Paródia ao primeiro canto dos Lusíadas de Camões por quatro estudantes de Évora | Page 8

Not Available
vinho e o deita
juntamente.
Arrombam as medidas ás pancadas,
Á parede se arruma

o mais valente;
Assim que a gente d'antes inimiga
Com tão alto
beber se torna amiga.
XCIII.
Passando isto, fica a camarada
Com gosto de haver feito tal empreza;

Manda logo fazer de vinho agoada,
Porque d'alli não quer outra
riqueza.
Ficou a alma do Marques magoada,
No odio antigo mais
que nunca acceza;
E vendo sem vingança tanto dano,
Sómente
estriba no segundo engano.
XCIV.
Torna-se a elles, tendo-a já cozido,
Levando alguns refrescos que ha
na terra,
Com um frasco de vinho mui comprido,
Mas sob capa de
paz armado em guerra.
Piloto lhe offerece conhecido,
Dizendo que
em taes vias jámais erra,
Com o qual se fizesse o que esperava,
Que
a Evora os levaria confiava.
XCV.
O gran Vasco Bagulho, a quem convinha
Fazer já seu caminho
desejado,
Que Borrachões não poucos cheos tinha,
Para buscar
Louredo tão amado;
Recebendo o piloto que lhe vinha,
Foi d'elle
alegremente agasalhado.
Despede-se com gran contentamento,
C'o
guia, sem saber o falso intento.
XCVI.
Dest'arte despedida a gente honrada,
Começou a seguir o falso guia.

Não tinham meia legoa bem andada,
Quando do bom caminho se
desvia.
O bom Vasco que não cahia em nada
Do grande engano que
este tal lhe urdia,
D'elle mui largamente se informava
A que parte
Louredo lhe ficava.
XCVII.

Mas o guia instruido nos enganos
Que o malvado do Marques
lh'ensinára,
Leva-os por partes onde crueis danos
E morte em fim
em agoas lhe prepara.
Diz-lhes que vão contentes, vão ufanos,
Que
mui prestes verão a terra cara;
Porque elle caminhava por tal via,

Que cedo a Peramanca os levaria.
XCVIII.
E diz-lhes mais, com falso pensamento,
Que esta via por mais breve
tomou,
Posto que um rio tem, mas sem tormento
E sem perigo
sempre se passou.
O Bagulho que a tudo estava attento,
Muito com
estas novas se alegrou;
E com grandes copadas lhe rogava
Os
levasse por donde o porto estava.
XCIX.
O falso guia, porque determina
Dar-lhe porto, mas não qual elle pede,

Posto em Rio Marinho lh'o imagina
N'um pégo que em altura os
mais excede.
Aqui o engano e a morte lhe maquina,
Para que tal
beber com pressa véde;
E para o porto verem logo os chama
Onde
lhe arma perderem vida e fama.
C.
Já para lá inclina a leda frota
E em chegando ao rio da cilada,
Um
descalça o sapato, o outro a bota,
Para ir buscar a morte não cuidada.

Chega um bebado n'isto, que remota
Lhe parece esta gente e
enganada,
E com duras palavras reprehendia
D'entrarem em tal
pégo a ousadia.
CI.
Mas o malvado guia conhecendo
Ser manifesto o engano, n'um
instante,
Se vae por uns outeiros acolhendo,
Corrido de não ir a sua
ávante.
Os outros que ficavam 'stão tremendo,
Cuidando qu'inda o
engano era diante;
Mas o que os tirou d'elle, mui contente
Lhes diz

que irá com elles juntamente.
CII.
Ficam todos então com alegria,
Bebem e dão de beber ao que os
guiava.
Um olha para o ceo, e diz que via
Mais luas do que d'antes
costumava.
Duas luas a mi, Senhor, dizia,
Ao Mouro, ao infiel que
vos aggrava.
Outro a um tronco diz; bebei, Senhora,
Senão
deitar-vos-hei os olhos fóra.
CIII.
E tendo esta ribeira já passada,
Onde os quiz afogar o falso guia,
A
torre appareceu n'uma assomada
Onde matou Giraldo a má vigia.
Á
mão direita fica situada
Uma povoação de que bebia
A gente
principal da nossa idade,
Peramanca é o nome da cidade.
CIV.
E sendo o capitão aqui chegado
Estranhamente ledo, porque espera

De ser alli mui bem agasalhado
Dos refrescos que ha n'aquella terra:

Eis vem frascos de vinho com recado
De Diogo que sabe a gente
que era,
Porque Baccho já d'antes o avisára
Que de bom vinho alli
os regalára.
CV.
Agasalha-os a todos como amigos;
Preza-se já cada um de fallar certo,

Dando conta de todos os perigos,
Que em caminho passaram tão
desertos.
Não curam de lhe dar uvas nem figos,
Mas o licor que
deixa o olho esperto.
Quer imitar cada um o gran Barbança
Que pôz
n'este licor sua esperança.
CVI.
Aqui já vem tomar, livre d'engano
Anda esta gente pouco conhecida,


E debaixo de um vil e pobre panno
Tão alta bebedice anda
escondida,
Quem bebe vinho velho, quem d'este anno,
D'um e
d'outro s'entorna sem medida.
E assi favoreceu o Ceo sereno
A
quem deixou por vinho o seu terreno.
FIM.
End of the Project Gutenberg EBook of Paródia ao primeiro canto dos
Lusíadas de Camões por quatro estudantes de Évora em 1589, by
Anonymous
0. END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK PARÓDIA AO
PRIMEIRO CANTO ***
. This file should be named 20149-8.txt or 20149-8.zip *****
This and all associated files of various formats will be
found in:
. http://www.gutenberg.org/2/0/1/4/20149/
Produced by Rita Farinha and the Online Distributed
Proofreading
Team. The images for this file were generously made available by
Biblioteca Nacional Digital
(http://bnd.bn.pt).
Updated editions will replace the previous one--the old editions will be
renamed.
Creating the works from public domain print editions means that no
one owns a United States copyright in these works, so the Foundation
(and you!) can copy and distribute it in the United States without
permission and without paying copyright royalties. Special rules, set
forth in the General Terms of Use part
Continue reading on your phone by scaning this QR Code

 / 12
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.