A senhora Rattazzi, by Camilo
Castelo Branco
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Title: A senhora Rattazzi
Author: Camilo Castelo Branco
Release Date: September 25, 2006 [EBook #19375]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
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SENHORA RATTAZZI ***
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A SENHORA RATTAZZI
NOVA EDIÇÃO
Porto: 1880--Typ. de A. J. da Silva Teixeira, Cancella Velha, 62
A SENHORA RATTAZZI
POR
CAMILLO CASTELLO BRANCO
NOVA EDIÇÃO
MAIS INCORRECTA E AUGMENTADA
LIVRARIA INTERNACIONAL DE ERNESTO CHARDRON,
EDITOR PORTO E BRAGA
1880
PREAMBULO
Á NOVA EDIÇÃO
O assumpto aqui tratado--a brochura da snr.^a Rattazzi--tem duas
physionomias: uma para risos, outra para critica sisuda. Se uma das
faces nos avinca a fronte, a outra tem virtudes therapeuticas de
désopiler la rate. Eu tentei, pela galhofa pachorrenta, esquivar-me ás
phrases amargas que a segunda physionomia--a seriedade--me
impunha.
Se uma dama de má lingua nos belisca, devemos imaginar que ella nos
faz cocegas; e, em vez de lhe trincarmos os dedos que nos estorcegaram
a pelle, corre-nos o dever de imitar quem soffre as cocegas--rir e
pernear; mas a mim, ás vezes, succedia-me, quando fazia cocegas a
alguem, levar o meu sopapo involuntario. É o que póde acontecer a
quem faz cocegas disfarçadas em beliscões.
Un ami de madame, no Jornal de Noticias, cheio d'uma paciencia
portugueza e muito namorada com as lerdas chalaças da snr.^a Rattazzi,
acha que o zangarem-se os portuguezes beliscados por madame é falta
de espirito.
Assim como, no dizer da princeza de pacotilha, il y a ventre et ventre,
tambem ha beliscões e beliscões, ó invejavel amigo de madame! Uns
são attritos de arminho, cariciosos, como o roçar de dous botões de
rosa-chá, em dous dedos opalinos com unhas nacarinas, pelos bigodes
encalamistrados de s. exc.^a, o amigo d'ella e de Peniche; outros, são
mordentes como tenazes de caranguejo, farpadas de vibora; e, se não
deixam contusões rôxas e largas como pontapés de gallegos, penetram
os filamentos nervosos e os tecidos cellulares como uma injecção
subepidermica de vitriolo. Que a injecção me seja ministrada pela
regateira que me vende os seus carapaus, ou pela princeza que me
vende os seus livros, queima-me do mesmo feitio. A cravache de Lola
Montes doía como se a vibrasse o pulso rijo de Roger de Bauvoir.
Mulher escriptora, por via de regra pouco exceptuada, é um homem por
dentro. O coração, que devia ser urna de suavissimas lagrimas,
faz-se-lhe botija de tinta; e as dôces penas da alma metallisam-se-lhe
aguçadas em pennas de aço. O fuso de Lucrecia e da rainha Bertha
desfez-se em canetas. Em vez de tecerem o seu bragal, urdem intrigas.
Suspiram publicamente em 8.^o portuguez, 250 paginas; e, quando não
suspiram, bufam coleras represadas, dizem que tem idéas, que se
querem emancipar, muito aziumadas, naturalistas, com um grande ar de
pimponas que entraram no segredo dos processos; e, se não batem nos
homens, não é porque elles o não mereçam. O amigo de madame, esse,
tem de apanhar do sexo, mais hoje, mais ámanhã.
O Dom Francisco Manoel de Mello tinha razão: Mulheres doutoras,
authoras e compositoras dava-as ao diabo. É triste cousa, prosegue o
critico do Hospital das Letras--que estejaes com vossa mulher na cama,
na mesa, ou na casa, e andem lá pelas tendas mil barbados
perguntando por ella.
Não ha feminilidades que se respeitem desde que a mulher se
masculinisa, e, como escriptora virago, salta as fronteiras do decoro,
sofraldando as espumas das rendas até á altura da liga azul-ferrête.
Mau! começo a ser muito serio e metaphorico. Por aqui me fecho.
N'esta edição augmentam as incorrecções á proporção das paginas.
Algumas vão muito alagartadas de francezias para que sua alteza
perceba pouco que seja do pamphleto.
Se um periodo serio não destoasse d'esta brincadeira, eu lembraria aos
meus conterraneos que o repellirem patrioticamente as zombarias dos
insultadores estrangeiros lhes é mais airoso do que esse palavriado de
rimas bombasticas e fofas com que suppuram em golfadas annuaes o
seu patriotismo no Primeiro de dezembro.
Não obstante o silencio dos vates encartados na hymnologia patriotica,
a maioria da imprensa antecipou-se-me no vigoroso desforço da justiça,
e nomeadamente o snr. Urbano de Castro, um escriptor moderno, com
os dons do estylo e da graça que seduzem velhos impertinentes e
glaciaes como eu e outros infelizes da minha idade. A favor da
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