das que elogiam tudo,
Me tem fechado a porta.
A critica segundo o methodo de Taine?Ignoram-n'a. Juntei n'uma fogueira immensa.?Muitissimos papeis ineditos. A imprensa
Vale um desdem solemne.
Com raras excep??es merece-me o epigramma.?Deu meia-noite; e em paz pela cal?ada abaixo,?Um sol-e-dó. Chovisca. O populacho
Diverte-se na lama.
Eu nunca dediquei poemas ás fortunas,?Mas sim, por deferencia a amigos ou a artistas,?Independente! Só por isso os jornalistas
Me negam as columnas.
Receiam que o assignante ingenuo os abandone,?Se forem publicar taes cousas, taes auctores.?Arte? N?o lhes convem, visto que os seus leitores
Deliram por Zaccone.
Um prosador qualquer desfructa fama honrosa,?Obtem dinheiro, arranja a sua ?coterie?;?E a mim, n?o ha quest?o que mais me contrarie
Do que escrever em prosa.
A adula??o repugna aos sentimentos finos;?Eu raramente falo aos nossos litteratos,?E apuro-me em lan?ar originaes e exactos,
Os meus alexandrinos...
E a tisica? Fechada, e com o ferro acceso!?Ignora que a asphyxia a combust?o das brazas,?N?o foge do estendal que lhe humedece as casas,
E fina-se ao desprezo!
Mantem-se a chá e p?o! Antes de entrar na cova.?Esvae-se; e todavia, á tarde, fracamente,?Oi?o-a cantarolar uma can??o plangente
D'uma opereta nova!
Perfeitamente. Vou findar sem azedume.?Quem sabe se depois, eu rico e n'outros climas,?Conseguirei reler essas antigas rimas,
Impressas em volume?
Nas lettras eu conhe?o um campo de manobras;?Emprega-se a réclame, a intriga, o annuncio, a blague,?E esta poesia pede um editor que pague
Todas as minhas obras...
E estou melhor; passou-me a colera. E a visinha??A pobre engommadeira ir-se-ha deitar sem ceia??Vejo-lhe luz no quarto. Inda trabalha. é feia...
Que mundo! Coitadinha!
A DEBIL
Eu, que sou feio, solido, leal,?A ti, que és bella, fragil, assustada,?Quero estimar-te, sempre, recatada?N'uma existencia honesta, de crystal.
Sentado á mesa d'um café devasso,?Ao avistar-te, ha pouco, fraca e loura,?N'esta Babel t?o velha e corruptora,?Tive ten??es de offerecer-te o bra?o.
E, quando soccorreste um miseravel,?Eu, que bebia calices d'absintho,?Mandei ir a garrafa, porque sinto?Que me tornas prestante, bom, saudavel.
?Ella ahi vem!? disse eu para os demais;?E puz-me a olhar, véxado e suspirando,?O teu corpo que pulsa, alegre e brando,?Na frescura dos linhos matinaes.
Via-te pela porta envidra?ada;?E invejava,--talvez que o n?o suspeites!--?Esse vestido simples, sem enfeites,?N'essa cintura tenra, immaculada.
Ia passando, a quatro, o patriarcha.?Triste eu sahi. Doía-me a cabe?a;?Uma turba ruidosa, negra, espessa,?Voltava das exequias d'um monarcha.
Adoravel! Tu muito natural?Seguias a pensar no teu bordado;?Avultava, n'um largo arborisado,?Uma estatua de rei n'um pedestal.
Sorriam nos seus trens os titulares;?E ao claro sol, guardava-te, no entanto,?A tua boa m?e, que te ama tanto,?Que n?o te morrerá sem te casares!
Soberbo dia! Impunha-me respeito?A limpidez do teu semblante grego;?E uma familia, um ninho de socego,?Desejava beijar sobre o teu peito.
Com elegancia e sem ostenta??o,?Atravessavas branca, esvelta e fina,?Uma chusma de padres de batina,?E d'altos funccionarios da na??o.
?Mas se a atropella o povo turbolento!?Se fosse, por acaso, alli pisada!??De repente, paraste embara?ada?Ao pé d'um numeroso ajuntamento.
E eu, que urdia estes faceis esbocetos,?Julguei vêr, com a vista de poeta,?uma pombinha timida e quieta?N'um bando amea?ador de corvos pretos.
E foi, ent?o, que eu homem varonil,?Quiz dedicar-te a minha pobre vida,?A ti, que és tenue, docil, reconhecida,?Eu, que sou habil, pratico, viril.
N'UM BAIRRO MODERNO
A Manuel Ribeiro
Dez horas da manh?; os transparentes?Matizam uma casa apala?ada;?Pelos jardins estancam-se os nascentes,?E fere a vista, com brancuras quentes,?A larga rua macadamisada.
Rez-de-chaussée repousam socegados,?Abriram-se, n'alguns, as persianas,?E d'um ou d'outro, em quartos estucados,?Ou entre a rama dos papeis pintados,?Reluzem, n'um almo?o, as porcelanas.
Como é saudavel ter o seu conchego,?E a sua vida facil! Eu descia,?Sem muita pressa, para o meu emprego,?Aonde agora quasi sempre chego?Com as tonturas d'uma apoplexia.
E rota, pequenina, aramafada,?Notei de costas uma rapariga,?Que no xadrez marmoreo d'uma escada,?Como um retalho de horta agglomerada,?Pousára, ajoelhando, a sua giga.
E eu, apesar do sol, examinei-a:?Poz-se de pé: resoam-lhe os tamancos;?E abre-se-lhe o algod?o azul da meia,?Se ella se curva, esguedelhada, feia,?E pendurando os seus bracinhos brancos.
Do patamar responde-lhe um criado:??Se te convém, despacha; n?o converses.?Eu n?o dou mais.? E muito descan?ado,?Atira um cobre livido, oxidado,?Que vem bater nas faces d' uns alperces.
Subitamente,--que vis?o de artista!--?Se eu transformasse os simples vegetaes,?á luz do sol, o intenso colorista,?N'um ser humano que se mova e exista?Cheio de bellas propor??es carnaes?!
Boiam aromas, fumos de cozinha;?Com o cabaz ás costas, e vergando,?Sobem padeiros, claros de farinha;?E ás portas, uma ou outra campainha?Toca, frenetica, de vez em quando.
E eu recompunha, por anatomia,?Um novo corpo organico, aos bocados.?Achava os tons e as fórmas. Descobria?Uma cabe?a n'uma melancia,?E n'uns repolhos seios injectados.
As azeitonas, que nos d?o o azeite,?Negras e unidas, entre verdes folhos,?S?o tran?as d'um cabello que se ageite;?E os nabos--ossos nus, da c?r do leite,?E os cachos d'uvas--os rosarios d'olhos.
Ha collos, hombros, boccas, um semblante?Nas posi??es de certos fructos. E entre?As hortali?as, tumido, fragrante,?Como d'alguem que tudo aquilo jante,?Surge um mel?o, que me lembrou um ventre.
E, como um feto, emfim, que se dilate,?Vi nos legumes carnes tentadoras,?Sangue na ginja vivida, escarlate,?Bons cora??es pulsando no tomate?E dedos hirtos, rubros, nas cenouras.
O sol dourava o céo. E a regateira,?Como vendera a sua fresca alface?E déra
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