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The Project Gutenberg EBook of Só, by António Nobre
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Title: Só
Author: António Nobre
Release Date: November 30, 2005 [EBook #17193]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
? START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK Só ***
Produced by Ricardo Diogo and Tiago Tejo. Edited by Rita?Farinha (Biblioteca Nacional Digital--).?(This file was produced from images generously made?available by National Library of Portugal (Biblioteca?Nacional de Portugal).)
Je déclare que M. Francisco de Fran?a Amado, libraire-éditeur, 141, rua da Cal?ada, Coimbra: est mon unique représentant et dépositaire de o ?Só?, pour le Portugal.
L.V.
Só
ANTONIO NOBRE
Só
PARIS
LéON VANIER, éDITEUR
19, QUAI SAINT-MICHEL, 19
1892
Tous Droits Réservés
MEMORIA á MINHA M?E AO MEU PAE
Aquelle que partiu no brigue Boa Nova,?E na barca Oliveira, annos depois, voltou;?Aquelle santo (que velhinho e jà corcova)?Uma vez, uma vez, linda menina amou:?Tempos depois, por uma certa lua-nova,?Nasci eu... O velhinho ainda cà ficou,?Mas ella disse:--?Vou, alli adiante, à Cova,?Antonio, e volto jà...? E ainda n?o voltou!?Antonio é vosso. Tomae là a vossa obra!??Só? é o poeta-nato, o lua, o santo, a cobra!?Trouxe-o d'um ventre: n?o fiz mais do que escrever...?Lede-o e vereis surgir do poente as idas magoas,?Como quem ve o sol sumir-se, pelas agoas,?E sobe aos alcantis para o tornar a ver!
*Antonio*
Que noite de inverno! Que frio, que frio!
Gelou meu carv?o:?Mas boto-o á lareira, tal qual pelo estio,
Faz sol de ver?o!
Nasci, n'um Reino d'Oiro e flores?á beira-mar.
ó velha Carlota, tivesse-te ao lado,
Contavas-me historias:?Assim... desenterro, do val do passado,
As minhas Memorias.
Sou neto de Navegadores,?Heroes, Lobos d'agoa, Senhores?Da India, d'Aquém e d'Além-mar!
Moreno coveiro, tocando viola,
A rir e a cantar!?Empresta, bom homem, a tua sachola,
Eu quero cavar:
E o vento mia! e o vento mia!?Que irà no mar!
Erguei-vos, defuntas! da tumba que alveja
Qual Lua, a distancia!?Viz?es enterradas no adro da Igreja,
Branquinha, da Infancia...
Que noite! ó minha Irm? Maria,?Accende um cyrio à Virgem Pia,?Pelos que andam no alto mar...
Lá vem a Carlota que embala uma aurora
Nos bra?os, e diz:??Meu lindo menino, que Nossa Senhora
O fa?a feliz!?
Ao mundo vim, em ter?a-feira,?Um sino ouvia-se dobrar!
E Antonio crescendo, s?osinho e perfeito,
Feliz que vivia!?(E a Dor, que morava com elle no peito,
Com elle crescia...)
Vim a subir pela ladeira?E, n'uma certa ter?a-feira,?Estive jà p'ra me matar...
Mas foi a uma festa, vestido de anjinho,
Que fado cruel!?E a Antonio calhou-lhe levar, coitadinho!
A Esponja do Fel...
Ides gelar, agoas dos montes!?Ides gelar!
A Tia Delphina, velhinha t?o pura,
Dormia a meu lado?E sempre rezava por minha ventura...
E sou desgra?ado!
Agoas do rio! agoas das fontes!?Cantigas d'agoa pelos monles,?Que sois como amas a cantar...
E eu ia ás novenas, em tardes de Maio,
Pedir ao Senhor:?E, ouvindo esses cantos, tremia em desmaio,
Mudava de cor!
Passam na rua os estudantes?A vadrulhar...
E a M?e-Madrinha, do tempo da guerra
A mail-os francezes,?Quando ia ao confesso, á ermida da serra,
Levava-me, ás vezes.
Assim como elles era eu d'antes!?Meus camaradas! estudantes!?Deixae o Poeta trabalhar...
Santinho como ia, santinho voltava:
Peccados? Nem um!?E a instancias do padre dizia (e chorava):
?N?o tenho nenhum...?
ó Job, coberto de gangrenas,?Meu avatar!
As noites, rezava (e rezo ainda agora)
Ao pé da lareira.?(A chuva gemente caia lá fóra,
Fervia a chaleira...)
Conservo as mesmas tuas penas,?Mais tuas chagas e gangrenas,?Que n?o me farto de co?ar!
--Que Deus se amercie das almas do Inferno!
--Amen! Oxalá...?E o mo?o rosnava, tranzido de inverno:
--Que bom lá está!
E a neve cae, como farinha,?Là d'esse moinho a moer, no Ar:
O sino da Igreja tocava, á tardinha:
Que tristes seus dobres!?Era a hora em que eu ia provar, á cozinha,
O caldo dos pobres...
ó bom Moleiro, cautellinha!?N?o desperdices a farinha?Que tanto custa a germinar...
ó velhas criadas! na roca fiando,
Nos lentos ser?es...?Corujas piando, Farrusca ladrando
Com medo aos ladr?es!
Andaes, à neve, sem sapatos,?Vos que nao tendes que cal?ar!
O Zé do Telhado morara, alli perto:
A triste viuva?A nossa caza ia pedir, era certo,
Em noites de chuva...
Corpos au léu, vesti meus fatos!?Pés nus! levae esses sapatos...?Basta-me um par.
ó feira das uvas! em tardes de calma...
(O tempo voou!)?Pediam-me os pobres ?esmola pela alma
Que Deus lhe levou!?
Quando eu morrer, hirto da magoa.?Deitem-me ao mar!
E havias-os com gotta, e havia-os herpeticos,
Mostrando a gangrena!?E mais, e ceguinhos, mas era dos ethicos
Que eu tinha mais pena...
Irei indo de fragua, em fragua,?Até que, emfim, desfeito em agoa,?Hei-de fazer parte do mar!
Chegou uma carta tarjada: a estampilha
Bastou-me enxergar...?Coitados d'aquelles que perdem a filha,
T?o longe do lar!
No Panthéon, tragico, o sino?Dà meia-noite, devagar:
ó tardes de outomno, com fontes carpindo
Entre herva sedenta...?Os cravos a abrirem, a lua aspergindo
Luar, agoa-benta...
é o Victor, outra vez menino,?A compor um alexandrino,?Pelos seus dedos a contar!
Ao dar meia-noite no cuco da sala,
Batiam: ?Truz! truz!??E o Av? que dormia, quietinho na valla,
Entrava, Jezus!
Que olhos tristes tem meu vizinho!?Ve-me comer e poe-se a ougar:
Nas sachas de Junho, ninguem se batia
Com nosso cazeiro:?Que espanto, pudéra! se da freguezia
Elle
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