Frei Luiz de Sousa | Page 2

Almeida Garrett
olha, meu Telmo, t��rno a dizer-t'o: eu n?o sei como heide fazer para te dar conselhos. Conheci-te de tam crian?a, de quando casei a... a... a primeira vez--costumei-me a olhar para ti com tal respeito: ja ent?o eras o que hoje es, o escudeiro valido, o familiar quasi parente, o amigo velho e provado de teus amos.
*Telmo*, internecido. N?o digaes mais, senhora, n?o me lembreis de tudo o que eu era.
*Magdalena*, quasi offendida. Porqu��? n?o es hoje o mesmo, ou mais ainda, se �� possivel? Quitaram-te alguma coisa da confian?a, do respeito--do amor e carinho a que estava costumado o aio fiel de meu senhor D. Jo?o de Portugal, que Deus tenha em gl��ria?
*Telmo*, ��parte. Ter��...
*Magdalena*. O amigo e camarada antigo de seu pae?
*Telmo*. N?o, minha senhora, n?o, por certo.
*Magdalena*. Ent?o?...
*Telmo*. Nada. Continuae, dizei, minha senhora.
*Magdalena*. Pois est�� bem.--Digo que mal sei dar-vos conselhos, e n?o queria dar-vos ordens... Mas, meu amigo, tu tom��ste--e com muito g?sto meu e de seu pae, um ascendente no espirito de Maria... tal que n?o ouve, n?o cre, n?o sabe sen?o o que lhe dizes. Quasi que es tu a sua donna, a sua aia de cria??o.--Parece-me... eu sei... n?o falles com ella d'esse modo, n'essas coisas...
*Telmo*. O qu��? No que me disse o inglez, s?bre a sagrada Escriptura que elles l�� teem em sua lingua, e que?...
*Magdalena*. Sim... n'isso decerto... e em tantas outras coisas tam altas, tam f��ra de sua edade, e muitas do seu sexo tambem, que aquella crian?a est�� sempre a querer saber, a perguntar.--�� a minha unica filha: n?o tenho... nunca tivemos outra... e, al��m de tudo o mais, bem ves que n?o �� uma crian?a... muito... muito forte.
*Telmo*. ��... delgadinha, ��. Hade inrijar. �� t��-la por aqui, f��ra d'aquelles ares apestados de Lisboa; e deixae, que se hade p?r outra.
*Magdalena*. Filha do meu cora??o!
*Telmo*. E do meu.--Pois n?o se lembra, minha senhora, que ao principio, era uma crian?a que eu n?o podia...--�� a verdade, n?o a podia ver: ja sabereis porqu��... mas v��-la, era ver... Deus me perdoe!... nem eu sei...--E d'ahi come?ou-me a crescer, a olhar para mim com aquelles olhos... a fazer-me taes meiguices, e a fazer-se-me um anjo tal de formosura e de bondade, que--v��des-me aqui agora que lhe quero mais do que seu pae.
*Magdalena*, surrindo. Isso agora!...
*Telmo*. Do que v��s.
*Magdalena*, rindo. Ora, meu Telmo!
*Telmo*. Mais, muito mais. E veremos: tenho ca uma coisa que me diz que antes de muito se hade ver quem �� que quer mais �� nossa menina n'esta casa.
*Magdalena*, assustada. Est�� bom; n?o entremos com os teus agouros e prophecias do costume: s?o sempre de aterrar... Deixemo'-nos de futuros...
*Telmo*. Deixemos, que n?o s?o bons.
*Magdalena*. E de passados tambem...
*Telmo*. Tambem.
*Magdalena*. E vamos ao que importa agora.--Maria tem uma comprehens?o...
*Telmo*. Comprehende tudo!
*Magdalena*. Mais do que convem.
*Telmo*. ��s vezes.
*Magdalena*. �� preciso moder��-la.
*Telmo*. �� o que eu fa?o.
*Magdalena*. N?o lhe dizer...
*Telmo*. N?o lhe digo nada que n?o possa, que n?o deva saber uma donzella honesta e digna de melhor... de melhor.
*Magdalena*. Melhor qu��?
*Telmo*. De nascer em melhor estado.--Quizestes ouvi-lo... est�� ditto.
*Magdalena*. Oh Telmo! Deus te perdoe o mal que me fazes. (_Desata a chorar_.)
*Telmo*, ajoelhando e beijando-lhe a m?o. Senhora... senhora D. Magdalena, minha ama, minha senhora... castigae-me... mandae-me ja castigar, mandae-me cortar ��sta lingua p��rra que n?o toma insino.--Oh senhora, senhora!... �� vossa filha, �� a filha do senhor Manuel de Sousa-Coutinho, fidalgo de tanto primor, e de tam boa linhagem como os que se teem por melhores n'este reino, em toda Hespanha... A senhora D. Maria... a minha querida D. Maria �� sangue de Vilhenas e de Sousas; n?o precisa mais nada, mais nada, minha senhora, para ser... para ser...
*Magdalena*. Calae-vos, calae-vos, pelas dores de Jesus Christo, homem.
*Telmo*, solu?ando. Minha ricca senhora!...
*Magdalena*, inchuga os olhos, e toma uma attitude grave e firme. Levantae-vos, Telmo, e ouvi-me. (Telmo levanta-se) Ouvi-me com atten??o. �� a primeira e ser�� a ��ltima vez que vos fallo d'este modo e em tal assumpto.--V��s fostes o aio e amigo de meu senhor... de meu primeiro marido, o senhor D. Jo?o de Portugal; tinheis sido o companheiro de trabalho e de gl��ria de seu illustre pae, aquelle nobre conde de Vimioso, que eu de tamanhinha me acostumei a reverenciar como pae. Entrei depois n'essa familia de tanto respeito; achei-vos parte d'ella, e quasi que vos tomei a mesma amizade que aos outros... chegastes a alcan?ar um pod��r no meu espirito, quasi maior...--decerto, maior--que nenhum d'elles. O que sabeis da vida e do mundo, o que tendes adquirido na conversa??o dos homens e dos livros--por��m, mais que tudo, o que de vosso cora??o fui vendo e admirando cada vez mais--me fizeram ter-vos n'uma conta, deixar-vos tomar, intregar-vos eu mesma tal auctoridade n'esta casa e s?bre minha pessoa... que outros poder?o estranhar...
*Telmo*. Emendae-o, senhora.
*Magdalena*. N?o, Telmo, n?o preciso nem quero emend��-lo.--Mas
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