Salmos do prisioneiro | Page 3

Jaime de Magalhães Lima
que murmurou ��rro, mentira, a maldade, a descren?a e a impiedade?!... Porque quiz��ste que assim se amassem e vissem nossos olhos, os teus que s?o a vida e a candidez, e a ternura sem mancha do teu ninho, e os meus que s?o a morte e a escurid?o, e o desejo sinistro e o remorso que uma dorida consci��ncia acusa?!...
Oh, mansid?o, apari??o ang��lica, mandada a este mundo de treva a alumiar-nos a estrada que a Deus conduz e Deus tra?ou!... S�� de sonhar prender-te, j�� me prende a pr��pria tenta??o de te prender.
IV
Verteu outubro suas c?res de outono, purpura e oiro, nos c��us do poente em que o sol se perde. Melanc��licamente a luz abranda. Coroada de viol��tas, a saudade chora entre brumas sua infinda m��gua.
Cresce do mar a nevoa setinosa; o ardor adormece em suavidade. E t?o carinhosa a nevoa nos afaga na repousada sombra da sua paz que mais a sedu??o da morte nos anseia do que a tenta??o da vida nos exalta.
Ao rubor do poente, repetindo-o, responde o rubor da vinha debru?ada da muralha a que confia o seu arrojo. Sentindo que o inverno j�� n?o tarda, portador de agonias e rigores, incerta de viver, corou juntando o sangue para gloriosamente o dar �� morte.
Erradia, tenaz, afoitamente, no delirio da sua caridade, cobriu de pampanos as est��reis rochas, deu-lhes o manto da sua verdura. Beijou-lhes a dureza e aviventou-a. Humedeceu a ��rida secura, insinuou-lhe tumidas raizes onde vagueia a aspira??o da seiva. E agora humildemente vae despir-se, vae dar �� terra suas grinaldas em um derradeiro clamor ardente. A essa m?e de todo o amor as abandona para �� luz da primavera renascer e em estos de verdura ressurgir da sev��ra mudez a que a condena toda a rudeza agreste de dezembro.
Ao sopro turvo da primeira rajada de novembro, o pampano vermelho empalidece. Desprendendo-o da haste, o vento leva-o, rolando-o pelo ch?o e consumindo-o. Um murmurio de d?r lhe canta a morte e um murmurio de esperan?a a aben?oou. Est�� despojada da opulencia a vinha. Acende-se em seu seio e vem surgindo o sonho d��sse vi?o que desponta quando a aurora de abril lhe solta a aza.
Folhas mortas, ca��das, desmaiadas e dispersas pelas fr��gidas brizas de novembro! Em que la?os de morte me involvestes, prendendo �� vossa sorte o meu scismar!...
V
Tamb��m tu, serp?o do monte, me prendeste, tamb��m tu me roubaste a liberdade! Singelamente, floriste em flores onde a c?r da violeta empalidece e rediz seu poema de ternura. Assim me possuiste e �� tua pequenez me acorrentaste, ��quela pequenez que para mim foi grandeza e voz divina ao desprender da humildade e modestia os mais perfeitos perfumes, os mais doces.
Urna de incenso para ungir o ch?o, vaso quebrado entornando a ess��ncia que o nardo e a mirra e o cinamomo e o galbano n?o negariam, se Deus lhe d��sse a escolha! Em teu poder sonhei reinos fulgentes e bibl��cas vis?es me arrebat��ram.
Ao v��r-te entregue �� fria ingratid?o e ao desamparo dos montes e dos c��rros mais despidos, partilhando os rigores das urzes t��midas que em sua purpura ocultam a gandara negra; escravo sem sustento abandonado em solid?es av��ras por quem te qu��s coroar no sofrimento; sem o abrigo de uma s�� ��rvore, sem o consolo do mais tenue fio de ��gua que entre as pedras banhasse e convertesse a aspereza em limpidez; resignado filho trasmudando em do?ura suprema a austeridade que o gerou e o castiga despiedosa--na tua vida sonhei terras distantes onde se ergueu a cruz e Cristo orou na paz, entre oliveiras, pedindo ��quele que o mandou e est�� nos c��us que s��mente a sua vontade se cumprisse. Estranha evoca??o me segredou que era assim a terra santa do Calv��rio--no ch?o o mais severo, a do?ura infinita; e no martirio, o amor.
Dos teus ramos t?o d��beis que rastejam e condi??o mais alta n?o procuram, porque s�� na humildade est?o contentes, fiz o rasto do pr��prio cora??o onde o senti pulsar em ardor que o acordasse e erguesse para o sagrar. Por te amar, fiz de ti sinal de amor. Em meus tesouros, ricos de lembran?as, marcas iluminadas folhas e bemditas onde a minha alma recebeu a gra?a de peregrinas almas de pureza, onde sentiu a companheira e guia, enviada de Deus, para que no mundo lhe fosse amparo e a fortificasse, e a Deus a conduzisse, �� eternidade do amor divino.
D��ste modo me prendes, se te encontro. D��ste modo sou teu, se te colhi.
VI
Est�� adormecido o vento do outono. �� c?r de rosa a aurora pregui?osa em seu ber?o rendado de neblinas; e rutilante o manto com que cobre a campina onde a noite e a madrugada mansamente verteram a ternura de um luminoso pranto cristalino.
Entre os orvalhos vem a despontar, em hastes d��beis, hirtas, ainda palidas, sementes germinadas na frescura da terra j��
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