gera??o que passava. Elles n?o sabiam, como os historiadores, que no seu livro de pedra, tambem como nos d'aquelles, se podia mentir á posteridade. Por motivo tal foi a architectura sincera.
Mafra é um monumento rico, mas sem poesia, e por isso sem verdadeira grandeza: é um monumento de uma na??o que dormita após um banquete como os de Lucullo: é o toucador de uma Lais ou Phrine assentado dentro do templo do Deus dos christ?os, e sob outro aspecto, é a beataria d'uma velha tonta, affectando a linguagem da fé ardente e profunda d'Origines ou de Tertulliano.
Sem contesta??o, Mafra é uma bagatella maravilhosa, o dixe de um rei liberal, abastado e magnifico; é pouco mais ou menos o que foi Portugal na primeira metade do seculo XVIII.
Collocai pela imagina??o Mafra ao pé da Batalha, e podereis entender quanto é clara e precisa a linguagem d'estas chronicas, lidas de poucos, em que as gera??es escrevem mysteriosamente a historia do seu viver. A Batalha é grave como o vulto homerico de D. Jo?o I, poetica e altiva como os cavalleiros da ala de Mem Rodriguez, religiosa, tranquilla, santa como D. Philippa rodeada dos seus cinco filhos. As m?os que edificaram Santa Maria da Victoria, meneando as armas em Aljubarrota, deviam ser vencedoras. A Batalha representa uma gera??o energica, moral, crente: Mafra uma gera??o afeminada, que se finge forte e grande. A Batalha é um poema de pedra: Mafra é uma semsaboria de marmore. Ambas, ecchos perennes que repercutem nos seculos que v?o passando a express?o complexa, e todavia clara e exacta, de duas epochas historicas do mesmo povo, sua juventude vi?osa e robusta, e sua velhice cachetica.
O caracter de um monumento do tempo presente n?o póde ser por certo um edificio gigante, um templo, ou um palacio. Onde as cren?as religiosas vacillam como a luz que se apaga, o templo seria uma pagina de historia fabulosa: onde a pobreza extrema substitue a riqueza, um tanto estupida e fastosa com mau gosto, o palacio esplendido seria um capitulo anachronico. O monumento deve resumir a sociedade, e em nenhum d'esses generos de memoradum se acharia representado o actual existir.
Que somos nós hoje? Uma na??o que tende a regenerar-se: diremos mais: que se regenera. Regenera-se, porque se reprehende a si propria; porque se revolve no loda?al onde dormia tranquilla; porque, se irrita da sua decadencia, e já n?o sorri sem vergonha ao insultar d'estranhos; porque principia, emfim, a reconhecer que o trabalho n?o deshonra, e vai esquecendo as visagens senhorís de fidalga. Deixai passar essas paix?es pequenas e más que combatem na arena politica, deixai fluctuar á luz do sol na superficie da sociedade esses cora??es cancerosos que ahi vêdes; deixai erguerem-se, tombar, despeda?arem-se essas vagas encontradas e confusas das opini?es! Tudo isto acontece quando se agita o oceano; e o mar do povo agita-se debaixo da sua superficie. O sarga?o immundo, a escuma fétida e turva h?o-de desapparecer. Um dia o oceano popular será grandioso, puro e sereno como sahiu das m?os de Deus. A tempestade é a precursora da bonan?a. O lago asphaltite, o Mar-Morto, esse é que n?o tem procellas.
O nosso estrebuxar, muitas vezes colerico, muitas mais mentecapto e ridiculo, próva que a Europa se enganava quando cria que esta nobre terra do ultimo occidente era o cemiterio de uma na??o cadaver. Vivemos: e ainda que similhante viver seja o delirio febril de moribundo, esta situa??o violenta, aos olhos dos que sabem vêr, é uma crise de salva??o, posto que dolorosa, e lenta. Confiemos e esperemos: o nome portuguez n?o foi riscado do livro dos eternos destinos.
Um dos signaes evidentes da restaura??o social do paiz, e ao mesmo tempo o caracter mais notavel que distingue esta epocha é o seu movimento industrial, industrial na mais extensa significa??o da palavra. Primeira entre as differentes industrias é a agricultura, e a agricultura tem incontestavelmente sido o nosso principal progresso.
Qual será portanto o monumento que melhor resuma este periodo de regenera??o? Será o aspecto do solo, o vi?o dos campos, a abundancia substituida á escaceza na morada do homem laborioso. Arroteai algumas geiras de terra: em um marco esculpi a data d'essa transforma??o: cobri a superficie de Portugal d'estes marcos. Eis ahi, n?o um, porém mil monumentos que significar?o o espirito do presente.
Plantai o bosque na serrania escalvada: que elle braceje virente para o céu, e enrede as suas raizes nas rachas da penedia. Agitada pelo vento, a selva com o seu rugir irá contando a cada seculo que nascer as tendencias laboriosas do nosso, que já come?am a apparecer. Os cimos das montanhas s?o as verdadeiras aras de Deus: é lá que oravam as na??es virgens. Sanctificai a vossa religi?o de patriotismo pelo culto universal e primitivo: o bosque murmurando com o espirar da aragem é um hymno ao Anci?o dos Dias: que este
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