dizer a mais pequena coisa em seu desabono. Com taes e quejandos titulos á estima de seus concidad?os, o sr. Carneiro tinha conseguido tornar-se um dos maridos mais felizes do seu bairro, que era o Alto.
Mas o homem nunca está satisfeito sobre a face da terra: o sr. Carneiro era homem, e por conseguinte tinha aspira??es. O seu ideal era a vida bucolica, amava a chicoria e o feno, adorava os rabanetes, e sonhava pastoras e zagallos; n?o podia viver na capital. Suspirava constantemente pelo chocalho campestre, pelas felicidades ruraes, e a sua paix?o pelo campo n?o podia achar lenitivo nos esgalhos do Rocio, nas ervas do Passeio Publico, nas couves da pra?a da Figueira.
Por fim os seus sonhos tiveram uma realidade, comprou uma quinta na aldea de Pae Pires, e transferiu para alli os seus penates. Alli, n'uma habita??o modesta, no declive de um serro, vendo ao longe o Tejo e as suas faluas, passava o sr. Carneiro uma vida santa, junto de madama Carneira, como elle lhe chamava, cultivando as suas cebollas, regando a sua horta, capando o seu meloal.
Ali fazia admirar á sua cara metade a grossura dos seus pepinos ou a c?r rubicunda dos seus tomates.
--Vês, menina, lhe dizia, como está lindo este meu pepino; olha para esta perfei??o, parece que d'hontem para hoje cresceu meio palmo. Repara-me para a belleza d'estes tomates! que c?r e que tamanho...
--é verdade, cada dia est?o mais vermelhos...
--E este mel?o?
--Cresce a olhos vistos, como já está redondinho!
--Ah! filha! n?o é como tu, segue a lei da naturesa; tudo cresce e se arredonda cá n'este mundo... só tu, meu anjinho... apesar das minhas diligencias, persistes em n?o arredondar essa...
--Que bonitas est?o as batatas.
--Eu sempre as tive boas.
--E que bellos gr?os de bico!
--Os gr?os s?o o meu forte...
--Como a vinha vae arrebentando...
--Tudo arrebenta e produz... só tu n?o me produzes nada... (dá um profundo suspiro).
--Que animal é aquelle que está bebendo além, no rio?
--Julgo que é um burro, queridinha.
--Engana-se, é boi, senhor Carneiro.
--Boi, boi! será... mas n?o lhe vejo as armas...
--Jesus! que bicho t?o feio que eu ia pisando! Mate-me este bicho, sr. Carneiro... que nojo!
--Ah! ah! ah! Ora n?o ha uma tolinha assim! um caracol, pois mette-te medo um caracol?
--Olhe, só os paus que elle tem; t'arrenego! n?o se veem sen?o animaes bicorneos por estes sitios... eu que sempre embirrei com estes bichos!
--N?o te zanques commigo, menina... isto é o animal mais innocente que eu conhe?o...
--Que quer? n?o está mais na minha m?o; diga lá o que disser, n'este ponto n?o posso vencer a minha repugnancia...
(O marido toma o caracol entre dois dedos.)
--Olha vês, n?o faz mal. Caracol, caracol, p?e os corninhos ao sol...
--Deite isso fóra... que me ataca os nervos...
--Socega, filha, ja deito...
--Esteja quieto! tire isso para lá!
--Ent?o n?o vês que já o n?o tenho na m?o! Pobre amorsinho, que medo que teve... mas agora dá um beijinho... (quer abra?al-a.)
--Vá primeiro lavar essas m?os; que nojo, n?o sei o que me parece a tal reima dos caracoes...
--Vamos limpal-as aqui na relva... senta-te aqui ao meu lado...
--Era o que faltava! para me escangalhar o bal?o.
--Ah! trazes bal?o? (vae para apalpar.)
--Esteja quieto que me faz cocegas!
--Tem a saia cheia de nodoas verdes...
--S?o ervas pisadas.
--E n'um sitio esquisito!
--N?o sei quem me poz n'este estado...
--Eu decerto n?o fui. Seria hontem na quinta do Alfeite, quando te perdeste no labyrintho...
Ah! sim, quando o primo Montenegro me lá foi buscar... que bom rapaz que é este nosso primo e hospede... se n?o fosse elle ainda estava a estas horas em procura da saída...
--E como elle soube entrar e saír com a mesma facilidade... como elle sabe d'aquelles torcicolos...
--é porque sabe desenho.
--Mas sentemo-nos, a erva está t?o fresca. Com o calor que está ha de ser um prazer... pódes até levantar as saias para apanhar mais fresco...
--Obrigada, fresca estou eu...
--Que bella noite, que ar t?o puro! como é bom ver as estrellas, assim, ao pé d'uma linda rapariga como tu!
--Digo-lhe que tenho frio, estou fria que nem uma pedra...
--Pois eu estou quente que nem uma braza...
--é feliz.
--Podia sel-o... se quizesse... n?o me resista... ora está agora com medo do seu Carneiro... eu sou sempre o mesmo, aqui e em casa...
--Esteja quieto, senhor, agora aqui no meio da rua...
--Estamos em nossa casa, n?o offendemos a moral publica...
--Faz luar como de dia...
--Melhor se vê o que se faz...
--S?o coisas que n?o gosto de fazer contra vontade!
--Tambem, n?o sei quando tem vontade!
--Olhe que se espeta nos arcos do bal?o.
--Maldita moda que cá havia de vir!
--Bem sabe que sou delicada... olhe que me ataca os nervos a mais pequena coisa...
--Pequena, pequena! pois esta n?o é das maiores...
--Pelo que vejo quer-me ver doente... já estou com uns arripios...
--Olha, embrulha-te no meu paletot... (aproxima-se ainda mais da mulher) apertemo-nos bem um contra o outro... assim, assim... vês? aposto que d'aqui a cinco minutos
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