As Farpas: Chronica Mensal da Politica, das Letras e dos Costumes | Page 3

Ramalho Ortigão
para o pipo. Fazem um programma, redigem um manifesto, v?o de terra em terra pedindo ao paiz que intervenha. Precisamente lhes occorreu n'esse momento que o pipo tem dono! que �� do paiz o pipo!
Instado a intervir pelos pactuantes da Granja, pelos signatarios do manifesto, pelos auctores do novo programma, pelos oradores dos meetings revolucionarios, pelos jornaes opposicionistas, o paiz responde-lhes:
Lestes a historia do sabio burro lazarento contada pelas Farpas? Eu sou esse burro. V��s sois a revoada das novas moscas pretendendo expulsar a revoada velha. Ora, moscas por moscas--sendo meu destino que ellas sempre me cubram e me comam--prefiro as antigas moscas saciadas ��s novas moscas famintas.
Deixae-me em paz. E notae que eu nem sequer vos abano as orelhas,--que �� para n?o bolir comigo!
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Nuvens escuras, espessas, parecendo feitas da conjuga??o erea de Hymalaias de cinza e de Caucasos de cebo, toldam o c��u, descem no espa?o sobre as nossas cabe?as, rolam pelos telhados com os idyllios felinos do mez de janeiro, c��em sobre os candieiros das ruas, espraiam-se pelo asphalto dos passeios, valsam nas ruas, envolvem os transeuntes em abra?os aquosos que lhes atravessam o paletot, o collete de flanella e as articula??es dos ossos; penetram em rodopio no interior das casas pelos resquicios das portas e das janellas, e na sua dan?a macraba as pardas e humidas filhas do ar cobrem de sofregos beijos molhados e bolorosos as lombadas dos livros, o liso marfim dos teclados, o marmore polido das chamin��s, os cabellos que se desfrisam e as id��as que se dissolvem. Ao cabo de pouco tempo chove de toda a parte: chove do c��u, chove das paredes e dos tectos das casas, das portas, da mobilia, dos cast?es das bengalas, dos abat-jours dos candieiros, e dos barretes de dormir. Ha dois violentos temporaes com poucos dias de espa?o entre um e outro. Trasbordam os rios. Inundam-se os campos. Desenraizam-se arvores. Desmoronam-se casas. Os rebanhos, os instrumentos agricolas, os generos em deposito nos celleiros, os viaductos e os rails das linhas fereas s?o arrebatados pela corrente das aguas. O curso ordinario dos negocios, o movimento das mercadorias e dos viajantes suspende-se. Alguns dos habitantes das regi?es inundadas ficam na miseria e t��em fome.
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Ha por tanto duas crises: uma crise meteorologica e uma crise economica.
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Sendo a crise economica um effeito da crise meteorologica, a quest?o fundamental no estudo d'essas duas crises �� a quest?o da chuva.
Esta quest?o acha-se definida e tem a sua theoria na sciencia.
Assim como a agua sujeita a uma dada eleva??o de temperatura se evapora e se converte em ar, assim o ar sujeito a uma proporcional depress?o athmospherica se transforma e se converte em agua. Os conhecimentos que j�� hoje se possuem da physica do globo permittem determinar os differentes tramites do processo seguido pela natureza para obter os resultados achados pela observa??o humana.
Todo o vento (effeito da rota??o da terra) humedecido pela impregna??o aquatica do mar, encontrando na sua passagem um estorvo que o dilate na atmosphera, transforma-se em chuva, ou transforma-se em neve, segundo o gr��u de arrefecimento, maior ou menor, resultante da altura a que o eleva no espa?o o volume do estorvo interposto na sua corrente.
Assim se explica o phenomeno da chuva, a existencia da neve nos pincaros de todas as altas montanhas, e o nascimento dos rios. D'estes, uns, como o Rhodano, o Rheno, o Danubio, s?o formados pela opposi??o das cordilheiras �� corrente regular de certos ventos; outros, como o Mississipi e o Missouri, nascem do encontro das duas correntes atmosphericas oppostas, uma que s��e do golpho do Mexico, outra que parte dos Estados Unidos na direc??o da Europa.
Achando-se determinado que 200 metros de eleva??o acima do n��vel do mar d?o 3 gr��us de frio, �� facil calcular, o frio que deve actuar no ar elevado ��s alturas dos Alpes, dos Pyreneus, do Caucaso, e de descobrir assim as causas das geleiras, do mesmo modo se descobriu a origem das chuvas e a do nascimento dos rios.
Possuida esta simples e clara no??o, o homem adquiriu o poder de intervir no meteoro. Em 14 de novembro de 1854 uma tempestade medonha ca��u sobre as esquadras franceza e ingleza, estacionadas no Mar Negro. Todos os navios das duas marinhas tiveram avarias desastrosas. Muitas embarca??es de transporte naufragaram. O sr. Leverrier, director do observatorio de Paris, procedeu ent?o a um inquerito sobre as perturba??es atmosphericas d'esse dia, dirigindo circulares a todos os meteorographos do mundo. Duzentas e cincoenta respostas de differentes observatorios provaram que a onda atmospherica qua determinara a tempestade f?ra presentida pelos observadores, e que a catastrophe teria sido evitada se o telegrapho, que caminha mais depressa do que a corrente do ar, houvesse feito passar de observatorio em observatorio a noticia do phenomeno.
Antigamente faziam-se preces e penitencias
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