de graça pura
Fulgentes raios divinos; Vellaõ-a em torno os Anjos, Bafejando hum
sono grato, Tecem de apraziveis sonhos Da eterna Gloria o retrato; Para
ella o Divino Espozo O annel nupcial prepara; Escuta o Côro das
Virgens, Que em seu louvor se entoara: Fragantes rozas do Edén, Que
naõ podem ser murchadas, Com mais viva côr rebentaõ As que lhe saõ
destinadas; As azas dos Serafins, Que os bandos rentos abalaõ, Mil
perfumes esquezitos Benignamente lhe exhalaõ; E su'alma emfim
voando Entre a celeste armonia Sente o seu fim antevendo A sempre
eterna alegria Dif'rente tropel de sonhos Minh'alma errante extravia; E
quando em nocturnas sombras Me retrata a fantezia Bem como te hei
conhecido; Entaõ minha consciencia Se immudece, e á Natureza Deixa
liberta influencia; Meu coraçaõ todo inteiro, Naõ tendo mais que temer,
Voa para ti a buscar O seu unico prazer Eu sim te escuto, e te vejo,
Com minhas maõs deligente Vou a segurar-te ancioza Cerro o fantasma
apparente; Desperto-me, e nada escuto, Naõ vejo mais que o engano;
Dezaparece o fantasma, Como tu foge tirano; Eu o revoco, e he surdo Á
minha suplica activa, Estendo os braços, so acho Huma sombra fugitiva;
Outra vez os olhos fecho Para o sonho recobrar... Vinde outra vez
illuzoens, Vinde outra vez me encantar. Ah que em vaõ vos torno a ver
Pois comtigo irei vagar Pelos aridos dezertos Nossas desgraças chorar:
Logo a huma torre te elevas Do tempo meia escarpada Pelos
carcomidos muros De tristes heras cercada; Ou sobre montoens de
rochas, Cujo cimo as nuvens fende; Que em arrogante estructura
Sobranceiro ao Mar se estende; D'ali, qual dos Ceos me fallas; Mas
negras vagas me aterraõ, Separaõ-nos densas nuvens, Os ventos
furiozos berraõ; Gélo de horror, eis o sono Foge de arranco, e me deixa
Outra vez entre os tormentos Da minha amargoza queixa. O destino a
teu respeito Tem seu rigor moderado, Pois dos prazeres, e penas Fria
suspensaõ te ha dado: He tua vida o socego, Teu Coraçaõ sem paixoens,
Similhante ao Mar, em quanto Naõ conheceo Aquiloens: He igual o teu
estado Ao de hum sancto adormecido, Que he de todos os pecados
Plenamente absolvido; E que em seu Deos confiando Huma certa
salvaçaõ Para alcançar naõ preciza D'outra alguma espiaçaõ. Vem pois,
querido Abaylard, Que receio te domina? Amor o abrazado faxo Para
os Mortos naõ destina; Imperio em ti ja naõ tem O fogo que amor
ordena, A Natureza immudece, A Religiaõ o condenã; Mas quando fria
indif'rença Governa em teu Coraçaõ, Por ti ainda Heloiza Sente a mais
viva paixaõ! Oh chama em meu peito eterna Activa chama exesp'rada!
Á alampeda sepulcral Tristemente assemelhada; Que dà innutil calor
Ás urnas de pedra fria, Que para os Mortos se accende, A quem
somente alumia: Que outras scenas se preparaõ Por onde os meus
passos seguem! Qu'imagens ternas, p'rigozas Com profia me
perseguem! Ou quando sobre os sepulcros, Ou prostrada ante os Altares,
Illudindo os meus sentidos Cauzaõ me acerbos pezares: Sempre entre o
Ceo, e Heloiza, A imagem tua apparece; Apenas escuta hum Hymno A
tua voz reconhece; E quando em truncadas preces Aos Ceos minha voz
levanto, A cada som que articulo, Me corre alternado pranto. Ou se
entre nuvens de incenso, Que á Imagem d'hum Deos se envìa, E o som
devoto do Orgão Me enche toda de armonia; Se occorre hum so
pensamento, Que a imagem tua m'offerece Vejo Abaylar; e a meus
olhos Tudo o mais dezaparece; Lumes, Templo, Sacerdotes Á minha
vista naõ tornaõ; E quando aos Sanctos Altares Mais de mil faxos
adornaõ; E aos Anjos que emtorno os cercaõ Penetra o maior respeito
Hum mar de paixoens ardentes Me innunda o cançado peito, Mas se no
tempo em qu'of'reço Hum coraçaõ mais contricto Ante o Throno do
meu Deos; E arrepender me medito; Que invoco este Deos Piedozo
Com meu pranto penitente; Que vai penetrar minh'Alma Huma Graça
transcendente; Se te atreves, qual me encantas, Abaylard es poderozo,
Vem revogar os decretos Do mesmo Ceo rigoroso; Disputa-lhe hum
Coraçaõ Com teus olhos, inda mais, Aos meus escurece a imagem Das
Ditas Celestiaes; Desvia a Graça Divina Com hum Mando absoluto E o
meu arrependimento Se te apraz torna-o sem fructo, Dos Ceos me fecha
o caminho, Acharás minh'alma franca, Dos braços do mesmo Deos A
tua Victima arranca.... Mas que digo, desgraçada! Foge-me!... O Ceo
mé depare Entre nós altas montanhas, Immenso Mar nos separe; Naõ
tornes mais, naõ me escrevas, De mim algum pensamento Naõ tenhas,
nem leve parte Do que he por ti meu tormento: Teus juramentos
disolvo, De ti nem lembrar-me quero Tudo o que a mim se refere So
que aborreçao espero.... Olhos cheios de ternura Qu'inda tanto me
lembrais, Doces ideas queridas Adeos para nunca mais.... E tu, Oh
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