o mundo nos fabulados portulanos. E vós, estendendo aos vossos pés a terra inteira, como se f?ra ainda pequeno mappa, estudastes a geographia, sulcando as linhas nas aguas com as vossas quilhas venturosas, entalhando-as na terra com o ferro vencedor.
Isto diz, mas em carmes inspirados e em divinas modula??es, o immortal cantor dos feitos patrios. é a voz da gloria, que res?a perpetuamente, vibrada pela tuba do maximo poeta e do mais ardente e devotado portuguez. S?o os Lusiadas. é o Cam?es.
Quando pronuncía um portuguez o nome do Cam?es, a admira??o e o orgulho de contar como seu natural o grande epico, é o maximo elogio. E n'esta occasi?o, em que festivamente celebra Portugal ao seu poeta, quando o povo, estreitando os vinculos da patria em volta do seu mais illustre e benemerito cantor, está pagando em publica e solemne apotheose, a homenagem do seu culto ao altissimo engenho portuguez, parecera temeridade, quasi diriamos sacrilegio, o buscar encarecer a gloria do Cam?es. Seria como accender pallidas lucernas para que appare?a fulgindo mais esplendido o sol meridiano. E, senhores, se levanto n'este momento a minha voz, perdida e abafada no c?ro unisono das acclama??es universaes, é porque assim o ordenou a Academia, mais zelosa na venera??o ao épico immortal do que feliz na elei??o do orador.
N?o espereis da minha voz um panegyrico, porque só farei em breves termos a commemora??o de um grande nome. No meio do fervoroso enthusiasmo, com que a cidade de Lisboa, e as demais povoa??es de Portugal, solvem após tres seculos na escassa e tardia moeda que lhe é dado dispender, o pre?o das altiloquas estrophes, quando os arcos triumphaes, os prestitos solemnes, os hymnos melodiosos, os bellicos tropheos, as bandeiras multicores, as deslumbrantes illumina??es annunciam publicamente que revive, como o symbolo da patria, o nome do seu cantor, a na??o, como que expiando nobremente a culposa indifferen?a das passadas gera??es, entalha n'estes honrosos monumentos o nome de quem teceu de luz a heroica narra??o dos feitos patrios. A Academia, associando-se a esta liturgia nacional em honra do poeta, poz-me na m?o o cinzel, e prescreveu-me que n'um recanto d'este marmore, onde Portugal insculpe agora a sua e a gloria do cantor, eu deixe tambem gravado o nome do Cam?es.
Fazer o elogio do Cam?es é tecer o panegyrico da patria. E é sempre grato a um portuguez o encomiar a Portugal.
Nós temos, os portuguezes, um singular e raro privilegio. Somos nós entre os modernos povos europeus o que tem um poema verdadeiramente nacional, um poema, cujos cantos s?o as fa?anhas da na??o enaltecidas pela mais florida e opulenta phantasia, modeladas nas fórmas da epopéa. Celebram outras gentes a fecundos e altissimos engenhos, cujos reflexos luminosos, transcendendo os ambitos da patria, est?o doirando e ennobrecendo a litteratura universal. Mas nenhum povo tem como o portuguez um d'estes felicissimos espiritos, que s?o ao mesmo passo o genio da na??o, e o genio da poesia, e em cujas obras respire ao mesmo tempo a patria e a humanidade, a gloria privativa de um só povo, e o destino commum de uma inteira civilisa??o. O Dante é immortal, mas o seu poema é inspirado pelo mysticismo e a vingan?a. Immortal é o Tasso, mas a sua epopéa é a novella cavalleirosa, que se enreda e desenla?a em redor dos sacros muros da triste Jerusalem. Immortal é Shakespeare, mas a sua musa, que penetra e descobre as mais occultas fibras do humano cora??o, é mais cosmopolita do que fadada a conglobar a gloria dos bret?es. Immortal é Cervantes, mas a figura entre sublime e comica do seu heroe, é mais do que o symbolo da Hespanha, é a personifica??o da humanidade, como abstrusa e paradoxal composi??o de loucura e heroicidade. Immortal é o Cam?es, mas é immortal para os seus, immortal para os extranhos. Para os seus, porque em versos admiraveis divulgou as empresas, em que foram protagonistas. Immortal para os extranhos, porque os feitos, que reconta, s?o o ber?o onde incubou fecunda a novissima civilisa??o.
Manda a Europa, ainda ent?o adormecida para as longas e trabalhosas expedi??es, manda a Portugal que marche na vanguarda. Eram tenebrosos, impervios, procellosos os mares, onde nenhum baixel se tinha aventurado. Entrevia-se o Oriente como a quasi fabulosa regi?o, d'onde vinham magnificadas pela creadora phantasia os encantos e as maravilhas. Era a terra das ardentes especiarias e das drogas perfumadas, a fecunda matriz dos diamantes e das perolas. Os seus thesouros agu?avam o desejo ás gentes occidentaes. Era como o paraiso da cubi?a para esta velha Europa, já cansada da sua gleba mais esteril que os ridentes vergeis orientaes. Todos anhelavam porque se descobrissem faceis os caminhos, para que a todos fosse commoda a peregrina??o dos tractos lucrativos e das fructuosas mercancias. Pois vá adiante Portugal e explore as sendas indomesticas d'aquella terra de profana promiss?o. Vá
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