Miniaturas Romanticas | Page 5

Sebastião de Magalhães Lima
entre as fragas estereis da vida; sem mesmo um refrigerio para as chagas do seu pobre cora??o; sem uma esperan?a, ao menos, que lhe acalente os sonhos radiosos do existir durante o correr tempestuoso, que vai do ber?o �� sepultura: esse homem, digo, descr�� da Providencia; torna-se cynico; e vai buscar na ponta d'um punhal aquillo que n?o p?de encontrar no meio d'essa sociedade estulta e devassa.
E, ainda haver�� quem condemne o suicidio?!...
Condemna-o, sim, a mediocridade, porque o n?o comprehende; porque lhe �� mesmo impossivel conceber a lucta gigante que se trava a cada passo nos espiritos altaneiros entre a raz?o e a vontade,--duas faculdades de que depende toda a nossa vida e bem-estar terrestre.
Por isso, minha bondosa m?e, e deixe-me chamar-lhe assim nos ultimos instantes do meu passamento neste mundo, aben??e pela derradeira vez o seu desgra?ado filho, que sem saudade abandona este theatro maldito, para ir tributar perante o throno do Altissimo o sanctuario das puras affei??es e leal obediencia.
Adeus, minha desvelada m?e, e adeus para sempre. N?o descreia do seu filho, e lembre-se que s�� no c��u se poder�� encontrar a remunera??o condigna ��s virtudes mundanas.--Mauricio.
Cecilia ficou como que petrificada, ao receber o golpe inesperado, que lhe causara a carta de Mauricio. Desvairada pelo infortunio, assaltada por uma vis?o sinistra e cruel, aquella extremosa m?e vendeu a sua casa em Bemfica, que lhe era recordar amargo d'uma felicidade radiante e fallaz, e recolheu-se a um convento, onde vive ainda hoje, acompanhada pela resigna??o, e alimentada pela virtude esperan?osa de que um dia se ir�� reunir no seio do Creador ��quelles dois martyres bemaventurados, a quem o vulc?o das paix?es sorveu para sempre na sua cratera de fogo.

*AMOUR ET CHAMPAGNE*

AMOUR ET CHAMPAGNE
Vive l'amour! Vive le champagne!...
O amor �� o nosso her��e, mas um her��e comme il faut; o champagne o seu condigno satellite.
A scena passa-se n'um baile, se bem me recordo.
O protogonista da ac??o �� um mancebo de vinte annos, pouco mais ou menos; alto, magro, de cabello e bigode alourado, testa rasgada e ampla, olhos pequeninos e vivos, e com todos os signaes visiveis d'uma imagina??o eminentemente fogosa, mas, em parte, j�� obscurecida pelo cont��nuo perpassar de medonhas orgias e pelo ro?ar de perigosas paix?es.
Agora, com estes preludios, leitor amigo, acompanhemos o nosso personagem, e perscrutemos, sem escrupulo, alguns episodios da sua tragica vida.
Silencio, pois!
Eil-o ali, ��quelle cantinho! L�� caminha passo lento e medido! Os sons da orchestra attr��em-n'o irresistivelmente ao sal?o! Aquelle esplendor, aquella voluptuosidade oriental, que se respira n'aquelle recinto ideal e angelico, despertam em sua alma febril o enlevo de mais venturosos dias, evocando �� sua phantasia amortecida esses phantasmas crueis e fagueiros, que outr'ora lhe alimentavam os doces sonhos do porvir.
Alvaro, dirigido para ali automaticamente, foi sentar-se na primeira cadeira, que, ao acaso, encontrou.
A dan?a tornara-se delirante, e a sua alma, j�� de muito saturada com a triste realidade do mundo, palpitava-lhe no seio com a violencia de prolongadas e suaves sensa??es.
Sen?o quando, o som desconhecido d'uma voz argentina e doce lhe attra��u a atten??o desvairada por longinquas paragens.
Despertou do lethargo, o nosso galan. Acercou-se d'aquelle vulto gracioso e nobre, e, convidando-o a dan?ar, entrou n'uma quadrilha.
Alvaro encarou tres vezes o seu mimoso par. N?o sabia dev��ras, como encetar a conversa??o. Dirigir-lhe alguns requebros frivolos e banaes, em que tanto abundam estes bailes da nossa moderna sociedade, isso n?o. N?o se coadunava com a sua indole, em extremo sensivel, o compendiar meia duzia de palavras semsabores, para entreter uma dama, cuja belleza elle, ali��s, admirava.
Era dura a collis?o, mas tinha de acabar, e acabou com effeito, explosiva, mas real.
E sen?o, ou?amos o resto do dialogo, se nos apraz. Esque?amos, por um momento, os outros pares dan?antes, e concentremos a nossa curiosidade sobre os heroes d'esta pequena scena, que intentamos esbo?ar.
--Nem v. ex.^a �� capaz de avaliar quanto foi poderoso e salutar o feiticeiro sorriso de seus labios sobre o meu pobre cora??o, minha senhora. J�� esquecido, ha muito, d'este mundo hypocrita e ridiculo, estava longe de me reputar feliz um momento sequer, quando divisei, na orla do meu horisonte, a terna imagem de v. ex.^a E, com effeito, n?o houve resistir-lhe. Cedi a um impulso intimo; compenetrei-me da gravidade do caso, e agora aqui me tem completamente escravisado e rendido aos p��s de v. ex.^a
Emilia, e porque n?o? Seja-nos licito revelar aqui o seu nome, Emilia nada respondeu; baixou sua loura cabe?a em scismador enleio, e teve a loucura de o acreditar, a desgra?ada.
Horas depois, Alvaro, ao v��r os sal?es de todo desertos, sa��u, como sempre, tetrico e pavoroso.
Entrou no primeiro caf��, que se lhe deparou; mandou vir champagne e cognac; e bebeu, bebeu at�� �� embriaguez! O ultimo calix voou pelos ares, em peda?os ao clamor estridulo e rouquenho de--Vive l'amour! Vive le champagne! Vive l'ivresse! Vive la folie!...
A prostra??o, comtudo, n?o
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