n'esta caracteristica do seu organismo.
Anthero de Quental nasceu na Ilha de S. Miguel em 1842, em uma familia de morgados; n'aquella pequena ilha a falta de cruzamentos nas familias aristocraticas tem determinado uma terrivel degenerescencia, que se manifesta pela idiotia e pela loucura. Na familia de Anthero de Quental existem casos d'esta terrivel _tare hereditaire_. A frequencia na Universidade de Coimbra, desorientadora para as mais fortes organisa??es, n?o deixou de actuar profundamente no espirito de Anthero de Quental, lan?ando-o em uma dissolvente anarchia mental pelos habitos das arrua?as escolares e pelas leituras radicalistas que o levavam a uma grande sobreexcita??o. Foi n'esta crise da adolescencia que em Anthero de Quental desabrochou o talento poetico e a paix?o revolucionaria, que deu origem a uma liga de espiritos emancipados de todo o?supernaturalismo e de toda a auctoridade temporal, que se denominou a _Sociedade do Raio_. Este titulo provinha das impreca??es que lan?avam ao espa?o em occasi?o de trovoadas, provocando o raio para que os fulminasse, como express?o de uma vontade individual no universo. As persegui??es contra a Polonia e as luctas pela liberta??o e unifica??o da Italia, tambem acordaram o interesse de Anthero para as quest?es politicas. As suas leituras favoritas eram os livros de Proudhon, de Feuerbach, de Quinet e Michelet, e isso rapidamente, vivendo em uma atmosphera de discuss?o permanente, de uma dialectica de sophismas, aggravada por uma irregularidade de vida, que veiu mais tarde a determinar a doen?a que o embara?ou na sua actividade. Anthero de Quental vivia entre um grupo de estudantes que o divinis��ra, considerando-o como um apostolo, um iniciador da humanidade. E elle proprio chegou a acreditar n'aquella miss?o, e passados annos, em uma carta autobiographica, definia-se como o porta-estandarte das id��as modernas em Portugal.
N'este periodo da vida de Anthero era elle dominado por um condiscipulo natural de Penafiel, chamado Germano Vieira de Meyrelles, a quem dedicou a primeira edi??o das _Odes modernas_. Este Germano Meyrelles era um typo rachytico e aleijado, dotado de um sarcasmo maligno, resultado da sua imperfei??o physica; exerceu no espirito de Anthero uma ac??o corrosiva, privando-o de todos os enthusiasmos, e levando-o quasi �� apathia mental. Quando Germano Meyrelles morreu miseravelmente, deixando duas crian?as filhas naturaes, Anthero tomou conta d'ellas e educou-as em sua companhia, deixando-lhes o remanescente da sua heran?a.
O talento de Anthero revelou-se pela poesia no jornal _O Academico_; em 1861, levado pela admira??o do lyrismo de Jo?o de Deus, cultivou a f��rma do Soneto, que estava longe ainda da belleza que attingiu na sua ultima phase pessimista.
As id��as politicas revolucionarias e negativistas de que se deix��ra possuir determinaram a primeira altera??o nas suas concep??es poeticas. Em 1865 publicou em Coimbra a collec??o de poesias d'esta phase revolucionaria com o titulo de _Odes modernas_; mas os productos da sua actividade poetica, transi??o para as _Odes modernas_ e _Sonetos_, s?o totalmente desconhecidos, porque Anthero de Quental rasgou todas as composi??es que n?o se harmonisavam com o seu novo ideal revolucionario. Um dos adoradores de Anthero de Quental, que o acompanhava nas tropelias nocturnas, e que tambem morreu doido em 1872, Eduardo Xavier, colligira em volume essas poesias da phase romantica; �� essa collec??o que possuiamos que hoje publicamos, da existencia da qual o proprio Anthero nem suspeitava.
A crise moral de Anthero come?ou propriamente em 1865, quando se achou s��sinho em Coimbra; o curso juridico a que elle pertencia acab��ra a formatura em 1863; Anthero teve de repetir um anno, e ao terminar a formatura em 1864, achou-se sem estimulos que o obrigassem a sa��r de Coimbra. Vivia ent?o solitario, meditabundo, desenfadando-se em digress?es nocturnas. Foi n'esse anno de 1865, que irrompeu a celebre _Quest?o de Coimbra_; eu �� que o estimulei a sa��r �� estacada, dando r��plica ��s insidias de Castilho.
Anthero publicou n'esse anno a carta _Bom senso e bom gosto_, que o revelara ao paiz um polemista ardente, um estylista vigoroso, um espirito possuido de uma alta inspira??o. Anthero de Quental contrahira perante o paiz e a gera??o moderna o compromisso de p?r em obra essas generosas aspira??es. De dia a dia tornava-se mais reparavel o seu silencio, mais censuravel a falta de actividade litteraria. Anthero soffria um profundo mal estar, que o n?o deixava entregar-se ao remanso do estudo; sa��u de Coimbra para ir viver em Penafiel com o seu amigo Germano; depois foi para Guimar?es para ao p�� de Alberto Sampaio; foi para o Algarve para o seu amigo Negr?o; foi �� America, a Pariz, aos A?ores, e por ultimo fixara-se mais algum tempo em Villa do Conde. N?o estava bem em parte alguma.
Os trabalhos litterarios n?o o seduziam; em Lisboa achou-se com Jos�� Fontana, que se aproveitou do seu perstigio moral para a organisa??o do partido socialista, e junto
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