Elegia da Solidão | Page 2

Teixeira de Pascoais
ser mais?Do que um espectro vivo??Ser doido cataclismo!?Ser desprendida folha,?Entregue aos vendavaes,?A voar, a voar em negros v?os afflictos!?Olhar seu proprio sêr como quem olha?O fundo d'um abysmo!?E querendo esconder nas sombras o seu r?sto,?Para chorar t?o intimo desgosto,?Ter de invocar a noite em altos gritos!
ó meu vulto perdido em trevas misteriosas!?Cégo, a bater de encontro ás brutas cousas,?Coberto de feridas, a sangrar...?Sou como a sombra em lagrimas do mar;?Nuvem desfeita em chuva;?Um enorme phantasma de viuva?A rezar e a chorar na solid?o sem fim!?Noite de horror sempre abra?ada a mim!?ó noite, onde ha solu?os e estertores?E prociss?es infindas de clamores...?Multid?es de phantasticas mulheres,?A cantar, a cantar sinistros _miséréres_...?Sombras que o vento leva...?Doidos perfis de fogo a rir na treva?Que nos desvenda as lividas entranhas,?Com nuvens e contornos de montanhas,?Com arvores agitadas de anciedades,?Com desgrenhadas, intimas saudades?E tragicos desejos que arrefecem,?Soes que n'um mar de sangue desfalecem!
Sou a noite em que o mundo se consome:?As cousas mais humildes e sem nome,?As estrelas, os Deuses, tudo quanto?Se amortalha na sombra do meu canto?Que chora a sua eterna imperfei??o!?Sou tempestade, noite, solid?o,?O frio esquecimento,?A sombra do luar bailando com o vento,?Um gemido de nevoa, uma ternura, um ai,?Phantasma d'uma lagrima que cáe.
ó triste solid?o que me rodeia!?ó minha amada e pequenina aldeia!?ó aves a cantar para ninguem!?Fl?res que o inverno emurchece,?M?os erguidas na tarde que arrefece,?Implorando o silencio, a noite, as cousas mortas?E os ventos de terror batendo ás portas,?Sem destino, a correr por esse mundo além!?Almas crucificadas de abandono?Entregues a uma eterna viuvez,?Transparentes de fina palidez,?Rezando ao Deus da Morte as ora??es do outomno...?E tu, meu cora??o amante que palpitas?Nas trevas infinitas!?E ardes n'uma fogueira desvairada?E doido te consomes para nada!?Caio por terra morto de can?asso,?A propria terra foge ao meu abra?o!?Foge de mim tambem meu proprio sêr,?Vulto de cinza e poeira...?Homens, nem mesmo a d?r é verdadeira!?Sou ilusoria imagem a soffrer?A tragica mentira que a formou!?E pelo mundo vou?Na êrma escurid?o, chorando afflicto,?Como crean?a perdida no Infinito,?Entre soturnos Deuses fabulosos?E mundos de terror vertiginosos...
O alto sete-estrelo!?Sol velhinho com brancas no cabelo!?Silencio emudecendo a musica dos ninhos!?Loucura que ergue o mar em ondas e solu?os?E, exausto, sobre a praia, o faz cair de bru?os!?ó pinheiraes sósinhos!?ó tragedias de fraga e terra! ó êrmos montes!?Calvarios a sangrar!
Cora??es de mulher desfeitos em luar!?Martirisadas fontes!?Medonhos arvoredos!?Chimericos penedos!?Lobos uivando a magua que os consome?á lua que prateia a serra fragarosa...?Magros vultos de pêlo arripiado?Com um sinistro olhar incendiado;?Ferozes esqueletos que têm fome...?Apari??es da Plebe tenebrosa;?Odios vivos, relampagos de d?r;?Archotes acendidos,?Na noite da desgra?a transmitidos,?De m?o em m?o, com tragico furor!
Lobos famintos, doidos e profetas!?Le?es cheios de sombra e de melancolia!?Feras que devoraes por simpatia,?Bramindo, como cantam os poetas!?Meu sonho é comungar a Natureza;?Paisagens de alegria e de tristeza,?Desertos ao luar, vis?es de outrora,?Nuvens relampejando...?O silencio nocturno, a musica da aurora?Em notas de oiro voando...?Quero sentir o amor, o soffrimento?Que apaga a luz do sol e faz gritar o vento?E sufoca de lagrimas as fontes?Na solid?o dos montes...?Quero sentir o vago, o indefinido?D'um astro a palpitar nas ondas reflectido.?Quero ser a ilus?o, a nuvem, a chimera,?A divina alegria, a virgem Primavera?Que nos desenha, além, n'um fundo escuro e frio,?Doirada porta em flor aberta sobre o estio...?Quero brilhar na luz e crepitar?No fogo, e me perder em fumo pelo ar!?Quero tecer os caules verdejantes?E ser em rosa murcha orvalhos scintilantes.?Quero abranger o mundo?E o claro ceu profundo;?E ter nos olhos meus?As estrelas e as lagrimas de Deus,?E em meus bra?os o gesto de carinho?Que tem um ramo em fl?r,?Quando ampara e protege com amor?Uma avesinha dentro do seu ninho...
+(Da terceira Fala do ?Jesus e Pan?)+
+FIM.+
300 RéIS
End of Project Gutenberg's Elegia da Solid?o, by Teixeira de Pascoais
? END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK ELEGIA DA SOLID?O ***
? This file should be named 22907-8.txt or 22907-8.zip ***** This and all associated files of various formats will be found in:
? http://www.gutenberg.org/2/2/9/0/22907/
Produced by Vasco Salgado
Updated editions will replace the previous one--the old editions will be renamed.
Creating the works from public domain print editions means that no one owns a United States copyright in these works, so the Foundation (and you!) can copy and distribute it in the United States without permission and without paying copyright royalties. Special rules, set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. Project Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you charge for the eBooks, unless you receive specific permission. If you do not charge anything for copies of this eBook, complying with the rules is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose such as creation of derivative works, reports, performances and research. They may be modified and printed and given away--you may do practically ANYTHING with public domain eBooks. Redistribution
Continue reading on your phone by scaning this QR Code

 / 6
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.