hymno nos consagre a memoria ao amor e gratid?o de nossos filhos!
Ao lado dos pa?os monasticos de Mafra, monumento de uma era de vans grandezas, vai-se hoje alevantando sem ruido o monumento modesto, mas eloquente e sancto, da idéa progressiva da actualidade. Ao lado d'essas pedras amontoadas, d'esses torre?es gigantes, macissos, e pesadamente estupidos, serpeam já os prados virentes por veigas e valles, cobertos ainda ha pouco de abrolhos e urzes. Contrastando com os lan?os de muralhas caiádas da ochre, que amarelleja bestialmente, como um cord?o de ouropel enfiado em diamantes, por entre a c?r severa dos marmores tisnados pelo tempo, vêem-se ao longo verdejar os pinheirinhos, que coroam as alturas ao norte e oriente d'aquelle edificio monstruoso, hybrido, e extravagante como uma composi??o pseudo-poetica da Phenix-Renascida. As folhas de terra cultivada dilatam-se pelas chapadas e encostas, várias na c?r segundo a altura das cearas, ou conforme a qualidade do solo, nos sitios onde ainda as sementeiras n?o surgem no comê?o do germinar. é como um xadrez enorme, cujas casas se houvessem repartido ao acaso n'um taboleiro irregular e immenso.
A vontade real fez apparecer o edificio: outras Vontades Reaes fizeram nascer a granja-modelo. Para a primeira requeria-se ouro e for?a; para a segunda intelligencia e amor do paiz. O sceptro foi robusto e potente quando amontoou aquella penedia lavrada e esculpida: o sceptro é o symbolo da paz e da beneficencia quando em vez de converter p?o em pedras, converte gandra bravia e esteril em um nobre exemplo que mostre ao povo onde está a sua derradeira esperan?a, o progresso da industria e o amor do trabalho.
Para a maravilhosa inutilidade de D. Jo?o V gastaram-se por largos annos os milh?es que de continuo nos entregava a America: o lidar accumulado de cincoenta mil homens consumiu-se em desbastar e pulir essas pedras hoje esquecidas, que apenas servem para alimentar por algumas horas a curiosidade dos que passam. é uma verdade cem vezes repetida, que o pre?o de Mafra teria coberto Portugal das melhores estradas da Europa; mas nem por ser trivial essa verdade deixa de ser dolorosa. E todavia tal pre?o era o menos! As maldicc?es submissas dos que foram arrastados de todos os angulos da monarchia, para esta grande anudúva nacional, e as lagrymas das suas familias, n?o as p?de suffocar a adula??o cortez?; transsudaram até nós nas paginas da historia, e cahindo sobre o ataúde dourado do principe que as fez verter, deixaram a inscrip??o do seu nome manchada de uma nódoa que o tempo n?o gastará.
A vasta e risonha granja que viceja ao lado do negro e carrancudo edificio n?o custou uma só mealha dos dinheiros publicos; n?o arrancou uma lagryma. N?o s?o maldic??es o seu fructo: s?o ben??os dos que vivem: ser?o no futuro ben??os da posteridade.
O convento-palacio, nascido sob manto de púrpura, alegre na sua juventude e habituado a pompas de longos annos, ahi está, illustre mendigo, assentado hoje n'um como ermo, onde a vida robusta de seculos que lhe fadára o fundador, se vai convertendo em antecipada decrepidez. Inutilmente com a sua grande voz de bronze elle pede que o abriguem das injurias das estac?es. As aguas do céu, filtrando-lhe por entre os membros, lá os v?o lentamente desconjuntando, o sol cresta-lhe a fronte e faz prosperar os musgos, que lhe arrugam a rija epiderme: o vento redemoinha atravez das suas janellas mal seguras, e bramindo n'aquellas solid?es do seu recinto, atira ao rosto das estatuas, aos acanthos dos capiteis, á face polida das paredes de marmore, o pó que tomou nas azas passando pelas serranias. No meio do estrepitar do mundo ninguem escuta o gemer do gigante de pedra; ninguem se lembra de tirar do peculio do estado a mais pequena somma para elle. E porque? Porque a sua miseria n?o fala aos cora??es nem aos entendimentos. Memorias gloriosas? N?o as ha lá. Utilidade? Para que serve essa pedreira immensa?
A granja, porém, de Mafra nem teme as aguas do céu, nem os raios creadores do sol: pov?a os seus agros outeiros de pinhaes, a cujo abrigo zombará em breve da furia dos ventos. N?o vae pedir soccorros á munificencia publica: util já aos pequenos e humildes, sê-lo-ha tambem algum dia a quem a fez nascer, util em proveitos materiaes, e, o que mais vale, em fructos de verdadeira gloria.
Ha quatro annos apenas, que os muros da cêrca ou tapada de Mafra, estirando-se como serpe monstruosa por tres leguas, atravez de valles e outeiros, encerravam um vasto maninho coberto de sar?as rasteiras, onde raro se via alevantar uma arvore solitaria, curva e pendida pelo a?outar continuo das ventanias, ou algum pequeno e enfezado pinhal perdido no meio d'aqueles mattos inuteis. Era um symbolo de barbaria ao pé d'um symbolo de opulencia. O edificio e o parque pareciam significar no seu conjuncto--o orgulho tendo por fundamento
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