era a vista can?ada,?--Foi a noite que desceu...
Mesmo assim lá ficaria?Absorto em muda prece?De quem mal sabe rezar,?Se o sacrist?o n?o viesse,?Com rodas de Senhoria,?Dizer-me que ia fechar...
Pudesse tel-o trazido?E n?o fosse eu rico, apenas?De phantasias, d'esp'ran?as,?Punha-o num nicho florido?Por sobre as camas pequenas?Dum hospital de crean?as...
Dum hospital modelar?Sustentado por meus bens,?Entre olaias e roseiras,?Cheio de sol, cheio d'ar,?E em que as boas enfermeiras?--Seriam as proprias m?es...
A mais ampla enfermaria?Desse escolhido local?De bondade e soffrimento?--Era o fundo natural?Da funda melancolia?Do Menino do convento...
BALLADA DA NEVE
Il pleure dans mon coeur?Comme il pleut sur la ville.
Verlaine
A Vicente Arnoso
Batem leve, levemente?Como quem chama por mim...?Será chuva? Será gente??Gente n?o é certamente?E a chuva n?o bate assim...
é talvez a ventania;?Mas ha pouco, ha poucochinho,?Nem uma agulha bolia?Na quieta melancolia?Dos pinheiros do caminho...
Quem bate assim levemente?Com t?o estranha leveza?Que mal se ouve, mal se sente?...?N?o é chuva, nem é gente,?Nem é vento com certeza.
Fui ver. A neve cahia?Do azul cinzento do ceu?Branca e leve, branca e fria...?--Ha quanto tempo a n?o via!?E que saudades, Deus meu!
Olho-a atravez da vidra?a.?Poz tudo da c?r do linho.?Passa gente e quando passa?Os passos imprime e tra?a?Na brancura do caminho...
Fico olhando esses signaes?Da pobre gente que avan?a?E noto, por entre os mais,?Os tra?os miniaturais?Duns pézitos de crean?a...
E descalcinhos, doridos...?A neve deixa inda vel-os?Primeiro bem definidos,?--Depois em sulcos compridos,?Porque n?o podia erguel-os!...
Que quem já é peccador?Soffra tormentos, emfim!?Mas as crean?as, Senhor,?Porque lhes daes tanta d?r?!...?Porque padecem assim?!...
E uma infinita tristeza?Uma funda turba??o?Entra em mim, fica em mim prêsa.?Cae neve na natureza...?--E cae no meu cora??o.
TOADA PARA AS M?ES ACALENTAREM OS FILHOS
A Bertha Cayolla Gil Vianna, minha sobrinha
Oh Desgra?a! vae-te embora,?Que esta linda criancinha?Andou no meu ventre e agora?Trago-a nos bra?os. é minha!...
Do ber?o, segue-me os passos;?Onde eu vou, seus olhos v?o...?E quando a aperto nos bra?os?--Abra?o o meu cora??o.
Quando o seu ch?ro receio,?Embalo-a, fa?o que acceite?A alegria do meu seio?Na brancura do meu leite...
E quando assim n?o descan?a,?Que tristezas me consomem!?--Mas antes chore em crean?a?Que depois, quando f?r homem...
Se ao dal-o ao mundo soffri?Tormentos, ancias mortaes,?Desgra?a, vae-te d'aqui,?O que pretendes tu mais?!
Bate as azas, mas ao voares,?N?o me apagues esta estrella.?Se alguem d'aqui precisares,?--Aqui me tens, em vez della!
Tocam ás ave-marias.?Foi-se o sol. N?o vem a lua.?Luzinha que me allumias,?Que sorte será a tua?...
Riquezas tenhas t?o grandes,?E tal bondade tambem,?Que ao redor d'onde tu andes?N?o fique pobre ninguem.
Que a todos chegue a ventura:?Toda a bocca tenha p?o,?Toda a nudez cobertura,?Toda a d?r, consola??o...
Mas se o oiro é mau caminho,?--Antes tu venhas a ser?O pobre mais pobrezinho?De quantos pobres houver.
Iremos por esses montes?Altos e azues, como os céus...?Que onde ha fructos e onde ha fontes,?--Está a meza de Deus!
E, quando a neve cahir?E as seivas adormecerem,?Iremos ent?o pedir...?(Acceitar o que nos derem!)
Andaremos á mercê?Dos genios bons, e dos falsos,?Leguas e leguas a pé,?Rotinhos, magros, descal?os...
E onde houver urzes e tojos,?Pedras que rasgam a pelle,?Porei o corpo de r?jos?--Passarás por cima delle!
Dorme, dorme, meu menino,?Foi-se o sol. Nasceu a lua.?Qual será o teu destino??Que sorte será a tua?...
Se um crime tens de fazer,?Antes fique vago um throno,?Antes um palacio a arder,?--Do que uma enxada sem dono...
Se, porém, no teu destino,?Ha t?o cruentos signaes,?Dorme, dorme, meu menino,?--N?o tornes a acordar mais!
O NOSSO LAR
A Antonio Arroyo
?Sonhar a vida é apenas entretel-a.?Partamos della para nós, sen?o?Lá vae o cora??o para uma estrella?E fica a gente sem o cora??o!?
GUEDES TEIXEIRA_. Esperan?a Nossa_
Quem vir--como eu os vejo--decorrer?Annos e annos duma vida rasa?Em miseraveis quartos d'aluguer,
Frios no inverno e no estío em braza,?--A um am?r sonhado de mulher?Allía sempre o sonho duma casa...
O aspecto duma casa raro mente,?A c?r, as linhas duma frontaria?D?o logo a perceber nitidamente,
Melhor do que um vizinho o contaria,?O genio e a indole da gente?Que nella tem o lar, a moradia.
Vejam esses cottages tanto em moda?Entre os inglezes e os capitalistas,?Com grades no jardim, a toda a roda...
Impenetraveis ás alheias vistas...?N?o abrem nunca uma janella toda...?S?o mudos, graves, individualistas.
E aquelles caixot?es de pedra e cal?Que surgem ao formar-se um bairro novo,?No constante engordar da Capital,
(O que eu, aliás, muito aprecio e louvo...)?--N?o mostram bem, com o seu ar banal,?A falta de caracter deste povo?
Quando uma santa e pobre rapariga,?Em cujo olhar se abranda o meu soffrer?E a cujo cora??o o meu se liga,
Puder chegar a ser minha mulher,?Eu quero ent?o que a nossa casa diga?Bondade e alegria de viver.
Terá um só andar. Grandes alturas?Causam vertigens, trazem ambi??es.?Os sonhos de riqueza e d'aventuras
Enchem as almas de desillus?es.?A f'licidade vem ás creaturas?Da pacifica??o dos cora??es.
As portas sem degraus. Que sejam rentes?Da terra. Portas largas e rasgadas,?Convidativas, francas, attrahentes;
Ao rez da terra, para as aleijadas?e os tropegos velhinhos indigentes?Se n?o can?arem a subir escadas...
Amplas janellas para a natureza.?Que o sol na sua clara irradia??o?Dissipe atravez dellas a tristeza;
Amplas--e baixas. Quem precise p?o,?E o vir da rua sobre a nossa meza,?Que estenda o bra?o, que lhe lance a m?o...
Ao
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