Que numa lagrima só que tu derrames, Se o Principe jámais a divisasse, Seria de sobejo a envenenar-lhe O terno cora??o, que affagar deves!... Se neste estado agora elle te achasse, Em que estado sua alma ficaria! Por seu amor, te rogo, enxuga o pranto, As afflic??es desterra, em que so?obras.
Ign. Oxalá que podesse desterra-las! Mas buscarei ao menos reprimi-las, Porque n?o participe o caro Esposo Dos males, dos horrores que me cerc?o. Embora o Ceo me opprima, e me castigue, Entorne sobre mim suas vingan?as; Porém sobre elle só prazeres mande: O seu socego, mais que o meu, desejo: A fim de lhe mostrar alegre o gesto, A que esfor?os me n?o dou continuamente? Para o n?o affligir... ah! Quantas vezes Calco, suffoco dentro do meu peito Afflic??es, que no peito me n?o cabem!... Quantas vezes, sumindo-se a seus olhos, Dos meus ao cora??o recúa o pranto! Mas ah, que os meus pezares, meus martyrios, Quanto mais os escondo, muais se azéd?o, Nem podem já ter fim sen?o co'a vida. A qualquer parte, oh Ceos, que os olhos mande, Motivos d'afflic??o sómente encontro. Do passado a lembran?a me horrorisa, E do futuro a idéa me intimida: Contra mim conspirada a intriga, a inveja, Sobranceiras as iras d'hum Monarcha, Tudo me vai cavando a sepultura: O cora??o m'o diz.
Elv. .......... Elle te illude: Que podes tu temer, quando enla?ada Ao mais digno dos Principes do Mundo, Ao melhor dos mortaes que os Ceos formár?o, O seu bra?o invencivel te defende? Em vez de recear sonhados males, Olha os immensos bens, a fausta sorte, Que propicio futuro te apparelha; O Lusitano Solio, que te espera; O respeito, o amor dos Portuguezes, A gloria de imperar sobre este povo, A quem teme, e venera o Mundo inteiro... Tudo, tudo, Senhora, te promette Permanentes venturas: nada temas.
Ign. Essas mesmas quimericas venturas, Esses bens illusorios, que me apontas, Justos motivos s?o dos meus temores. Oxalá que D. Pedro n?o tivesse Hum Throno por heran?a que offertar-me! Ent?o f?ra eu feliz, passára a vida No rega?o da paz, e da alegria: N?o haveria ent?o quem se oppozesse á perpetua uni?o das nossas almas; Nem barbara politica empecêra De nossos ternos cora??es a escolha: Hum do outro na posse, ambos ditosos, Aos transportes d'amor sem susto entregues, Rodeados dos tenros, caros filhos, Sem ter que desejar, o Throno excelso, Todos esses fantasmas da grandeza Nem huma vez sequer nos lembrari?o; Mas o fado nao quiz...
Elv. .............. Ahi vem D. Sancho.
Ign. Que motivo o conduz a procurar-me? Venero as suas c?s, e o seu caracter; Como elle, junto aos Reis, ach?o-se poucos.
SCENA II.
D. Sancho, Ignez e Elvira.(5)
(5) Elvira, logo que D. Sancho entra na Scena, retira-se para o fundo della, e pouco depois desapparece.
Sanc. O Ceo neste lugar faz que eu te encontre: He preciso, Senhora, com franqueza Mostrar-te os imminentes precipicios, Que só tua virtude evitar póde. O Principe despreza os meus conselhos, Meus rogos n?o attende, nem já céde ás lagrimas d'hum velho que aprecia, Mais do que a propria vida, a sua gloria: D'hum velho, que incumbido de educa-lo, Sempre a núa verdade ante os seus olhos Tem feito apparecer, buscando sempre Afastar-lhe a lisonja dos ouvidos, Esse das Cortes pessimo veneno, Que os cora??es dos Principes corrompe. Seu caracter violento, caprichoso, Agora por amor mais inflammado, Já n?o deixa dobrar-se ás minhas vozes; Cégo resiste aos Paternaes preceitos; He necessario pois que a obedecer-lhe O resolvas tu mesma. Bem conheces Do inflexivel Affonso o genio iroso. Já tres vezes o tem chamado á Corte, Sem que D. Pedro cumpra os seus mandados, Nem queira pesar bem seus amea?os: Muito do Rei severo temo as iras, Por crueis Conselheiros ati?adas: Vendo talvez do filho a rebeldia, Se esque?a de que he Pai. Cumpre, Senhora, Que atalhes as funestas consequencias, Que podem resultar da pertinacia Em que o Principe insiste: que o conven?as A beneficio seu, e em teu proveito, A cumprir sem demora os seus deveres: Eu sei que na sua alma podes tudo, E das tuas virtudes tudo espero.
Ign. O teu zelo, candura, e probidade Assaz louvo, e respeito. N?o te enganas Em suppor-me capaz de emprender tudo, Inda mesmo arriscando a propria vida, Para chamar D. Pedro aos seus deveres; N?o tem sido por falta de lembrar-lhos, Que elle ás ordens de hum Pai tem resistido. (Tu, n?o menos do que eu, seu genio sabes) Nem attender-me quer quando lhe imploro, Que á Corte vá lan?ar-se ás Regias Plantas. Todavia, D. Sancho, eu te prometto, Que n?o h?o de cessar minhas instancias; Embora, longe delle, Ignez saudosa, Ao furor dos seus émulos exposta, Venha talvez a ser victima triste De insidiosa politica: antes quero Morrer, do que lembrar-me que sou causa De que o Principe falte aos seus deveres.
Sanc. Quem nutre em
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