O poeta Chiado | Page 5

Alberto Augusto de Almeida Pimentel
1672, em que os padres da Congrega??o do Oratorio, que se tinham instituido alli perto, no sitio das Fangas da Farinha, �� rua do Almada, tiveram auctoriza??o para tomar conta do hospital do Santo Espirito, onde passaram a estabelecer-se dois annos depois.
Alli permaneceram os oratorianos, tranquillos e contentes. Mas por occasi?o do terremoto de 1755 a egreja e convento arderam, perdendo-se os preciosos haveres d'aquelles padres. A congrega??o transferiu-se ent?o para o convento das Necessidades, que �� hoje palacio real.
Ficaram apenas de p�� as paredes dos dois edificios incendiados.
No frontispicio da egreja havia grandes columnas de cantaria, que o leitor ainda hoje pode ver... aonde?
Aonde? N?o em outro templo, mas na fachada de um theatro, porque as pedras tambem teem seus fados. Estas transitaram, por caprichoso destino, do sagrado para o profano. Est?o agora na frontaria do theatro de D. Maria II; s?o as mesmas columnas da egreja do Espirito Santo.
O leitor n?o acreditaria esta noticia, se eu n?o pudesse comproval-a com um documento authentico.
Mas posso. Ahi vai o documento, que, por ser curioso, n?o quero que fique esquecido entre os meus papeis velhos:
?Ministerio do Reino--3.^a Reparti??o--Havendo Manuel Jos�� d'Oliveira, actual proprietario do edificio da supprimida Casa do Espirito Santo da Congrega??o do Oratorio, cedido as grandes columnas de cantaria e seus capiteis, que orn?o o frontispicio d'aquella Igreja, para serem empregadas na fachada do novo theatro nacional, que se projecta fazer; com a condi??o de que n?o seja feito �� sua custa o descimento e conduc??o das mesmas columnas: Manda Sua Magestade a Rainha, que o Conselheiro Fiscal das Obras Publicas fa?a preparar todo o apparelho necessario para aquelle descimento, combinando com o mencionado Manuel Jos�� d'Oliveira a occasi?o e dia em que elle deve ter logar; fazendo depois conduzir as ditas columnas e capiteis para o Arsenal da Marinha, onde achar�� as ordens necessarias para serem recolhidas e depositadas at�� que se lhes d�� o indicado destino: devendo outrosim o mesmo Conselheiro Fiscal dar todas as providencias para que, tanto no acto do descimento, como no da conduc??o, n?o soffram o menor damno as columnas e particularmente os lavrados de seus capiteis. Palacio das Necessidades em 9 de janeiro de 1836. (assignado) _L. M. S. de Albuquerque_?.
Pois n?o �� interessante o destino d'estas columnas?
Procurei saber quando foi que entraram em deposito no Arsenal de Marinha, e quando sahiram de l�� para o theatro.
Metti de empenho o meu illustre amigo sr. conde de Pa?o d'Arcos, que gentilmente, como sempre costuma, se interessou pela minha solicita??o. Fez-se a pergunta ao Arsenal. Passaram mezes. N?o veiu resposta. N?o era negocio de expediente ordinario; ficou para traz. Pois deixal-o ficar; eu �� que vou andando para deante, j�� aborrecido de esperar.
E agora tornemos ao nosso poeta.
IV
A popularidade de Antonio Ribeiro o Chiado proveiu n?o tanto da sua veia poetica, ali��s muito apreciada pelos entendidos, como das suas repetidas tunantadas, de que o povo tinha directo conhecimento, porque as presenceava em plena rua.
Era entre o povo, entre as classes humildes de que elle provinha, porque l�� diz Affonso Alvares no proposito de deprimil-o
Nasceste de regateira?e teu pai lan?ava solas;
era entre a arraya miuda que o Chiado localizava o theatro das suas fa?anhas picarescas, dos seus feitos esturdios, das suas ?partidas? e ?piadas?, como hoje dizemos.
Um c��dice do Archivo Nacional, de que s�� agora tive conhecimento, revela algumas das suas estroinices e chala?as, que n?o ficam a dever nada ��s mais gaiatas e desbragadas de Bocage.
O codice a que me refiro tem o n.^o 1817 e o titulo--_Diversas historias e ditos facetos a diversos propositos._
�� uma interessante collec??o de anecdotas, que deve ser anterior ao anno de 1617 e pertenceu �� livraria do mosteiro de S. Vicente.
Vamos passar em revista as paginas que n'essa miscellanea dizem respeito ao Chiado; e, onde f?r preciso, lan?aremos um v��o por decencia sobre as anecdotas que entrarem no dominio da pornographia.
�� claro que a palavra--v��o--n?o promette mais do que um anteparo di��phano.

Quiz o poeta comprar a uma regateira um peixe de estima??o. Offereceu-lhe apenas 7 r��is e meio. Volveu-lhe a regateira por escarneo:
--Tomal-o-heis com um trapo quente.
N'esta resposta havia tanto desdem, que picou fundo o Chiado; certamente elle se teria do��do menos de uma descompostura destemperada, como aquellas que as peixeiras de Lisboa n?o precisam ensaiar-se para desfechar na cara de toda a gente. Mas a ironia, o desprezo da r��plica, abespinhou-o; suggeriu-lhe um plano de vingan?a, que logo poz em execu??o.
Disfar?adamente aproximou-se do fogareiro de alguma assadeira de castanhas ou quejando mister. Aqueceu um trapo, o primeiro que se lhe deparou, e apossou-se violentamente do peixe, empregando o trapo na tomadia.
Escarc��o da peixeira, que se dizia roubada. Agglomera??o de povo, que ria do caso exaltando a astucia do Chiado. App��llo dos dois contendores para a justi?a, visto faltar ainda n'esse tempo o _bureau_ policial da Parreirinha.
A varina
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