Chronica de el-rei D. Affonso V | Page 5

Rui de Pina
com pouca sua ajuda, foi-se da c?rte para a cidade de Toledo, d'onde constrangida já de grandes minguas que a apertavam, soltou quasi toda a gente que tinha, encommendando os filhamentos e vivendas de seus criados a aquelles senhores de Castella com que cada um mostrava ter mais contentamento de viver.
Alli veiu a Rainha a tanta necessidade e pobreza, que para seu suportamento lhe conveiu receber ajudas em p?o e dinheiro d'alguns Prelados e donas viuvas d'aquelle reino, em especial de uma D. Maria da Silva de Toledo, senhora de nobre sangue e muita fazenda. E n'este reino e em Ceuta sendo de suas necessidades sabedor D. Fernando de Noronha, primeiro conde de Villa Real, e segundo capit?o da dita cidade; porque era de real sangue e mui nobre cora??o; principalmente porque El-Rei D. Duarte o criara e acrecentara com muito amor, e asi por elle ter com a Rainha divido mui conjuncto, a mandou visitar e ajudar com uma boa somma d'ouro amoedado, de que por sua nobreza e bom conhecimento foi de todos cá e lá mui louvado. Pelo qual a Rainha sentindo-se já envergonhada de requerer, e cansada de esperar, vendo os caminhos e remedios de sua esperan?a, com as mudan?as de seus irm?os de todo cerrados, houve-se de todo por mal aventurada, e sobretudo por enganos mal aconselhada, e suspirando já por Portugal, ao menos para lhe sua terra comer o corpo, fallou com Mossem Gabriel de Louren?o, seu capell?o mór, e com suas cren?as, instruc??o e poder, o enviou a Albuquerque, d'onde por meio do conde d'Arrayollos tratasse alguma concordia com o Infante D. Pedro, ao qual Infante a Rainha com palavras e cousas assaz piadosas, enviava já pedir, ao mais consentimento e lugar para vir a estes reinos, e n'elles morrer, n?o como Rainha, mas como sua irm? menor que se queria poer em suas m?os, de que se contentaria receber o que elle quizesse, e lhe parecesse raz?o.
O conde d'Arroyollos, como era homem virtuoso e de justa ten??o, acceitou com boa vontade o negocio, e o Regente a que o dito conde por Vasco Gil, seu secretario, o notificou, o ouviu e recebeu com muito melhor mostran?a, e andando já em apontamentos com esperan?a de b?a conclus?o, chegou recado certo ao Regente, como a Rainha D. Lianor fallecera na mesma cidade de Toledo, sexta-feira XIX dias de Fevereiro de mil quatrocentos e quarenta e cinco.
Foi sua morte arrebatada, sem ter uma hora de accordo para o que á sua alma e á sua fazenda cumpria, em que houve violenta presump??o que f?ra de pe?onha; porque em lhe lan?ando uma ajuda, que por ser um pouco achacada requerera, logo sem entrevalo nem repouso deu alma a Deus. E a opini?o dos mais foi que esta morte lhe ordenara, n?o o Infante D. Pedro, como muitos maliciosos quizeram falsamente dizer, mas o Condestabre D. Alvaro de Luna, por meio de uma mulher da villa de Ilhescas, que em casa da Rainha tinha grande entrada e muita familiaridade. Receoso que, se a Rainha vivesse, estando em a cidade de Toledo, ordenaria como o Infante D. Anrique seu irm?o, tornasse a ella, de que f?ra já lan?ado. Porque foi avisado que ella o procurava e concertava já com Pero Lopez d'Ayala, que na cidade era alcayde mór, e cavalleiro mais principal, crendo que se o Infante fosse senhor de tal cidade, o Condestabre o havia por cousa muito contraira a seu desejo e proposito, que era destrui lo e desterra-lo do reino com seus irm?os, e por argumento d'isto, outro tanto se presumio do mesmo Condestabre, que ordenara á Rainha D. Maria, mulher d'El-Rei D. Jo?o, que após sua irm? n?o durou com vida mais de XV dias.
E esta Rainha D. Maria jaz sepultada na capella mór do mosteiro d'Aguadallupe.
O Regente como soubesse do fallecimento da Rainha, enviou logo pela Infante D. Joana, que ficara e estava em Toledo em grande desamparo, e a foi ao extremo receber, e trouxe mui honradamente para Lisboa, onde a poz em companhia da Infante D. Catharina sua irm?, em poder de Violante Nogueira, e tomou para El-Rei todolos criados que ficaram da Rainha, tirando alguns em que tinha suspeita e descontentamento.

CAPITULO LXXXV
Como o Condestabre filho do Infante D. Pedro foi enviado a Castella com gentes d'armas, em ajuda de El-Rei de Castella contra os Infantes d'Arag?o, e do que se passou até tornar
Pela morte d'estas duas Rainhas o partido dos Infantes d'Arag?o ficou em Castella mui fraco e abatido, e o Condestabre porque viu tempo que lh'o assi aconselhava, ordenou de os fazer lan?ar e desterrar fóra do reino, e acabou com El-Rei que escreveu ao Regente com as raz?es e causas com que sentio que o mais obrigaria, pedindo-lhe para isso ajuda de gente d'armas por seu messegeiro, o
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