Marilia de Dirceo | Page 9

Tomás António Gonzaga
assombro fa?a:
Mostra mais ternura?Quem te estima, e morre?Nas m?os da desgra?a.
Nesta cruel masmorra tenebrosa?Ainda vendo estou teus olhos bellos,
A testa formosa,?Os dentes nevados,?Os negros cabellos.
Vejo, Marilia, sim, e vejo ainda?A chusma dos Cupidos, que pendentes
Dessa b?cca linda,?Nos ares espalh?o?Suspiros ardentes.
Se alguem me perguntar onde eu te vejo,?Responderei--no peito--que huns Amores
De casto desejo?Aqui te pint��r?o,?E s?o bons Pintores.
Mal meus olhos te vir?o, ah! nessa hora?Teu Retrato fizer?o, e t?o forte,
Que entendo, que agora?S�� p��de apagallo?O pulso da Morte.
Isto escrevia, quando, �� C��os, que pejo!?Descubro a l��r-me os versos o Deos loiro.
Ah! d��-lhes hum beijo,?E diz-me que valem?Mais que letras de oiro.
LYRA II.
Esprema a vil calumnia muito embora?Entre as m?os denegridas, e insolentes
Os venenos das plantas,?E das bravas serpentes.
Chov?o raios e raios, no meu rosto?N?o has-de ver, Marilia, o modo escrito;
O medo perturbado,?Que infunde o vil delicto.
P��dem muito conhe?o, p��dem muito,?As Furias infernaes, que Pluto move;
Mas p��de mais que todas?Hum dedo s�� de Jove.
Este Deos convert��o em flor mimosa;?A quem seu nome der?o, a Narciso,
F��z d' muitos os Astros,?Qu' inda no Ceo diviso.
Elle p��de livrar-me das injurias?Do nescio, do atrevido ingrato povo;
Em nova flor mudar me,?Mudar-me em Astro novo.
Por��m se os justos C��os por fins occultos?Em t?o tyranno mal me n?o soccorrem,
Ver��s ent?o, que os sabios,?Bem como vivem, morrem.
Eu tenho hum cora??o maior que o mundo.?Tu, formosa Marilia, bem o sabes:
Hum cora??o, e basta,?Onde tu mesma cabes.
LYRA III.
Succede, Marilia bella,?�� medonha noite o dia:?A esta??o chuvosa e fria,?�� quente secca esta??o.
Muda-se a sorte dos tempos;?S�� a rainha sorte n?o?
Os troncos, nas Primaveras,?Brot?o em flores vi?osos;?Nos Invernos escabrosos?Larg?o as folhas no ch?o.
Muda-se a sorte dos troncos;?S�� a minha sorte n?o?
Aos brutos, Marilia, cort?o?Armadas redes os passos;?Rompem depois os seus la?os,?Fogem da dura pris?o.
Muda-se a sorte dos brutos;?S�� a minha sorte n?o?
Nenhum dos homens conserva?Alegre sempre o seu rosto;?Depois das penas vem gosto,?Depois do gosto afflic??o.
Muda-se a sorte dos homens;?S�� a minha sorte n?o?
Aos altos Deoses mov��r?o?Soberbos Gigantes guerra;?No mais tempo o Ceo, e a Terra?Lhes tributa adora??o.
Muda-se a sorte dos Deoses;?S�� a minha sorte n?o?
Hade, Marilia, mudar-se?Do destino a inclemencia:?Tenho por mim a innocencia,?Tenho por mim a raz?o.
Muda-se a sorte de tudo;?S�� a minha sorte n?o?
O tempo, �� bella, que gasta?Os troncos, pedras, e o cobre,?O v��o rompe, com que encobre?�� verdade a vil trai??o.
Muda-se a sorte de tudo;?S�� a minha sorte n?o?
Qual eu sou ver�� o mundo,?Mais me dar�� do que eu tinha,?Tornarei a ver-te minha.?Que feliz consola??o!
N?o ha de tudo mudar-se,?S�� a minha sorte n?o.
LYRA IV.
J��, j�� me vai, Marilia, branquejando?Loiro cabello, que circ��la a testa.?Este mesmo, que alveja, vai cahindo,
E pouco j�� me resta.
As faces v?o perdendo as vivas c?res,?E v?o-se sobre os ossos enrugando,?Vai fugindo a viveza dos meus olhos;
Tudo se vai mudando.
Se quero levantar-me, as costas verg?o;?As for?as dos meus membros j�� se gast?o,?Vou a dar pela casa huns curtos passos,
Pes?o-me os p��s, e arrast?o.
Se algum dia me vires desta sorte,?V�� que assim me n?o p?z a m?o dos annos:?Os trabalhos, Marilia, os sentimentos,
Fazem os meus danos.
Mal te vir me dar�� em poucos dias,?A minha mocidade o doce gosto;?Ver��s burnir-se a pelle, o corpo encher-se,
Voltar a c?r ao rosto.
No calmoso Ver?o as plantas secc?o,?Na Primavera, que aos mortaes encanta,?Apenas cahe do Ceo o fresco orvalho,
Verdeja logo a planta.
A doen?a deforma a quem padece;?Mas logo que a doen?a fez seu termo,?Torna, Marilia, a ser quem era d'antes,
O definhado enfermo.
Suppo[~e]-me qual doente, ou qual a planta,?No meio da desgra?a, que me altera:?Eu tambem te supponho qual saude,
Ou qual a Primavera.
Se d?o esses teus meigos, vivos olhos?Aos mesmos Astros luz, e vida ��s flores;?Que effeitos n?o far?o, em quem por elles
Sempre morr��o de amores?
LYRA V.
Os mares, minha bella, n?o se movem;?O brando Norte assopra, nem diviso?Huma nuvem sequer na Esfera toda,?O destro Nauta aqui n?o he preciso;?Eu s�� conduzo a n��o, eu s�� mod��ro
Do seu governo a roda.
Mas ah! que o Sul carrega, o mar se empolla,?Rasga-se a v��la, o mastar��o se parte!?Qualquer var?o prudente aqui j�� teme?N?o tenho a necessaria for?a, e arte.?Corra o sabio Piloto, corra, e venha
Reger o duro leme.
Como succede �� n��o no mar, succede?Aos homens na ventura, e na desgra?a:?Basta ao feliz n?o ter total demencia,?Mas quem de venturoso a triste passa,?Deve entregar o leme do discurso
Nas m?os da s? prudencia.
Todo o Ceo se cubrio, os raios chovem;?E esta alma, em tanta pena consternada,?Nem sabe aonde possa achar conforto.?Ah, n?o, n?o tardes, vem, Marilia amada,?Toma o leme da n��o, mar��a o panno,
Vai-a salvar no porto.
Mas ou?o j�� de Amor as sabias vozes:?Elle me diz que soffra se n?o morro;?E perco ent?o se morro huns doces la?os.?N?o quero j��, Marilia, mais soccorro,?Oh ditoso soffrer, que lucrar p��de
A gloria dos teus bra?os.
LYRA VI.
De que te queixas,?Lingua importuna??De que a Fortuna?Roubar-te queira,?O que te deu?
Este foi sempre?O genio seu.
Levou, Marilia,?A impia sorte?Catoens �� morte;?Nem sepultura?Lhes concedeu.
Este foi sempre?O genio seu.
A outros muitos,?Que v��s nasc��r?o,?Nem merec��r?o,?A grandes thronos?A impia ergueu.
Este
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