Frei Luiz de Sousa | Page 9

Almeida Garrett
de casa de meu pae:? �� o principio d'aquelle livro tam bonito que minha m?e diz que n?o intende: intendo-o eu.--Mas aqui n?o ha menina nem m??a; e v��s, senhor Telmo-Paes, meu fiel escudeiro, ?faredes o que mandado vos ��.?--E n?o me repliques, que ent?o altercamos, faz-se bulha, e acorda minha m?e, que �� o que eu n?o quero. Coitada! Ha oito dias que aqui estamos n'esta casa, e �� a primeira noite que dorme com soc��go. Aquelle palacio a arder, aquelle povo a gritar, o rebate dos sinos, aquella scena toda... oh! tam grandiosa e sublime, que a mim me encheu de maravilha, que foi um espectaculo como nunca vi outro de egual majestade!... �� minha pobre m?e atterrou-a, n?o se lhe tira dos olhos: vai a fech��-los para dormir, e diz que ve aquellas chammas innoveladas em fummo a rodear-lhe a casa, a crescer para o ar, e a devorar tudo com furia infernal... O retratto de meu pae, aquelle do quarto de lavor tam seu favorito, em que elle estava tam gentil homem, vestido de cavalleiro de Malta com a sua cruz branca no peito--aquelle retratto n?o se p��de consolar de que lh'o n?o salvassem, que se queim��sse alli. Ves tu? ella que n?o cria em agouros, que sempre me estava a reprehender pelas minhas scismas, agora n?o lhe s��i da cabe?a que a perda do retratto �� prognostico fatal de outra perda maior que est�� perto, de alguma desgra?a inesperada, mas certa, que a tem de separar de meu pae.--E eu agora �� que fa?o de forte e assizada, que zombo de agouros e de sinnas... para a animar, coitada!... que aqui entre n��s, Telmo, nunca tive tanta fe n'elles. Creio, oh se creio! que s?o avisos que Deus nos manda para nos preparar.--E ha... oh! ha grande desgra?a a cahir s?bre meu pae... decerto! e s?bre minha m?e tambem, que �� o mesmo.
*Telmo*, disfar?ando o terror de que est�� tomado. N?o digaes isso... Deus hade faz��-lo por melhor, que lh'o merecem ambos. (_Cobrando animo e exaltando-se_) Vosso pae, D. Maria, �� um portuguez ��s direitas. Eu sempre o tive em boa conta; mas agora, depois que lhe vi fazer aquella ac??o,--que o vi, com aquella alma de portuguez velho, deitar a m?o ��s tochas, e lan?ar elle mesmo o fogo �� sua propria casa; queimar e destruir n'uma hora tanto do seu haver, tanta coisa de seu g?sto, para dar um exemplo de liberdade, uma lic??o tremenda a estes nossos tyrannos... oh minha querida filha, aquillo �� um homem. A minha vida que elle queira �� sua. E a minha pena, toda a minha pena �� que o n?o conheci, que o n?o estimei sempre no que elle valia.
*Maria*, com as lagrymas nos olhos, e tomando-lhe as m?os. Meu Telmo, meu bom Telmo!... �� uma gl��ria ser filha de tal pae: n?o ��? dize.
*Telmo*. Sim ��: Deus o defenda!
*Maria*. Deus o defenda! amen.--E elles, os tyrannos governadores ainda estar?o muito contra meu pae? Ja soubeste hoje alguma coisa, das dilig��ncias do tio Frei Jorge?
*Telmo*. Ja, sim. V?o-se desvanecendo--ainda bem!--os agouros de vossa m?e... h?ode sahir falsos de todo. O arcebispo, o conde de Sabugal, e os outros, ja vosso tio os trouxe �� raz?o, ja os moderou. Miguel de Moura �� que ainda est�� renitente; mas hade-lhe passar. Por estes dias fica tudo socegado. Ja o estava se elle quizesse dizer que o fogo tinha pegado por acaso. Mas ainda bem que o n?o quiz fazer; era desculpar com a villania de uma mentira o generoso crime por que o perseguem.
*Maria*. Meu nobre pae!--Mas quando hade elle sahir d'aquelle omizio? Passar os dias retirado n'essa quinta tam triste d'al��m do Alfeite, e n?o pod��r vir aqui sen?o de noite, por instantes, e Deus sabe com que perigo!
*Telmo*. Perigo nenhum; todos o sabem e fecham os olhos. Agora �� so conservar as apparencias ahi mais uns dias, e depois fica tudo como d'antes.
*Maria*. Ficar��, p��de ser, Deus queira que seja!--Mas tenho ca uma coisa que me diz que aquella tristeza de minha m?e, aquelle susto, aquelle terror em que est��--e que ella disfar?a com tanto trabalho na presen?a de meu pae (tambem a mim m'o queria incobrir, mas agora ja n?o p��de, coitada!) aquillo �� presentimento de desgra?a grande...--Oh! mas �� verdade... vinde ca: (_Leva-o deante dos tres retrattos que est?o no fundo; e apontando para o de D. Jo?o_) de quem �� este retratto aqui, Telmo?
*Telmo*, olha, e v��ra a cara de repente. Esse ��... hade ser... �� um da familia, d'estes senhores da casa de Vimioso que aqui est?o tantos.
*Maria*, amea?ando-o com o dedo. Tu n?o dizes a verdade, Telmo.
*Telmo*, quasi offendido. Eu nunca menti, senhora D. Maria de Noronha.
*Maria*. Mas n?o diz a verdade toda o senhor Telmo-Paes; que �� quasi o mesmo.
*Telmo*.
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