esta hora, e com este tempo vieste até aqui com esta boa mulher.
--Desculpai, minha boa senhora,--disse a cega,--Rosinha é minha neta.
--Sim, snr.^a D. Thereza, é minha avó, de quem tantas vezes tenho fallado a v. exc.^a e...
--Ent?o porque n?o continuas?--lhe replicou D. Thereza.
A pequena levantou para D. Thereza os seus lindos olhos azues, com uma tal express?o de supplica, que a commoveu.
--Falla, falla, minha menina. N?o tenhas receio. Queres pedir-me alguma cousa, n?o é assim?
--Vêde, minha boa senhora,--disse Rosa, contendo as lagrimas a custo,--eu e minha avó, somos muito desgra?adas. Meu pai, que era rachador de lenha, feriu-se pelo S. Jo?o em uma perna com o machado. Minha m?i mandou-me chamar a toda a pressa o snr. Pereira, que é um homem muito entendido. Fui, o mais depressa que pude, e quando cheguei a casa do snr. Pereira estava elle para sahir, e n?o queria vir commigo para n?o torcer o seu caminho; mas eu tanto lhe pedi, que sempre me acompanhou. Quando viu a perna a meu pai, logo disse, que estava muito mal, e que n?o promettia cural-o. Duas semanas depois veio á ferida uma molestia, de que me n?o lembra agora o nome, e meu pai morreu.
Rosa calou-se chorando, e a cega tambem solu?ava. D. Thereza abra?ou a rapariguinha, apertou a m?o á pobre velha, e disse:
--Para hoje já é de mais, ámanh?...
--Perd?e-me, snr.^a D. Thereza,--replicou Rosa,--mas é melhor que eu termine hoje,--e continuou:
--Havia um mez que meu pai tinha morrido, quando minha m?i cahiu de cama; a febre n?o a deixava. Eu ia aos campos apanhar as hervas, que minha avó me ensinava, para lhe fazer remedios, mas nada sarava minha m?i. Um dia abra?ou-me e disse-me:
?Minha pobre Rosinha, eu vou unir-me com teu pai, mas que será de ti?
Trabalharei, lhe respondi.
és muito nova para isso; mas entretanto rogarei muito a Deus para que te receba sob a sua santa guarda, e te n?o abandone. Nunca desampares tua avó, sê-lhe obediente e carinhosa..., ainda queria fallar, mas n?o p?de, abra?ou-me e á avósinha, e expirou.?
Desde ent?o alguns rachadores, amigos de meu pai, nos recolheram e soccorreram; mas como n?o s?o ricos, e precisam de mudar de terra por n?o terem aqui que fazer, lembrei-me de vir pedir agasalho á senhora, pois que, sendo t?o boa, n?o deixaria de nos recolher, que somos t?o desgra?adas. Sou fraquinha, mas posso trabalhar. Sei fiar, e come?o a lavar. Guardarei os bois, e os carneiros e tratarei do gallinheiro. Minha avó tambem fia muito bem e estou muito certa, que a ha-de satisfazer com o seu trabalho. Oh! senhora--disse Rosa ajoelhando-se aos pés de D. Thereza--n?o nos abandoneis; satisfazemos-nos com pouco, e faremos todo o possivel para vos agradar, e rogaremos continuamente a Deus pela vossa vida e felicidade.
D. Thereza commoveu-se tanto, com a singeleza e candura d'esta supplica, que duas lagrimas lhe brilharam nos olhos.
--Levanta-te, Rosinha, ámanh? fallaremos n'isso. Tu e tua avó ide-vos deitar. Sempre te direi, que és muito linda e corajosa, para que se n?o tenha piedade de ti.
Rosa beijou com reconhecimento as m?os de D. Thereza, e a cega encheu-a de ben??os. D. Thereza mandou-as conduzir a um pequeno quarto, limpo e quente, em que um somno reparador lhe reanimou as for?as.
III.
Ainda mal a aurora tinha raiado, já Rosa estava a pé. Fatigada, como estava, da jornada do dia antecedente, custou-lhe muito a levantar-se cedo, mas fez um esfor?o para mostrar os seus desejos a D. Thereza.
Arranjou-se, o melhor que p?de, com os seus velhos vestidos, e, depois de ter dirigido mentalmente a Deus uma ora??o fervente, desceu ao andar terreo.
--Já a pé,--lhe disse alegremente D. Thereza.
--Estava t?o can?ada do caminho d'hontem, que receei, já fosse tarde; mas gra?as aos vossos beneficios, minha senhora, já estou prompta, para o que me determinardes.
--E tua avó?
--Ainda dorme. é t?o velhinha e t?o doente, que vos pe?o tenhaes piedade d'ella.
Rosa ergueu as m?os, e esperou tremula a resposta da dona da quinta.
D. Thereza de Sousa era, o que vulgarmente se chama, uma mulher de casa. Tendo viuvado ha doze annos, geria com tanto acerto e economia as suas propriedades, que a sua fortuna tinha augmentado consideravelmente.
Os visinhos do lugar diziam que, pela avareza e mesquinharia, é que tinha alcan?ado a fortuna, que possuia, pois que em qualquer cousa sempre tinha que diminuir, e acrescentavam ironicamente, que, dando tantas esmolas, o dinheiro nunca lhe havia de faltar.
Fosse como fosse, o que sei é, que D. Thereza sensibilisou-se tanto com a historia de Rosinha, que, quando ella ergueu as m?os, e a viu com os olhos arrasados de lagrimas, esperando a resposta, disse para si; que a uma supplica t?o humilde e cheia de tanto amor filial, era impossivel resistir.
N'este momento quem accusasse de avarenta D. Thereza de Sousa, seria injusto com ella, por que, recolhendo a avó e neta,
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