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The Project Gutenberg EBook of Os sonetos completos de Anthero de
Quental, by Antero Quental
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Title: Os sonetos completos de Anthero de Quental
Author: Antero Quental
Contributor: Oliveira Martins
Release Date: December 20, 2006 [EBook #20142]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
0. START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK ANTHERO
DE QUENTAL ***
Produced by Pedro Saborano, Ricardo Diogo and Tiago Tejo,
and
edited by Rita Farinha (Biblioteca Nacional
Digital--http://bnd.bn.pt).
SONETOS
OS SONETOS COMPLETOS
DE
Anthero de Quental
publicados por
J. P. Oliveira Martins
PORTO
LIVRARIA PORTUENSE
DE
_LOPES & C.^a--EDITORES_
119, Rua do Almada, 123*
1886
PORTO
TYPOGRAPHIA OCCIDENTAL
Rua da Fabrica, 66
Escrevendo estas breves paginas á frente dos _Sonetos_ de Anthero de
Quental tenho a satisfação intima de cumprir o dever de tornar
conhecida do publico a figura talvez mais caracteristica do mundo
litterario portuguez, e decerto aquella sobre que a lenda mais tem
trabalhado. Estou certo, absolutamente certo, de que este livro, embora
sem écco no espirito vulgar que faz reputações e dá popularidade, ha-de
encontrar um acolhimento amoroso em todas as almas de eleição, e
durar emquanto houver corações afflictos, e emquanto se fallar a
linguagem portugueza.
Procurarei, no que vou dizer, guardar para mim aquillo que ao publico
não interessa: a viva amisade, a estreita communhão de sentimentos, o
affecto quasi fraterno que ha perto de vinte annos nos une, ao poeta e
ao seu critico de hoje, fazendo da vida de ambos como que uma unica
alma, misturando invariavelmente as nossas breves alegrias, muitas
vezes as nossas lagrimas, sempre as nossas dores e os nossos
enthusiasmos ou o nosso desalento.
Discutindo em permanencia, discordando frequentemente, ralhando a
miudo, zangando-nos ás vezes e abraçando-nos sempre: assim tem
decorrido para nós perto de vinte annos. Mas o leitor é que nada tem
que vêr com esses casos particulares, nem com o abraço que trocámos
no dia em que primeiro nos conhecemos e que só terminará n'aquelle
em que um de nós, ou ambos nós, formos descançar para sempre sob
meia duzia de pás de terra fria.
I
Eu não conheço phisionomia mais difficil de desenhar, porque nunca vi
natureza mais complexamente bem dotada. Se fosse possivel desdobrar
um homem, como quem desdobra os fios de um cabo, Anthero de
Quental dava _alma_ para uma familia inteira. É sabidamente um poeta
na mais elevada expressão da palavra; mas ao mesmo tempo é a
intelligencia mais critica, o instincto mais pratico, a sagacidade mais
lucida, que eu conheço. É um poeta que sente, mas é um raciocinio que
pensa. Pensa o que sente; sente o que pensa.
Inventa, e critíca. Depois, por um movimento reflexo da intelligencia,
dá corpo ao que criticou, e raciocina o que imaginou.--O seu
temperamento apresenta um contraste correlativo: é meigo como uma
creança, sensitivo como uma mulher nervosa, mas intermittentemente é
duro e violento.
É fraco, portanto? Não. A vontade, em obediencia á qual, e com
esforço, se faz colerico, fal-o tambem forte--d'esta força persistente,
raciocinada e na apparencia placida, como a superficie do mar em dias
de bonança. O Oceano, porém, é interiormente agitado pelo _gulf
stream_ quente e invisível: tambem ás vezes a placidez extrema da sua
face encobre ondas de afflicção que sobem até aos olhos e rebentam em
lagrimas ardentes. Sabe chorar, como todo o homem digno da
humanidade.
É d'estas crises que nasceram os seus versos, porque Anthero de
Quental não _faz_ versos á maneira dos litteratos: nascem-lhe,
brotam-lhe da alma como solluços e agonias. Mas, apezar d'isso, é
requintado e exigente como um artista: as suas lagrimas hão de ter o
contôrno de perolas, os seus gemidos hão de ser musicaes. As
faculdades artisticas geradoras da estatuaria e da symphonia são as que
vibram na sua alma esthetica. A noção das fórmas, das linhas e dos
sons, possue-a n'um gráo eminente: não já assim a da côr nem a da
_composição_. Aos quadros chama _paineis_ com desdem, e por isso
mesmo tem horror á descripção e ao pittoresco. É artista, no que a arte
contém de mais subjectivo. A sua poesia é esculptural e hieratica, e por
isso phantastica. É exclusivamente psychologica e dantesca: não pode
pintar, nem descrever: acha isso inferior e quasi indigno.
Os seus versos são sentidos, são _vividos_ como nenhuns; mas o sentir
e o viver d'este homem é de uma natureza especial que tem por
fronteiras phisicas as paredes do seu craneo, mas que não tem fronteiras
no mundo real, porque a sua imaginação paira librada nas azas de uma
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