Luiz de Camões marinheiro

Vicente de Almeida de Eça
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Project Gutenberg's Luiz de Camões marinheiro, by Vicente de
Almeida de Eça
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Title: Luiz de Camões marinheiro
Author: Vicente de Almeida de Eça
Release Date: June 8, 2007 [EBook #21779]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
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CAMÕES MARINHEIRO ***
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LUIZ DE CAMÕES
MARINHEIRO
ESTUDO
POR
ALMEIDA D'EÇA
DAVID CORAZZI--EDITOR
EMPREZA HORAS

ROMANTICAS
Rua da Atalaya, 40 a 52
1880
Quem deixará, até onde cheguem as suas forças, de concorrer para
illustrar o nome do Poeta extraordinario que emprehendeu e levou a
cabo o levantar o monumento da nossa gloria nacional?
Visconde de Juromenha. _Obras de Camões._ Vol. I, pag. 7.
O perscrutar os mais fundos recessos do espirito de um poeta como
Camões, não é indigno da critica, nem um estudo vasio de interesse.
J. G. Monteiro. _Carta ácerca da ilha dos amores_, pag. 11.
A maior parte das observações, que vão ler-se, foram feitas longe da
patria, quando o poema de Camões era o unico amigo intimo com
quem desabafavamos saudades e soffrimentos. Concluimos depois este
humilde estudo em uma aldeia de Portugal, onde faltavam os bons
livros e mestres, cuja consulta seria indispensavel para que elle fosse
menos que imperfeito. Sirva isto de desculpa á rudeza d'estas linhas,
que só pretendem ser homenagem de agradecimento áquelle que tão
bem soube fallar ao coração do marinheiro.
Abril de 1880.
I
O nosso Epico, o immortal auctor dos _Lusiadas_, o escriptor que fez
com que o estrangeiro não esquecesse de todo o nome portuguez,--tudo
isto se diz que foi Luiz de Camões. A fibra patriotica julga-se quite da
divida de gratidão ao grande Poeta com ter-lhe erigido um monumento
de gosto duvidoso, em sitio acanhado da capital, e com pronunciar o
seu nome quando lhe dizem os desalentados que Portugal é uma terra
morta. Mas, por se orgulharem tanto de ser filhos do mesmo torrão em
que nasceu Camões, nem por isso esses, que tantas vezes lhe citam o
nome, sentem tentação de tomar conhecimento, sequer passageiro, do
que elles dizem ser um padrão das nossas glorias; e, não fallando nos
que propriamente se dedicam aos estudos litterarios, porque a esses
incumbe o dever de conhecerem as obras do nosso Poeta, raro se

encontrará nas classes illustradas um portuguez que dos _Lusiadas_
tenha lido mais que as poucas oitavas _selectas_, que se encontram nos
compendios de instrucção.
Assim, ao passo que o inglez, o allemão ou o francez menos dado ás
lides litterarias, mas que se preze de ter uma educação regular, conhece,
possue, lê e cita amiudadas vezes Shakespeare, Milton e Byron, ou
Schiller e Goethe, ou Molière e Lafontaine, nós, despresando as joias
de metal sem liga pelos enfeites de ouropel, fallamos de Camões quasi
como os cegos poderão fallar da luz. E o mal é tanto maior quanto uma
audaciosa escola contemporanea tenta arrogar-se o exclusivo de fallar
verdade, de _photographar_ a natureza, como dizem os seus corypheus,
dando a entender que o que antes d'elles se escreveu era tudo falso, que
ninguem tinha habilidade para copiar a natureza, e que só elles sabem
chamar as cousas pelo seu nome!
Não nos permittem as nossas poucas forças entrar na liça contra essa
escola, que hoje parece ter assambarcado o gosto e os louvores do
publico; só quizeramos pedir respeitosamente aos thuriferarios do novo
idolo, que consintam a algum _retrogrado_ da arte o conservar no mais
intimo do seu espirito a crença de que, em tempos que já lá vão, houve
quem escrevesse com realidade, quem pintasse a natureza tal como ella
é; consintam-lhe que, lendo o pobre Camões, encontre n'elle
descripções verdadeiramente reaes ou _realistas_, porque são apenas
verdadeiras.
Para se ser poeta, verdadeiramente poeta, para se fallar poeticamente da
natureza ou das artes, não basta ter a inspiração do rythmo, saber
alinhar palavras ora altisonantes ora docemente musicaes; é necessario
conhecer a natureza, conhecer as artes e as sciencias de que se quer
fallar, é necessario sentil-as, consubstanciar-se com ellas. Para fallar de
astronomia, ainda mesmo poeticamente, é necessario conhecer os astros;
para fallar do mar é necessario ter percorrido os oceanos, ter
presenciado as tempestades, ter soffrido com o marinheiro, porque
quem não sabe a arte, não na estima
(Lus. V, 97.)

Quem não tiver conhecido exactamente e sentido as cousas que quer
descrever, só póde copiar uma natureza subjectiva, filha da imaginação,
pura
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