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The Project Gutenberg EBook of Livro de Mágoas, by Florbela
Espanca
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Title: Livro de Mágoas
Author: Florbela Espanca
Editor: Tipografia Maurício
Release Date: July 13, 2007 [EBook #22058]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
0. START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK LIVRO DE
MÁGOAS ***
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Produced by / Produzido por Manuela Alves (Spelling modernization
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Gutenberg.)
FLORBELA ESPANCA
Livro de Mágoas
MCMXIX
LIVRO DE MÁGOAS
FLORBELA ESPANCA
LIVRO DE MÁGOAS
MCMXIX
_A meu Pai_
Ao meu melhor amigo
À querida Alma irmã da minha,
_Ao meu Irmão_
Procuremos somente a Beleza, que a vida
É um punhado infantil de
areia ressequida,
Um som d'água ou de bronze e uma sombra que
passa...
Eugénio de Castro.
Isolés dans l'amour ainsi qu'en un bois noir,
Nos deux coeurs, exalant
leur tendresse paisible,
Seront deux rossignols qui chantent dans le
soir.
Verlaine.
*Este livro*...
ESTE LIVRO...
Este livro é de mágoas. Desgraçados
Que no mundo passais, chorai
ao lê-lo!
Somente a vossa dor de Torturados
Pode, talvez, senti-lo...
e compreendê-lo...
Este livro é p'ra vós, Abençoados
Os que o sentirem, sem ser bom
nem belo!
Bíblia de tristes... Ó Desventurados,
Que a vossa imensa
dor se acalme ao vê-lo!
Livro de Mágoas... Dores... Ansiedades!
Livro de Sombras...
Névoas... e Saudades!
Vai pelo mundo... (Trouxe-o no meu seio...)
Irmãos na Dor, os olhos rasos de água,
Chorai comigo a minha
imensa mágoa,
Lendo o meu livro só de mágoas cheio!...
*Vaidade*
VAIDADE
Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a
imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E
que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de
alma profunda e insatisfeita!
Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e
profundo,
Aos pés de quem a terra anda curvada!
E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando
voando,
Acordo do meu sonho...
E não sou nada!...
*Eu*...
EU...
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem
norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a
dolorida...
Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e
forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre
incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o
ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo
p'ra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
*Castelã da Tristeza*
CASTELÃ DA TRISTEZA
Altiva e couraçada de desdém,
Vivo sozinha em meu castelo: a Dor!
Passa por ele a luz de todo o amor....
E nunca em meu castelo
entrou alguém!
Castelã da Tristeza, vês?... A quem?!...
--E o meu olhar é
interrogador--
Perscruto, ao longe, as sombras do sol-pôr...
Chora o
silêncio... nada... ninguém vem...
Castelã da Tristeza, porque choras
Lendo, toda de branco, um livro de
horas,
À sombra rendilhada dos vitrais?...
À noite, debruçada p'las ameias,
Porque rezas baixinho?... Porque
anseias?...
Que sonho afagam tuas mãos reais?...
*Tortura*
TORTURA
Tirar dentro do peito a Emoção,
A lúcida Verdade, o Sentimento!
--E ser, depois de vir do coração,
Um punhado de cinza esparso ao
vento!...
Sonhar um verso d'alto pensamento,
E puro como um ritmo d'oração!
--E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum
momento!...
São assim ocos, rudes, os meus versos:
Rimas perdidas, vendavais
dispersos,
Com que eu iludo os outros, com que minto!
Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho
e duro,
Que dissesse, a chorar, isto que sinto!!
*Lágrimas ocultas*
LÁGRIMAS OCULTAS
Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era
qu'rida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa
outra vida...
E a minha triste boca dolorida
Que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de
esquecida!
E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum
lago
O meu rosto de monja de marfim...
E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro
da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!
*Torre de névoa*
TORRE DE NÉVOA
Subi ao alto, à minha Torre esguia,
Feita de fumo, névoas e luar,
E
pus-me, comovida, a conversar
Com os poetas mortos, todo o dia.
Contei-lhes os meus sonhos, a alegria
Dos versos que são meus, do
meu sonhar,
E todos os poetas, a chorar,
Responderam-me então:
«Que fantasia,
Criança doida e crente! Nós também
Tivemos ilusões, como ninguém,
E tudo nos fugiu, tudo morreu!...»
Calaram-se os poetas, tristemente...
E é desde
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